sexta-feira, 22 de abril de 2016

O RITUAL (2011)

NOTA 7,5

Mesmo abordando as possessões
demoníacas por uma ótica
mais realista, longa não deixa
de fazer uso dos clichês
Filmes inspirados em fatos reais têm um forte apelo junto ao público, mas também podem despertar desconfianças. Quando os tais acontecimentos envolvem assuntos do além, as dúvidas quanto a veracidade dos fatos são ainda maiores, embora o número de curiosos pelo tema seja grande. Produções do tipo foram e continuam sendo lançadas aos montes diretamente em DVD e muitas são produzidas exclusivamente para canais de TV, o que já sugere que os argumentos não são dos melhores assim como os produtos também não inspiram confiança em suas partes técnicas, tanto que o subgênero dos longas sobrenaturais vira e mexe está em crise, mas ainda bem que sempre algum produto do tipo ao menos razoável pode ser encontrado em meio ao lixo e dar certo ânimo para confiarmos em sua recuperação. O Ritual é um bom exemplo disso, embora a primeira vista pareça algo descartável. Tendo como grande chamariz o nome do ator Anthony Hopkins nos créditos, a obra é baseada no livro homônimo de Matt Baglio, jornalista que conviveu alguns anos com padres exorcistas, entre eles Gary Thomas, protagonista da trama cujo nome foi trocado. Com tal experiência, o escritor aprendeu a distinguir uma possessão de uma doença mental e acompanhou dezenas de exorcismos. A trama roteirizada por Michael Petroni nos apresenta a Michael Kovak (Colin O’Donoghue), um rapaz que cresceu acompanhando de perto o fim da vida de dezenas pessoas em uma maca sendo arrumados para o enterro pelo seu pai Istvan (Rutger Hauer). Isso o fez crescer sem acreditar que existe algo depois da morte, assim ele se tornou um seminarista cético e decidido a abandonar seus trabalhos na igreja, mesmo após ter aulas sobre os sinais de possessão. Para não se arrepender mais tarde, seu superior o orienta então a passar um período no Vaticano para estudar rituais de exorcismo e quem sabe mudar de ideia e recuperar sua fé. Porém, suas dúvidas e questionamentos só aumentam na medida em que estreita seu contato com o Padre Lucas (Anthony Hopkins), um famoso jesuíta exorcista, e este o apresenta ao lado mais obscuro da religião. É quando Michael conhece a jornalista Angeline (Alice Braga), que investiga as atividades do religioso e as suas reflexões sobre a crença no Diabo e em Deus não param de crescer. Juntos, os dois jovens vão acompanhar os duros trabalhos do padre para tentar tirar o demônio do corpo de Rosaria (Marta Gastini), mas os conhecimentos de psicologia do rapaz o impedem de acreditar no que vê.
               
O palco está armado para discussões a respeito de fé, crenças, religião e razão. Os diálogos provocativos e cheios de significados tratam de segurar a atenção do espectador, embora a produção não seja excepcional e utilize os diversos clichês desse tipo de filme como, por exemplo, uma pessoa ligada a religião que é reticente quando o assunto envolve espiritismo ou então um religioso com belos e esclarecedores discursos, uma alma tão boa que é uma tentação para os espíritos do mal. O que diferencia este filme de tantos outros que já requentaram o tema exorcismo é que ele não se propõe a assustar com imagens explícitas e escatológicas, mas sim amedrontar com sua atmosfera que se beneficia de uma fotografia e iluminação que enaltecem o clima de mistério, além dos cenários instigantes que passam a ideia de frieza e de que algo inesperado pode acontecer a qualquer instante. O próprio personagem de Hopkins em certo momento dispara um cutucão ao clássico O Exorcista dizendo a seu pupilo que ele não deve esperar cabeças girando ou sopa de ervilha jorrando durante um ritual. Quem espera ver isso parta para outra opção. As intenções do diretor Mikael Hafström, que já havia lidado com as forças sobrenaturais em 1408, era tratar do tema exorcismo da forma mais madura e humanizada possível e de repente fazer os espectadores esquecerem o conceito de que tal tema deve sempre estar atrelado a um show de horrores. Bem, até certo ponto ele consegue manter a seriedade na narrativa, mas no final acaba descambando para cenas apoteóticas cheias de gritos e deformações nas quais se destaca o eterno Hannibal Lecter. Hopkins encarna literalmente o demônio e dá um show de interpretação amedrontando e até zombando dos pobres mortais. Ele se entrega totalmente ao papel e chega a ficar irreconhecível no auge da possessão. Apesar dos minutos finais investirem no inevitável embate entre o bem e o mal repetindo velhos clichês, no conjunto tudo funciona direitinho e traz certa sensação de frescor.

O início do longa tem um clima sombrio e lança mão de recursos interessantes para conectar o espectador a narrativa. De quebra a introdução desenterra das profundezas do ostracismo o ator Rutger Hauer. Ele e seu filho Michael, ainda criança, estão preparando um cadáver para o enterro. As lembranças de sua infância vira e mexe entram em cena como se fosse para lembrar que a morte sempre esteve presente em sua vida e que para ele não existe continuidade após o falecimento. O fim é estar em uma mesa sendo minuciosamente limpo e maquiado para ser depositado em um caixão. Com o convívio com o padre, o jovem tem a chance de acreditar em algo além da vida, mas em tudo ele tenta encontrar explicações racionais com base na psicologia. O ceticismo do personagem vai de encontro direto às dúvidas de boa parte do público que acaba se identificando e procurando saná-las com o auxílio do longa. Porém, as discussões que são geradas a partir do contato do rapaz com um especialista em exorcismo acabam diluídas em uma narrativa por vezes arrastada que ao menos inova ao enfocar o cotidiano dos profissionais da esconjuração. Hafström tentou deixar sua obra tão realista que acabou derrapando em suas próprias obsessões. A atmosfera inquietante acaba sendo quebrada literalmente pela tecnologia. Um toque de celular interrompe um exorcismo e mais a frente o aparelho volta à cena trazendo uma mensagem em alto e bom som do pai já falecido do jovem seminarista, duas situações ridículas que destoam no conjunto. Fora isso, as boas intenções do cineasta em tratar do assunto possessão se não chegam a ser concretizadas pelo menos não destroem o longa. O Ritual é recomendável para quem procura mais teoria do que sustos gratuitos. Para os brasileiros há a curiosidade de ver a atriz Alice Braga em cena, mas ela está tão insossa quanto seu colega Colin O’Donoghue. De qualquer forma, um título curioso e que vale uma espiada, ainda que a procura de um novo ocupante para a vaga de melhor filme sobre possessão não tenha nenhum candidato a altura. Pelo jeito o trono continuará sendo de O Exorcista por várias décadas. 

Terror - 113 min - 2011 

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Um comentário:

renatocinema disse...

Achei razoável.

Melhor que os últimos lançamentos do gênero.