segunda-feira, 18 de abril de 2016

DON JUAN DEMARCO

NOTA 8,5

Inspirado por folclórico personagem,
romance usa a fantasia para exaltar
o amor e o valor das mulheres e reúne
dois grandes astros de gerações opostas
Quando um rapaz é metido a conquistador, é comum a brincadeira de rotulá-lo como um Don Juan, mas quem teria sido esse homem? Na verdade ele é um personagem fictício cuja alcunha virou sinônimo de libertinagem. Originado no folclore espanhol, ele tornou-se uma figura do universo literário em meados do século 17 quando foi publicado o romance “El Burlador de Sevilla”, obra atribuída ao dramaturgo Tirso de Molina. O personagem essencialmente é um sedutor que se alimenta do prazer da glória das conquistas. Quanto mais difícil o alvo, maior a satisfação. Geralmente seduz mulheres compromissadas e em espaços públicos, as atraí para um lugar privado e depois que consuma o ato sexual faz questão de divulgar o feito para afrontar rivais e demarcar sua posição de superioridade. Desde que tal arquétipo ganhou seu registro em um livro, ele também serviu como inspiração para muitos outros folhetins, poemas, artes plásticas e peças teatrais que ajudaram a perpetuar a imagem dos conquistadores latinos de sangue quente, ganhando popularidade definitiva através da ópera “Don Giovanni”, de Mozart. O cinema obviamente também não deixou de beber nessa fonte. Além de o mito ter sido explorado nos anos 70 em uma clássica adaptação cinematográfica da opereta, duas décadas mais tarde o sedutor foi inserido na cultura das novas gerações de forma mais ousada. O romance Don Juan DeMarco não se limita a contar a história de um ícone da sedução, mas sim como seu legado pode influenciar visto que muitos estudiosos consideram tal conquistador a personificação do desejo e da frustração em relação ao romantismo. A trama começa com o psicólogo Jack Mickler (Marlon Brando) sendo chamado com urgência para ajudar a polícia a impedir o suicídio de um rapaz que ameaça pular de uma altura considerável. O médico pensa que este é apenas mais um caso corriqueiro dos males causados pelos tempos modernos (se em meados dos anos 90 as coisas já estavam difíceis, hoje em dia nem se fala), mas nem imagina que seu encontro com esse jovem irá mudar radicalmente sua vida pessoal e também profissional. Trajando roupas de época e uma máscara negra, ele é salvo e se apresenta como Don Juan DeMarco (Johnny Depp), o mesmo nome do lendário espanhol que segundo a crença teria se envolvido com cerce de 1.500 mulheres em apenas alguns anos de sua juventude.

Mickler convence o rapaz a lhe contar quais eram os problemas que o levaram a tomar a drástica decisão de acabar com a própria vida, mas acaba recebendo respostas díspares. Declarando ser o maior amante do mundo, ele estava sentindo uma profunda tristeza por justamente não ter conseguido conquistar o amor daquela que julgava ser a mulher de sua vida. Apesar de ameaçar suicídio, por outro lado, afirma desejar morrer pelas mãos do espadachim Don Francisco da Silva. Percebendo a confusão mental, o psicólogo decide entrar no jogo do paciente e até aceita ser chamado de Don Octávio Del Flores para conseguir interná-lo em uma clínica psiquiatra disfarçadamente. Na verdade, fazem um pacto. Se após dez dias o médico se convencer de que seu paciente é realmente o maior amante do mundo o rapaz estaria liberado, caso contrário seria submetido ao tratamento clínico mais adequado para distúrbios de personalidade. O parecer de Mickler em um primeiro momento é de que o jovem sofre de uma leve insanidade mental, mas o convívio o leva a ter dificuldades para distinguir o que é falso ou real nos relatos. Conforme se envolve com o caso, o médico começa a sentir influências diretas que o fazem repensar vários aspectos de sua vida e passa a questionar se o tal Don Juan realmente seria um esquizofrênico ou alguém totalmente lúcido quanto aos assuntos do coração. A mudança principal é que o contato entre eles acaba fazendo o psicólogo a reaprender a amar sua esposa Marilyn (Faye Dunaway) com quem há anos vivia uma relação estável e de respeito, mas sem o fogo da paixão de outrora. É interessante que o diretor e roteirista Jeremy Leven insere ao longo da narrativa flashbacks épicos que explicariam a origem do mito romântico. Don Juan nasceu em um pequeno povoado no México e, predestinado ao amor, seduziu sua tutora e partiu em seguida para uma viagem. Durante o trajeto, afirma que foi sequestrado por um bando de piratas, comprado como escravo e até trancafiado no palácio de um sultão, este último percalço que não foi de todo ruim já que no lugar havia milhares de mulheres para serem seduzidas. Chama atenção a passagem em que ele diz que um dos maridos traídos se enfureceu e para se vingar passou a espalhar o boato que vivia um romance às escondidas com a mãe do conqusitador há anos. Para defender a honra, seu pai intimou o rival para um duelo, mas acabou falecendo. Pela vergonha de provocar uma tragédia à sua família, Juan resolveu passar a usar uma máscara e jamais tirá-la na frente de outra pessoa. Isso seria outro delírio ou apenas uma fantasia para o paciente se esquivar de alguma culpa ou trauma?

