quarta-feira, 27 de abril de 2016

AS FÉRIAS DA MINHA VIDA

NOTA 7,0

Flertando com o drama e a comédia,
longa é previsível, embora a trama
tenha desenvolvimento acima da média
e o carisma de Queen Latifah colabore
Quando um ator marca em um determinado gênero de filme ou tipo de papel, parece que ele está com a carreira amarrada para sempre. Ou se dedica a fazer o mesmo de sempre ou então aceita o ostracismo eminente. Quando tentam fazer algo diferenciado o público também não dá um voto de confiança e a crítica colabora para espalhar o preconceito. Queen Latifah, embora tenha ganhado destaque mundial ao ser indicada ao Oscar de coadjuvante por seu trabalho no musical Chicago, continua com uma imagem estigmatizada que a atrapalha. Suas formas roliças, por ser negra, cantora com ênfase no estilo black music, por mostrar predileção pelas comédias, enfim ela reúne muitas características que acabaram a enclausurando em um perfil único. Ela seria uma espécie de Whoppi Goldberg dos novos tempos. Ambas já trabalharam em diversos dramas, mas a imagem de humorista as persegue. Talvez para tentar variar e ao mesmo tempo não assustar o público, Queen tenha aceitado protagonizar As Férias da Minha Vida, projeto tragicômico que não fez sucesso ao ser lançado, mas com o tempo caiu no gosto popular, principalmente aos adeptos de filmes que trazem mensagens positivas e de estímulo.  Nesta história a atriz vive a personagem Georgia Byrd, uma simples e tímida vendedora que gozava de uma vida com poucos momentos memoráveis, procurou sempre fazer o melhor para agradar aos outros e nunca conseguiu viver um grande amor. Sua rotina muda completamente quando ela é encontrada desmaiada e levada ao médico. Diagnosticada com uma doença terminal que pode matá-la em poucas semanas, ela então decide jogar tudo para o alto e aproveitar ao máximo o tempo que lhe resta neste mundo. Claro que por se tratar de um trabalho humorístico o final já é previsível. Seria uma atrocidade sem tamanho matar a protagonista se o objetivo maior é fazer o espectador dar risadas. Bem, o lado cômico não é o forte deste produto, mas algumas sequências inspiradas são oferecidas a partir do momento em que a protagonista resolve recuperar o tempo perdido e se hospeda em um hotel europeu de luxo para relaxar e se divertir. Nem os funcionários e hóspedes conseguem se manter na normalidade com a chegada dela. A moral da trama é bem clara: viva intensamente cada minuto como se fosse o último. Pelo menos até quase o final ficamos livres de frases-clichês do tipo. O sentido delas é traduzido em imagens. 

Dirigido pelo chinês Wayne Wang, de Encontro de Amor, o longa aparentemente é mais uma comédia na qual Queen vai interpretar uma mulher durona, que fala um monte de gírias e que a qualquer momento irá mostrar seu talento para dança ao som de rap ou algo do tipo. Porém, podemos ter uma grata surpresa, principalmente os preconceituosos. Obviamente, não temos aqui uma obra-prima ou candidato a cult. Também não poderíamos esperar muito de um enredo batido e recheado de situações conhecidas, algumas até absurdas como uma pessoa decidir provar todo o cardápio de um restaurante com medo de não ter mais tempo para desfrutá-lo. Fora o início um pouco incômodo, aos poucos vamos nos acostumando com a história que deixa o tom de comédia escrachada de lado para adotar uma postura de drama leve, aquele que sempre deixa no final uma mensagem edificante. Isso transformaria o roteiro automaticamente em algo piegas, mas, a partir do ponto em que o público fica na dúvida se o inesperado pode acontecer e realmente a protagonista vir a falecer, a coisa muda de figura. É preciso dar um crédito a um trabalho que mesmo estando evidente qual será o final consiga nos deixar com a pulga atrás da orelha em certas partes, um aspecto positivo que já o diferencia em meio a tantas produções semelhantes. O problema é que para se chegar a parte boa da história é preciso ter paciência e boa vontade. Como já dito, o início da trama não é cativante e um tanto mal cuidado. Por outro lado, é muito boa a idéia que surge nessa primeira etapa do “Livro das Possibilidades”, um tipo de arquivo dos sonhos de Georgia. Nele ela coloca tudo o que gostaria de fazer ou que lhe acontecesse. É com base nestas memórias fictícias que passa a pautar seus possíveis últimos momentos de vida.
Bem, fora o texto que transmite um pouco a sensação de frescor, merecendo assim destaque os roteiristas Peter Seaman e Jeffrey Price, o que segura a atenção nesta produção é a atuação de Queen. Ela enche a tela, literalmente. Não é apenas sua forma física que a transforma no centro das atenções, mas também seu carisma e entusiasmo. Se não fosse por alguns diálogos nem perceberíamos que estamos acompanhando o cotidiano de uma personagem que acredita estar à beira da morte. Ela simplesmente transmite muita credibilidade e energia positiva através de seus gestos para aqueles que estão numa pior e ainda passa a ser a representante não-oficial dos marginalizados ao disparar boas críticas às pessoas poderosas. Seu trabalho ganha um reforço quando surge o personagem de Gérard Depardieu, formando assim uma dupla no mínimo curiosa. Ainda tem gente que liga o nome do ator à produções dramáticas, mas na realidade ele gosta muito de atuar em comédias e aqui ele interpreta um chef de cozinha que não se conforma com os hábitos alimentares modernos da elite que prefere passar fome a engordar ou adquirir um pouquinho de gorduras que eliminariam rapidamente com um pouco de exercício. Viver para ele é isso, é saciar todas as vontades quando bem desejar. Por isso o cozinheiro se aproxima de Georgia. O apetite dela para ele é como um elogio e juntos eles travam diálogos bem interessantes, mas Wang perde boas piadas visuais, como o ator imitando um porco, por cometer erros primários de enquadramento. Nem mesmo ao fotografar os Alpes suíços, onde parte da trama se desenrola, o diretor consegue bons takes. Embora não surpreenda no estilo de filmagem e tenha se enrolado na concepção de várias cenas, ao menos o cineasta merece um crédito por não ter transformado As Férias da Minha Vida em um show de piadas escatológicas, caminho mais fácil que alguns adotam para “salvar” projetos fadados ao fracasso. Neste caso, optou-se por encarar a derrota eminente nas bilheterias e a chuva de críticas negativas rotulando o filme como previsível ou bobo. Para quem sabe identificar pontos positivos e relevantes onde praticamente ninguém os vê aqui está mais uma boa dica. Certamente, ao chegar a conclusão, muita gente irá ficar com vontade de ter também um “Livro das Possibilidades”. A sensação de depois poder montar o “Livro das Realizações” deve ser única e um prazer exclusivo de quem aprecia os bons e singelos momentos da vida.
Comédia - 112 min - 2005 
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