NOTA 7,0 Continuação tardia procura explanar o passado de personagens carismáticos, mas peca ao praticamente oferecer mais do mesmo e desperdiçar Meryl Streep e Cher |
Quando um filme faz sucesso, os
próprios fãs pedem por continuações, mas os responsáveis pelas produções deveriam
ser mais cautelosos. Existem obras que deveriam ser únicas e assim permanecerem
como uma agradável lembrança do imaginário coletivo. O tiro no pé pode ser
ainda mais dolorido quando se resolve oferecer um passado aos personagens que caíram
no gosto popular, as chamadas prequels. É por esse caminho que envereda Mamma Mia! Lá Vamos Nós de Novo, continuação tardia
do musical de 2008 cuja ação se situa seis anos após os acontecimentos originais
que focava no casamento de Sophie (Amanda Seyfried) e seus vários conflitos com
Donna (Meryl Streep), sua mãe cuja identidade do pai da garota manteve em
segredo até ela subir ao altar. Todavia, o segundo longa volta no tempo para
mostrar a juventude da mãe coruja e explicar alguns desdobramentos para o
futuro da filha que agora se encontra sem o carinho materno. Isso mesmo. Donna,
o coração e a alma de Mamma Mia! agora já é falecida. Streep surge quase
nos últimos minutos para um número musical em flashback ao lado de Seyfried e
ainda no clipe final que reúne todo o elenco em uma cantoria apoteótica. Por aí
já temos ideia de que o filme em hipótese alguma chega aos pés do original, mas
ainda assim diverte com novas canções, diga-se de passagem, menos conhecidas do
grupo Abba, e repetindo outras marcantes. Obviamente a clássica “Dancing Queen”
não poderia faltar. Lily James assume a personagem da veterana atriz trazendo
certo frescor a um universo já enraizado na memória afetiva de boa parte dos
interessados na fita. O longa traz estopo ao passado das personagens tão
evocado no primeiro filme explicando como Donna foi parar na Grécia e seu envolvimento
quase simultâneo com Harry (Hugh Skinner), Bill (Josh Dylan) e Sam (Jeremy Irvine),
motivo da dúvida quanto a paternidade da filha que permeava toda a outra
narrativa. Também em pauta a amizade de longa data da protagonista com Rosie (Alexa
Davies) e Tanya (Jessica Keenan Wynn).
Como o filme original é agradável
e rápido de se assistir, quem gostou certamente já o viu dezenas de vezes,
assim as cenas do passado dos personagens não soam tão interessantes, ficando a
diversão por conta de buscar nos intérpretes mais jovens características que os
conectem com seus respectivos no presente. Christine Baranski, Julie Walters,
Pierce Brosnan, Colin Firth e Stellan Skarsgard também participam, mas brilham
menos agora. A desculpa para a reunião no presente na ilha grega é que Sophie,
agora grávida, está decidida a reinaugurar o hotel da falecida mãe e suas
lembranças inspiram a volta no tempo, mas no final a sensação que temos é
estranha, como se imagens desperdiçadas na edição do original foram tardiamente
compiladas. Apresentar os carismáticos e já conhecidos personagens em sua
juventude não chega a ser um trunfo. A novidade mesmo fica a cargo da luxuosa
presença, embora curta, da diva Cher como Ruby, a avó de Sophie que reaparece
após anos negligenciando a família, embora no outro filme seja sugestionado que
ela já estaria morta, e que tem a oportunidade de retomar um antigo
relacionamento com Fernando vivido por Andy Garcia, cuja existência só se justifica
para a inserção a certa altura da música homônima, mais um grande sucesso do Abba.
Falando nisso, as sequências musicais conduzidas pelo diretor OI Parker, tentando
ao máximo manter a aura solar e característica conquistada na primeira
empreitada por outra diretora, variam entre o esquemático e o coreografado imprimindo
certa suntuosidade nas apresentações em substituição à naturalidade dos números
musicais originais de Streep e sua turma. Talvez o grande equívoco tenha sido
colocar o projeto nas mãos de um homem uma vez que a trama gira em torno de uma
protagonista partilhando as atenções com outras coadjuvantes de peso. Se na
primeira trama os homens tinham participação de peso, aqui praticamente fazem
figuração. Todavia, quem admira os elementos aqui reunidos pode tanto
cantarolar e dançar junto e com entusiasmo redobrado como também pode torcer o
nariz visto que muitas canções do primeiro filme são reinterpretadas e mais da
metade do longa soa como descartável, uma desculpa para capitanear em cima de
uma ideia nostálgica assim como o clima que permeia toda a produção.
Por sua vez, quem já detesta o
gênero musical por si só passe longe de Mamma
Mia! Lá Vamos Nós de Novo, uma verdadeiro ode ao exagero que tenta
a todo custo escamotear seus erros. Embora queira complementar com informações
do passado a trama anterior, que abdicou dos flashbacks e jogou aqui e acolá no
texto alguns fatos anteriores para justificar alguns do então presente, nem
todos eles batem. Se antes Harry era apontado como o terceiro possível pai de Sophie,
na reconstituição agora ele passa a ser o primeiro da fila, assim como mudam as
ordens dos encontros de Donna com os demais pretendentes. A tia-avó da jovem,
que teria deixado uma herança para ela e a mãe, foi solenemente ignorada agora.
Por outro lado, a paixonite febril de Rosie por Bill não foi esquecida, assim
como a homossexualidade de Harry e o desencontro derradeiro entre Donna e Sam que
causou tanto alvoroço a todos. Além de explicar a relação dos personagens originais
com a paradisíaca ilha grega e apresentar alguns novos, qual o conflito da trama?
Obviamente o filme não se sustentaria apenas à sombra das saudades de Donna.
Parker escreveu o roteiro buscando respeitar ao máximo o universo transformado em
um respeitável musical da Broadway por Catherine Johnson, mas era preciso não só
dar uma história de vida aos personagens como também um futuro. Sophie está às
voltas com a reinauguração do hotel e com o nascimento do bebê, mas sozinha.
Sky (Dominic Cooper), seu marido, está fazendo um curso de hotelaria em Nova
York e recebe uma oferta de trabalho que o deixa tentado, assim o casamento entra
em crise. Apoiando a jovem está apenas Sam, agora viúvo, enquanto seus pais
postiços estão distantes e compromissados. Obviamente, todos os homens da vida
de Sophie irão rever suas escolhas e zarpar rumo a ilha a tempo da festa de
reinauguração. Embora não mantenha o entusiasmo do original, a dinâmica do
elenco jovem com o maduro segura as pontas, assim como a direção que investe em
cores e movimentos. A decepção fica mesmo por conta do pouco tempo de cena de
Streep e Cher, que também só chegam a dividir a cena na confraternização final.
Duas divas sem interagirem é um desperdício sem justificativas.
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