Nota 5 Terror irlandês acerta na construção do clima, mas derrapa no final ao adotar clichês
O gênero terror é muito vinculado ao cinema norte-americano, mas já faz algum tempo que também criou raízes em países de línguas latinas e orientais. Contudo, uma produção da seara ainda é raridade na filmografia da maioria dos territórios. Só por isso já vale a curiosidade em torno de A Maldição da Floresta, um raro exemplar de horror oriundo do território irlandês que usa elementos da mitologia e folclore local em seu enredo. A trama tem como protagonistas o casal de ingleses Adam (Joseph Mawle) e Clare (Bojana Novakovic) que mudam-se com o filho bebê para a Irlanda e vão habitar uma região afastada e coberta por uma densa floresta. Os primeiros minutos são dedicados a estabelecer a dinâmica conjugal, bem como o clima opressor que os recém-chegados percebem desde os primeiros minutos com a convivência com os nativos.
Adam é um pesquisador ambiental enviado por empreiteiros para estudar as condições da região a qual pretendem desmatar para abrigar construções, o que gera descontentamento entre os demais moradores que acreditam na existência de criaturas demoníacas que podem ser despertadas pela invasão de suas terras. Colm (Michael McElhatton), o vizinho mais próximo, é um dos mais hostis, pois acredita que tempos atrás as tais entidades sequestraram sua filha pequena que nunca mais voltou. Em uma de suas primeiras andanças para reconhecimento da área, Adam se depara com uma espécie desconhecida de fungo e leva uma amostra para casa a fim de realizar alguns estudos. É a partir deste momento que a tensão não fica restrita ao lado de fora da casa do pesquisador, ou melhor, algo estranho parece querer invadir o local. Durante boa parte do tempo o diretor Corin Hardy, que também assina o roteiro em parceria com Felipe Marino, preocupa-se em apenas sugestionar o que realmente estaria acontecendo, assim se vale da crença do público na ilusão e na aceitação do desconhecido. Seriam de fato os tais seres folclóricos que habitam a floresta ou apenas os vizinhos querendo assustar a família para evitar a destruição do região e consequentemente seus despejos? Infelizmente, aos poucos o longa abre espaço para clichês comuns combinando a trama do tal fungo, um elemento capaz de colonizar corpos e mentes, e a das criaturas míticas.
A premissa não foge à regra de tudo o que já vimos envolvendo a batida história da família que em seu novo endereço enfrenta problemas de ordem sobrenatural, ainda que exista uma quebra de clichê nesse ponto. Ao invés de permanecerem no local tentando disfarçar que nada os assombra, assim que percebem coisas estranhas acontecendo o casal decide partir, mas acabam sendo impedidos por contratempos além de suas possibilidades de resolução. Então estreando como diretor de longas-metragens, Hardy segue a cartilha do estilo tirando proveito de alguns de seus paradigmas, como o isolamento dos protagonistas em um espaço limitado e hostil. O questionamento da natureza humana ou não de alguns personagens faz alusão ao argumento de O Enigma do Outro Mundo ao passo que a casa rústica do casal cercada por matagal de imediato evoca o imaginário do terror de cabana de A Morte do Demônio, por exemplo.
O cineasta extrai bons momentos da clausura da família explorando as possibilidades oferecidas pelo cenário, seja a amplitude da floresta reduzida a um microcosmo sombrio por conta do céu constantemente nublado ou da própria residência construída a base de madeira e pedra. Sequências de pavor genuíno, como a de um ataque ao sótão, garantem o interesse, mas o problema é quando o diretor resolve apresentar fisicamente o motivo das ameaças. Egresso do mercado de videoclipes e especialista em efeitos visuais, obviamente Hardy não perderia a oportunidade de colocar em prática seus conhecimentos técnicos já apresentados em alguns curtas que fizera antes. Os hallows, como são chamadas as criaturas da floresta, enquanto apenas seres imaginários de fato assustam, mas quando ganham corpo afetam negativamente o filme.
Ainda que aposte em efeitos práticos, como bonecos animatrônicos e maquiagens, e o mínimo de computação gráfica possível, as técnicas empregadas evidenciam as limitações de orçamento e a super exposição dos seres acaba diminuindo o impacto e prejudicando o ato final quando o tom mais fantasioso toma conta. É nesse momento que A Maldição da Floresta abandona toda a tensão construída pacientemente até então para se tornar um terror genérico entregue à perseguições, sustos baratos e gore. De qualquer forma, o final não desabona o restante do filme que mostra-se acima da média ao trazer em seu subtexto questões relevantes a respeito do desmatamento e até mesmo a manutenção de lendas preservando a cultura de um povo. Uma pena que a relação entre as consequências das ações egoístas do mundo capitalista com as crenças mitológicas seja desenvolvida de forma polida e calcada em uma fórmula estritamente hollywoodiana.
Terror - 97 min - 2016
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