quarta-feira, 10 de novembro de 2021

O GRITO (2004)


Nota 6 Remake de obra oriental acerta ao manter elementos do original, mas também corrige erros


Diga o nome de um filme de teror que você não resiste em rever de tempos em tempos. Os fãs do gênero certamente buscarão a resposta lá no fundo do baú e dirão que o seu preferido é O Exorcista ou O Bebê de Rosemary, por exemplo. Poderão também recorrer aos longas de monstros clássicos vividos por Bela Lugosi ou Christopher Lee ou se ater a um período mais recente marcado pelas franquias Jogos Mortais ou Invocação do Mal. Mas e algum título da safra dos remakes orientais produzidos em Hollywood? Ah, aí o bicho pega e todo mundo tem vergonha de assumir que pelo menos uma vez na vida ficou de pernas bambas ao ver uma assombração de olhinhos puxados. O período mais fértil dos remakes de horror orientais marcou os primeiros anos do século 21, um movimento cinematográfico que gerou milhões, mas fatalmente chegou à saturação. Tudo que é demais cansa e a qualidade das produções declinou tanto do lado ocidental quanto do oriental. É certo que nenhuma delas tem potencial de obra-prima, mas não podemos negar que essas tais refilmagens em sua maioria são divertidas e cumprem seus objetivos: causar sustos, arrepios, gritarias e serem esquecidas rapidamente (ou não, depende de cada um).  O Grito é um bom exemplo desse tipo de produção. 

Logo no início tomamos conhecimento de uma crendice japonesa. Quando alguém morre em um momento de raiva nasce uma maldição no local onde tal pessoa se encontrava na hora da morte, assim quem entra em contato com o espaço acaba sendo amaldiçoado e ele e todos a sua volta correm o risco de morrer. Em Tóquio encontramos a estudante americana Karen Davis (Sarah Michelle Gellar) que foi morar lá para acompanhar o namorado Doug (Jason Behr) e trabalha como voluntária em um centro social. Certo dia lhe é solicitado que ela substitua uma jovem que não foi trabalhar e sumiu misteriosamente. Sua tarefa é cuidar de Emma Williams (Grace Zabriskie), uma senhora de idade que sofre de letargia associada à demência. Quando chega ao local, Karen encontra essa mulher sozinha demonstrando um comportamento estranho, muito calada e com olhos assustados, enquanto o resto da casa parece abandonado. A voluntária trata de Emma e tenta dar um jeito na bagunça da casa, mas sentindo uma vibração negativa e ouvindo barulhos estranhos ela passa a explorar melhor o local e ao abrir um armário acaba liberando uma maldição que até então desconhecia. Agora ela precisa tentar salvar sua vida e a de outras pessoas com quem convive, mas para cortar este mal pela raiz só mesmo tomando medidas drásticas.


Adotando uma narrativa não linear, a primeira parte do filme exige um pouco mais de atenção. Por meio de flashbacks são apresentadas diversas cenas que serão de muita importância para compreendermos os eventos futuros. Bill Pullman faz uma participação logo no início sem falar uma palavra sequer, mas apresentando-se como a primeira vítima da tal maldição. Depois acompanhamos como a família americana Williams chegou a casa e como todos os membros foram rapidamente tomados pelo espírito maligno. Mais a frente tais cenas farão sentido quando ficamos sabendo mais sobre o passado dessa residência e de seus antigos habitantes, Kayako (Takako Fuji) e o filho Toshio (Yuka Ozeki). Bem, filmes sobre casas assombradas existem às pencas em solo americano, mas qual o problema de refilmar uma história similar oriental de grande sucesso? Nenhum desde que se respeite a obra original. Para não errar em nada (ou pelo menos o mínimo possível), Takashi Shimizu foi incumbido de assumir a direção e o texto da adaptação de seu próprio trabalho, "Ju-On: The Grudge", aliando a sutileza e o estilo narrativo japonês aos exageros hollywoodianos. E a mistura deu muito certo. É bom deixar claro que esta atualização da obra não é apenas uma produção caça-níquel, mas também melhora e corrige erros do exemplar japonês. O remake tem personagens mais bem estruturados e fáceis de distinguir, o clima de claustrofobia e terror foi intensificado e o final foi repensado. 

Foi uma boa ideia também manter a ação em solo nipônico e resgatar parte do elenco original, como os atores que interpretam os fantasmas, pequenos detalhes que contribuem e muito para dar certo ar de novidade a este terror americanizado. Vale ressaltar ainda que algumas cenas são idênticas as do original, mas aqui ganham um impacto maior devido a polida de imagem oferecida pela equipe de fotografia e pelos efeitos especiais empregados de melhor qualidade, mas usados com parcimônia provando que quanto mais realista melhor o terror. É de gelar o sangue sequências como a primeira aparição de Toshio, ver uma aparição esgueirando-se na escadaria de incêndio ou ainda o embate final literalmente cara a cara entre a mocinha e a tal maldição. O bacana do roteiro, co-escrito por Stephen Susco, é que ele não enrola e desde os créditos iniciais, embalado por uma sinistra trilha musical, já estamos tomados pelo sentimento de medo. Aqui não tem enrolação. É difícil encontrar algum filme de terror que surpreenda, mas ainda assim seus diretores queimam os miolos para tentar envolver o espectador e disfarçar ao máximo a previsibilidade de suas histórias. Já Shimizu em poucos minutos de filme coloca na mesa boa parte de suas cartas, mas não deixa o jogo esfriar. Se a maldição é aparentemente sem fim, a todo instante nos indagamos qual será o final de Karen? 


Segundo escritores nipônicos, o mal apresentado sem forma definida é o que impacta o espectador, afinal de contas lidar com o desconhecido desperta a curiosidade e o medo naturalmente. Neste caso, por exemplo, o fantasma de Toshio não está totalmente preso à tal casa amaldiçoada e tem livre arbítrio para ir buscar suas vítimas em outros endereços, porém, é algo indestrutível. Todavia, se o diretor capricha nas cenas de mortes e nos sustos, por outro lado jogou fora a oportunidade de elevar sua obra a um patamar mais elevado. Uma das regras básicas de uma produção de terror é tentar criar em pouco tempo uma relação entre espectador e personagens para que seja possível sofrer com seus dramas, mas Shimizu arriscou-se ao simplesmente criar um frágil elo entre os coadjuvantes (em rápidas participações) e a protagonista, contudo não é que deu certo? Gellar tem carisma suficiente para levar a história adiante, mas é bacana ver que até os personagens menores que somem rapidamente de cena receberam uma atenção especial. Quando eles estão em foco, nem nos lembramos da mocinha. É muito fácil dizer que O Grito é um filme ruim, mas em uma análise mais profunda é possível perceber que este trabalho transforma a previsibilidade e a rapidez em seus aliados. Não há sentimentalismo barato, o clima de claustrofobia é constante e não há preocupação em surpreender o espectador nas sequências de morte, apenas saciá-lo recorrendo aos clichês típicos. 

Terror - 91 min - 2004 

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Um comentário:

Ramon Pinillos Prates disse...

Tem muito tempo que eu vi esse filme, mas na época não lembro de ter curtido muito não.