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NOTA 2,0 Continuação às pressa deturpa as qualidades conquistadas em Viagem Maldita apostando em trama capenga aliando terror e clichês de guerra |
No Brasil, Viagem Maldita não pegou, passou em brancas nuvens, efeito que
provavelmente aconteceu em muitos outros países devido a violência explícita da
fita. Em solo americano também fracassou, mas estranhamente os parcos lucros
abriram as portas para uma continuação que obviamente já devia estar
engatilhada antes mesmo do lançamento do primeiro filme. A pressa para jogar no
mercado uma segunda carnificina gerada pelo embate de humanos versus mutantes
foi um tiro no pé. O Retorno dos Malditos é uma
grande decepção já pelo argumento. Como parte de uma missão de treinamento, um
grupo de soldados americanos é enviado para uma remota região do Novo México
onde encontram um campo de pesquisas nucleares abandonado. Após presenciar um
sinal de perigo em uma montanha distante, os recrutas decidem iniciar uma
missão de busca e resgate por conta própria, porém, eles desconhecem o fato de
que cerca de dois anos antes o local fora visitado por uma família que sofreu o
diabo nas mãos de canibais. Esse é o fiapo que une os dois longas. No original,
na verdade uma refilmagem de Quadrilha de
Sádicos do mestre Wes Craven, o espectador era pressionado a confrontar uma
história sobre instinto primitivo e de sobrevivência, tanto por parte da
vítimas quanto dos vilões, um intenso e violento exercício principalmente
estético para qualquer diretor. A função ficou a cargo do francês Alexandre Aja
que entregou um trabalho digno de elogios indo fundo na bizarrice e
sanguinolência, mas sem perder a mão com o conteúdo em torno de críticas a
política e imperialismo dos EUA. Os insanos mutantes que atacaram a família
Carter eram justificados como descendentes de uma tribo que sofreu com os
efeitos nocivos da radiação gerada por experimentos com bombas nucleares
bancados pelo governo norte-americano. Com uma obra praticamente redondinha,
Aja sabiamente pulou fora da sequência, mas Craven infelizmente quis levar o
projeto adiante envolvendo-se como produtor e roteirista.
A ideia inicial era que um dos sobreviventes
dos Carter, a adolescente Brenda que fora interpretada por Emilie de Ravin,
traumatizada com tudo que vivenciou se aliaria ao exército como uma forma de
extravasar seus medos e raiva. Logo de cara, ela seria convocada para voltar ao
local onde tudo aconteceu, pois seria a única pessoa capaz de apontar a
localização exata onde se escondem os mutantes. Com agenda cheia por causa de
um seriado de TV, a atriz declinou o convite, mas Craven não desistiu e apenas
adaptou o argumento com a ajuda de seu filho Jonathan. Se Aja honrou a memória
de seu clássico setentista, fica claro que havia certa preocupação que a
segunda parte mantivesse o mesmo nível de qualidade, mas o diretor Martin
Weisz, de 60 Segundos, não
compreendeu muito bem a proposta e praticamente fez um filme de guerra com
soldados em meio a perseguições e tiroteios. O terror se faz presente em cenas
de forte impacto visual, mas jogadas em meio a trama, sem trabalhar o suspense.
Os ataques são diretos, praticamente sem armadilhas mirabolantes, e os humanos
caçados não transmitem a mínima sensação de sofrimento. Assim pouco nos
importamos com o que vai acontecer ao grupo de soldados formado pelo sargento
casca grossa Jeffrey (Flex Alexander), o politicamente correto Napoleon
(Michael McMillian), a recruta com pinta de mãezona Missy (Daniella Alonso), a
bonitona e corajosa Amber (Jessica Stroup), o esquentadinho Crank (Jacob
Vargas), o medroso e desengonçado Spitter (Eric Edelstein), o matador Delmar
(Lee Thompson), isso sem falar nos outros personagens que aparecem em cena
rapidamente só para marcar presença e aumentar a contagem de cadáveres. Se a
trama em si já não fosse o suficientemente desinteressante, os diálogos
travados entre esses indivíduos unidimensionais e estereotipados afastam qualquer
possibilidade para torcermos pela sobrevivência de algum deles. Haja paciência
para tantos palavrões e trocadilhos.
O longa até que tem um início
promissor. Aos adeptos de bizarrices, a sequência inicial apresenta um parto em
que além do sofrimento habitual da futura mamãe também temos a tensão provocada
por um ambiente inóspito e o nascimento de um novo ser mutante que desde cedo
já será doutrinado na base da violência insanidade. Pena que todo o interesse
despertado por tal cena não demore a se esvair e o nível de adrenalina e pavor
caia drasticamente quando a fita assume o ritmo de um thriller de guerra
capenga. Fora a introdução visceral, a única coisa que se salva é mais uma vez
o trabalho da equipe de caracterização que investe pesado no visual dos
mutantes, ainda mais deformados e nojentos e agora munidos de armas de fogo que
roubam dos militares, estes, diga-se de passagem, que mesmo com todo
conhecimento adquirido em treinamentos e com um considerável arsenal de defesa
em mãos acabam caindo nas emboscadas com facilidade constrangedora. A família
Carter, composta por pessoas comuns e algumas que nunca haviam segurado em uma
arma, passou por situações extremas no longa anterior e mesmo com algumas
baixas não sucumbiu a humilhação. Ficou feio para o pessoal do exército ianque
que deveria ser um obelisco de coragem e honra, mas desde os primeiros minutos
parecer esfalecer sob as temperaturas escaldantes do deserto. O resultado final
de tantos tropeços é que O Retorno dos
Malditos soa mais como uma paródia híbrida, um trash movie que
insulta os amantes do terror e não poupa o público das fitas de guerra. É
apenas a reciclagem mal feita de clichês de ambos os gêneros somadas a referências
de produções recentes, como a excessiva e nonsense violência no estilo Jogos
Mortais e a claustrofobia oriunda de fitas como Abismo do Medo já que boa parte da ação se passa em espaços
subterrâneos. Em tempo: Quadrilha de
Sádicos também teve uma péssima continuação lançada em 1985 que desonrou a
memória do longa original, mas o trabalho de Weisz não é inspirado nessa fita.
Seria isso algo a nos consolar por pensar que o desastre desta segunda parte
poderia ser ainda maior?
Terror - 90 min - 2007-->
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