Na época do lançamento gerou bastante expectativa o encontro entre o galã Depp e o veterano Brando, um duelo entre uma jovem promessa de beleza e talento (que felizmente se concretizou) e um legítimo Don Juan e grande ator dos anos áureos de Hollywood, ainda que surgisse em cena neste caso acima do peso e envelhecido, porém, em um dos raros momentos em que parecia estar se divertindo trabalhando. Foi o próprio intérprete do protagonista quem deu a ideia de uma lenda do cinema fazer o papel do psicólogo. A amizade entre Brando e Francis Ford Coppola, um dos produtores da fita, facilitou as coisas visto que o eterno “poderoso chefão” já estava em vias de se aposentar, diminuindo consideravelmente seu ritmo de trabalho. Obviamente o seu retorno às telas em uma aguardada produção colaborou para uma publicidade extra, se bem que nem havia essa necessidade. Só o fato de resgatar a memória de um personagem que se tornou ícone universal do romantismo já acarretava a propaganda necessária. Leven queria fazer um filme focado na alma das mulheres e dedicado também a elas, mas com uma pitada de sensualidade sem apelações baratas. O conquistador não é um promíscuo no caso, apenas um jovem que desde muito cedo se sentiu atraído pela beleza feminina e procurou amá-las com todas as suas forças para tentar lhes despertar amor próprio e autoestima, assim afrontando seus cônjuges que praticamente as domesticavam para lhes servirem. E porque um jovem em pleno século 20 teria tanto fascínio por uma época e um personagem tão distantes da realidade? É aí que está a graça de tudo. Ao mesmo tempo em que sabemos que os relatos não passam de delírios, torcemos para que pelo menos alguma coisa seja verdadeira e de fato existe: o amor é um sentimento que se renova, mas é preciso cuidar dele constantemente para não deixá-lo morrer. Don Juan DeMarco é uma produção que atravessa os anos em boa forma e seu texto continua totalmente apreciável. Esta é a chance de ver Depp em um de seus primeiros filmes relevantes e de cara limpa, ou quase isso já que dispensa a maquiagem pesada para adotar a máscara para esconder parcialmente seu rosto. Também podemos matar as saudades ou até mesmo conhecer um pouco do trabalho do saudoso Brando, mas é uma pena que a talentosa Dunaway seja pouco lembrada por sua atuação neste caso. Talvez o papel fosse pequeno demais para seu talento, mas ela enche a tela com sua beleza e é um grande prazer revê-la visto que também se tornou uma figura rara nos cinemas. Assim como Ghost- Do Outro Lado da Vida tornou-se clássico instantâneo e para os mais emotivos uma opção sempre bem-vinda, este filme também é lembrado pela canção-tema que marcou época. Na voz de Bryan Adams, “Have You Ever Really Loved a Woman” tornou-se automaticamente um hit, foi indicada ao Oscar e até hoje é tocada nas sessões nostálgicas das rádios populares.

Romance - 97 min - 1995

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2 comentários:

Anônimo disse...

Eu acho interessante essa temática, mas essa versão eu não assisti ainda.
Johnny Depp é um ótimo ator. Mas senti mais vontade de assistir o filme pela presença de Marlon Brando. Eu nunca vi filmes com ele.

Bjs ;)

Gilberto Carlos disse...

A música tema de Bryan Adams é maravilhosa. O filme também.