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NOTA 6,0
Baseado em um atordoante caso de manifestações demoníacas, longa peca ao condensar sem aprofundamentos mais de uma década de sofrimento de uma família |
Horror em Amitivylle, Invocação do Mal, Anabelle.... Todos estes
filmes têm em comum o fato de serem originados das experiências profissionais
vividas pelo casal Lorraine e Ed Warren. Não ligou os nomes às pessoas? De
fato, eles são mais conhecidos nos EUA e entre os fãs de terror, mas por
décadas se dedicaram fielmente ao estudo de fenômenos sobrenaturais e mesmo com
a morte do companheiro em 2006 a corajosa senhora levou adiante seus trabalhos,
inclusive cuidando da manutenção de um museu em sua própria casa. Nele estão
arquivados objetos levados como souvenires dos locais onde realizaram sessões
de exorcismos, uma maneira de tentar impedir que aqueles que imploraram ajuda à
dupla ou por ventura outros azarados viessem a sofrer com novas armadilhas do
além ligadas a tais peças. Apesar do repentino sucesso dos Warren nos anos 2000
graças ao cinema, um antigo telefilme baseado em um de seus causos já tirara o
sono de muita gente em madrugadas insones e deve ter rodado muitas casas nos
tempos das videolocadoras.
A Casa das Almas
Perdidas tem como protagonista a
família Smurl que em 1975 se muda para uma grande e bonita casa em uma nova
cidade onde são recebidos com muitas boas-vindas e quitutes pelos vizinhos,
tudo ao melhor estilo da beleza americana. Nos primeiros meses, nada de mais
aconteceu na residência, porém, não demorou muito para que estranhos fenômenos
passassem a perturbar seus habitantes, tanto de dia quanto a noite. A mais
afetada é a matriarca, Janet (Sally Kirkland) que passa a ouvir vozes lhe
chamando, barulhos estranhos, problemas com eletrodomésticos que parecem ter
vida própria e chega a ver vultos negros perambulando pelos cômodos. Jack
(Jeffrey DeMunn), seu marido, inicialmente acredita que a esposa esteja tendo
delírios, mas muda de ideia assim que presencia sua esposa sendo assediada por
um espírito libidinoso. Ele próprio também é praticamente estuprado por uma
dessas almas (uma cena grotesca, mas que na época deve ter embalado pesadelos).
Do jeito que o diabo gosta, aparentemente o jogo destes fantasmas seria
destruir a família usando a discórdia como ferramenta, por exemplo, colocando
Janet contra a sogra Mary (Louise Latham) que diz com convicção que por várias
vezes ouviu a nora falando palavrões e obscenidades, um ultraje para uma
família que tanto prezava a religiosidade.

Quando os filhos do casal Erin
(Michelle Collins), Colleen (Krista Murphy), Shawn (Ashley Bank) e Katie
(Allison Barron) também passam a ter problemas com os estranhos episódios, seus
pais decidem recorrer justamente à religião, mas tem o pedido de exorcismo
negado por conta de certas burocracias, na verdade muito mais convicções
católicas que obrigam seus membros a não acreditarem de que há muito mais
mistérios além do que suas crenças possam justificar. Larson (John O’Leary), o
padre da paróquia local, até tenta aconselhar a família, mas demonstra receio
de lidar com o sobrenatural. Eis que Janet toma conhecimento sobre os Warren e assiste
a uma de suas palestras na qual vai pessoalmente relatar seu problema. Ed
(Stephen Markle) e Lorraine (Diane Baker) visitam a casa e de imediato
presenciam estranhas manifestações, constatando que de fato existem espíritos
habitando o local, entre eles uma entidade realmente com vocação demoníaca. A
notícia então é divulgada para a imprensa como forma de pressionar a Igreja a
colaborar, mas a situação piora com a invasão de privacidade que a família
passa a sofrer. Diariamente dezenas de repórteres faziam plantão do lado de
fora da casa e não tardou para que romeiros se disponibilizassem para ajudar
com correntes e vigílias de orações. E o filme se resume a isso. Um rápido
passatempo que apenas condensa um martírio de mais de uma década em uma trama
levada no banho-maria, com sustos quase nulos e sem aprofundar os personagens,
seja no lado psicológico ou emocional.
Roteirizado por Darrah Cloud, baseando-se no livro “The Haunted: One
Family’s Nightmare” do jornalista Robert Curran, a narrativa compila os pontos
de vistas de 28 pessoas que tiveram algum tipo de contato com o caso, desde
percepções de curiosos até relatos dos próprios moradores colhidos na época.
Considerado um dos mais terríveis episódios envolvendo casas assombradas
ocorridos em território norte-americano, o longa obviamente não mostra nem a
metade dos apuros pelos quais os Smurl passaram, já que orações e água-benta
eram apenas soluções paliativas e a intervenção dos Warren revelou-se inútil.
Os caça-fantasmas chegaram a trazer outro padre, o Sr. Kent (Jake Jacobs),
especialista em exorcismos, mas sua reza em latim apenas enfureceu ainda mais o
demônio.

Entre longos períodos de tormenta
e alguns poucos de calmaria, os Smurl só foram ter sossego no final da década
de 1980 quando se mudaram novamente. Na nova casa as manifestações do além
continuaram, mas finalmente a Igreja reconheceu a gravidade da situação e
interviu com mais ferocidade, finalmente acabando com o longínquo martírio. Com
direção de Robert Mandel, que viria a fazer fama na TV com a direção de
episódios de séries como “Lost” e “Prison Break”,
A Casa
das Almas Perdidas peca no quesito efeitos especiais como de
praxe em antigos telefilmes que não gozavam do apuro técnico atual. As poucas
cenas que exigiam uso de trucagens, sejam de computação ou artesanais,
denunciam o orçamento modesto e hoje causam mais risos que sustos. Todavia, o
diretor preferiu se ater ao drama emocional e psicológico dos personagens,
ainda que a rapidez com que narra os fatos prejudique a percepção do espectador
quanto a dimensão do sofrimento da tal família. A agonia seria ainda maior por
conta de os fatos acontecerem em uma época de recursos midiáticos restritos,
assim os Smurl não tinham de onde tirar informações para se autodefenderem e a
sensação de que deveriam ser os únicos a viverem tamanho calvário certamente
era constante. Mesmo com o forte impacto do ceticismo dos membros da Igreja que
pode ter influenciado negativamente os rumos desta história, a produção se
esquiva de induzir o espectador a compactuar com ideias, preferindo se ater ao
modo como as vítimas reagiam aos fenômenos sobrenaturais sem tirar conclusões.
Apenas jogando fatos na tela, deixando praticamente todo fardo para Kirkland
carregar (o que lhe rendeu uma indicação ao Globo de Ouro), a narrativa
torna-se enfadonha, sentimos falta de discussões mais profundas a respeito de
crenças e nem mesmo temos a certeza de o porquê daquelas pessoas literalmente
sofrerem o diabo. Não há razão clara para terem sido escolhidos, o que também
enfraquece o final que deveria ser impactante indicando que a perseguição aos
Smurl continuaria mesmo em um novo endereço. Contudo, mesmo com suas falhas
narrativas, produção simplória e evidente envelhecimento, hoje esta obra curiosamente
consegue envolver muito mais que muita fita de horror badalada. Nem de longe
causa o impacto de outrora que muitos relatam, mas vale a pena uma conferida
sem criar grandes expectativas.
Suspense - 100 min - 1991
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