terça-feira, 22 de setembro de 2020

A SÉTIMA ALMA


Nota 2,0 Apesar da boa premissa, longa é irregular e com aspecto datado afugentando público-alvo


Não é a toa que o diretor Wes Craven ganhou a alcunha de Mestre do Terror. Na década de 1980 ele deu vida a um icônico serial killer, o repulsivo Freddy Krueger de A Hora do Pesadelo, mas ele não só encontrou uma fórmula criativa e extremamente gráfica de assustar como também teve o mérito de certa forma pintar um retrato da juventude ianque suburbana que consequentemente viria a se tornar um espelho para jovens de outros países. Entre uma cena e outra de morte, o cineasta conseguiu inserir temas pertinentes ao universo de seu público-alvo como a perda da inocência e a sensação de impotência dos adolescentes diante de uma realidade que os sufocava. Os tempos eram outros e as produções de horror tinham uma preocupação maior com o conteúdo, assim por trás do sucesso da franquia (ou pelo menos de alguns de seus capítulos) haviam ideias relevantes para justificar os ataques em sonhos bem realísticos do cara das famosas garras afiadas. Muitos tentaram o mesmo sucesso investindo em vilões sarcásticos ou irremediavelmente impiedosos e o próprio diretor precisou se reinventar dentro das regras que o próprio ajudou a sedimentar. Contudo, A Sétima Alma, penúltimo filme do cineasta que faleceu em 2015, não tem um porquê de existir. Não traz nada substancial em seu enredo e tampouco assusta, pelo contrário, até exagera nos momentos de humor involuntário. A produção parece envelhecida em diversos aspectos e desconectada das novas gerações que pensam e agem na mesma velocidade de um computador top de linha. 

A trama se passa em Riverton, pequena cidade do interior que está sendo assolada por um serial killer conhecido como Estripador. Criativo não? O criminoso seria Abel Plenkov (Raul Esparza), um homem que anos atrás sofria com o transtorno de múltiplas personalidades e em um de seus surtos assassinou a esposa grávida na frente da própria filha pequena que por pouco teve sua vida poupada. Em um lapso em que recobra o seu juízo perfeito o rapaz pede socorro ao médico que já acompanhava seu caso de esquizofrenia, mas de nada adianta. Qualquer incauto que cruzasse seu caminho era cruelmente morto, até mesmo policiais e socorristas, porém, o maluco não era indestrutível. Bastante ferido, ele cai em um rio e acredita-se que tenha se afogado, embora seu corpo jamais fora encontrado. Na mesma noite fatídica houve o nascimento de sete crianças, coincidência que alimenta uma crendice local de que talvez o Estripador tivesse reencarnado em uma delas, ainda que não fosse totalmente descartada a hipótese de ele ter sobrevivido a queda no rio. 


Dezesseis anos se passam e acompanhamos a estranha comemoração de aniversário dos integrantes do grupo Os Sete de Riverton, como ficaram conhecidos aqueles bebês. Há alguns anos eles criaram um ritual como se fosse uma prova de coragem e imunidade ao medo, porém, neste ano, o escolhido Adam Bug (Max Thierot) mal consegue disfarçar seu incômodo diante do boneco que simboliza a tragédia. A cerimônia não ocorre como planejado e desde então o pânico toma conta da cidade com novos e cruéis assassinatos e o rapaz, atormentado por visões e pelo fenômeno das diversas personalidades, acaba virando uma importante peça para a resolução dos casos. Paralelo a isso, ele também tem que lidar com questões comuns à sua cidade e ao ambiente escolar como o bullying, as paqueras não correspondidas, as pressões dos estudos e o fantasma da rejeição pelo seu estranho modo de agir e pensar, mas nada que se compare ao seu temor de ser a próxima vítima ou descobrir que ele mesmo pode ser o assassino. Tais situações são forçosamente inseridas no roteiro para tentar dar alguma sustentação às sequências de assassinatos, não lembrando o traquejo de Craven para unir terror e discussões comportamentais como citado no início do texto. 

Partindo da teoria numeróloga (inventada, fique claro) de que o problema das múltiplas personalidades só começa a aparecer aos 16 anos porque a soma dos números resulta no número sete que representaria as almas diferenciadas que podem habitar um mesmo corpo, qualquer um dos jovens nascidos no dia do massacre poderia ser o assassino. Dessa forma, é criado um clima de incertezas e temor entre os alunos da aparentemente única instituição de ensino de Riverton. Embora não surpreenda em momento algum, o diretor não privilegia o espectador com informações prévias forçando-o a compreender os acontecimentos ao mesmo tempo em que os personagens, porém, não deixa dúvidas de que o próprio Plenkov poderia estar de volta à ativa, o que certamente deixaria tudo bem mais interessante. Apesar das várias possibilidades que o argumento poderia sugerir, o longa custa a se conectar com a geração WhatsApp. Tudo soa nostálgico. Temos os sustos nos espelhos, correria no meio do mato, o eterno conflito entre nerds e descolados e os mais salientes tendem a perder a vida antes dos puritanos. Dá a sensação de que o tio Krueger a qualquer momento vai atacar. Craven estaria com um bloqueio criativo, perdeu a noção de como assustar, não sabia que tipo de público iria atingir ou simplesmente não tinha em mente nem o porquê de realizar este filme? Na realidade ele havia concebido a primeira versão do roteiro em 1994, dois anos antes de lançar Pânico que mais uma vez o consagraria como um sinônimo do gênero horror. O argumento permaneceu o mesmo, mas faltou uma limpeza no script excluindo ideias ultrapassadas e criando novas (ou até mesmo copiando) situações mais intrigantes e até mesmo violentas que dialogassem mais facilmente com o espectador do novo milênio acostumado com carnificinas como Jogos Mortais e O Albergue. Contudo, o desenvolvimento da trama é tão esquizofrênico quanto seu protagonista e o ritmo irregular impera. 


O sanguinolento prólogo, um deleite para amantes de violência gráfica, vende a ideia de uma produção violenta e cheia de adrenalina, mas os minutos seguintes desconstroem a imagem positiva inicial apoiando-se na apresentação do enfadonho cotidiano dos Sete de Riverton, obviamente delineando muito bem os estereótipos em que cada um se encaixa. A trama volta a acelerar da metade para o final, mas a essa altura dificilmente torcemos para que algum dos jovens sobreviva e a curiosidade em torno da revelação da identidade do assassino é nula. Como a maioria das fitas de terror assinadas por Craven, as sequências de morte devem causar mais risadas que tensão devido aos exageros e idiotices dos personagens, composições de um elenco um tanto canastrão com destaque obviamente para Thierot que carrega o fardo do protagonismo, mas isso não é um elogio. Bug deveria ser uma criação complexa e cheia de camadas a serem desvendadas, mas o que vemos é o despreparo de um ator que vomita na tela os vários perfis que o estudante assume sem grandes preocupações com questões psicológicas e emocionais. Seu texto é tão bem pronunciado que é quase possível perceber os pontos e vírgulas. No mais, A Sétima Alma é apenas um esquecível passatempo para aficionados pelo gênero ou nostálgicos em busca do certo quê de inocência dos antigos slashers movies. Não estranhe se ao final lembrar de rebobinar a fita.

Terror - 107 min - 2010

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