quarta-feira, 3 de junho de 2020

OS QUERIDINHOS DA AMÉRICA


Nota 4 Argumento interessante e crítico a respeito do mundo das celebridade rende obra simplória 


Após ganhar o Oscar por Erin Brockovich - Uma Mulher de Talento, Julia Roberts desacelerou sua carreira, preferindo se dedicar as personagens de mãe e dona de casa na vida real, mas na década de 1990 sua vida era bem diferente. Estrelou muitos filmes, procurou desafiar-se e cada passo seu era vigiado por fotógrafos e jornalistas de plantão. Ela fechou sua década de sucesso ironicamente vivendo uma estrela de cinema em crise no romance Um Lugar Chamado Notting Hill, como se desse um recado à imprensa dizendo que sua profissão é a de atriz e que ela tem o dever de cumprir sua agenda de eventos ligados ao seu trabalho, mas quando está fora dos sets de filmagens ou das entrevistas coletivas ela é uma mulher comum que deseja ser amada, ter uma família e, acima de tudo, ter privacidade. Ela também teve a chance de expor implicitamente seus pensamentos quanto aos mecanismos da indústria do entretenimento e da fofoca na comédia Os Queridinhos da América, uma espécie de vingança dos envolvidos na produção de um filme contra os profissionais do jornalismo que quando participam de uma coletiva de lançamento não estão muito atrás de ver se o produto final ficou bacana, mas sim em flagrar gafes, desentendimentos ou deslizes das estrelas. 

Convidada para ser a protagonista, Roberts preferiu um papel mais discreto, porém, não menos importante na trama. Ela vive Kiki, uma mulher tímida que trabalha como assistente de sua irmã Gwen Harrison (Catherine Zeta-Jones), uma famosa atriz que está prestes a se separar definitivamente de seu marido, o também ator Eddie Thomas (John Cusack), um cara metido a galã que não se conforma que sua ex está de caso com o galanteador espanhol Hector (Hank Azaria). O problema é que a vida conjugal destes astros está intimamente ligada com o sucesso profissional de ambos. Após estrelarem quase uma dezena de produções, agora eles têm um novo lançamento para entrar em circuito de exibição e precisam manter as aparências de que ainda formam um casal feliz e apaixonado. Kiki então entra em ação para evitar atritos entre sua irmã e seu ex, mas conforme passa a ter um contato mais próximo com o antigo cunhado eles se apaixonam e passam a viver um romance as escondidas. Enquanto isso, Lee Philips (Billy Crystal), o responsável pelo marketing do novo filme, precisa desesperadamente dos sorrisos e acenos de mão do casal mais querido de Hollywood para enrolar o público e a imprensa, pois o diretor do projeto, o excêntrico Hal (Christopher Walken), não quer liberar o trabalho para exibição em meio a fofocas de separação. 


A ideia era fazer uma crítica à própria Hollywood, mas com um fundo romântico. Com um elenco grandioso e um bom enredo em mãos, o diretor Joe Roth acabou se atrapalhando em suas próprias ambições. A imagem insegura que este trabalho passa tem uma razão de ser. O próprio cineasta atira para tudo quanto é lado em sua carreira, mas parece nunca acertar um bom alvo. Já tentou atuar, dirigiu até então quatro títulos esquecíveis do calibre de A Vingança dos Nerds 2 (imaginem o que é essa pérola!), mas conseguiu um bom currículo como produtor da Disney até que se desligou da empresa e resolveu abrir sua própria produtora. Este seu novo trabalho atrás das câmeras seria o grande filme de inauguração da empresa, mas não rolou. Na época o público já sabia que elenco numeroso e famoso não é o bastante para assegurar as qualidades de um longa. Pouco tempo antes surgiu Ricos, Bonitos e Infiéis, comédia reunindo bons atores, mas que logo na arte de sua publicidade já deixava no ar a falta de graça do projeto. Por uma infeliz coincidência, o material de divulgação do filme de Roth guardava semelhanças consideráveis. Falha grave do pessoal de marketing da distribuidora que poderia ter virado o jogo positivamente mesmo com um produto fraco a ser trabalhado.

O roteiro do próprio Crystal, assinando também como produtor, é um pouco tendencioso, pois as melhores piadas aparentemente ficaram com seu personagem. Ele também erra na construção do relacionamento entre Kiki e Thomas, assim como também não convence que algum dia o astro foi verdadeiramente apaixonado por Gwen, deixando latente que os queridinhos do cinema viviam mais por conveniência, afinal lucraram muito com a parceria. Todavia, o texto coroteirizado por Peter Tolan tem boas sacadas como a introdução de um diretor obcecado pela perfeição e ineditismo, uma espécie de homenagem sarcástica ao então recém-falecido Stanley Kubrick que passou quase uma década trabalhando em seu ambicioso e derradeiro filme, De Olhos Bem Fechados, e não chegou a ver o fracasso que seu trabalho se tornou. Nicole Kidman e Tom Cruise eram os protagonistas e vieram a se separar em meio ao lançamento do longa após um duradouro casamento, assim também não é errado considerar Gwen e Thomas como uma citação ao outrora casal modelo de Hollywood. Na época da estreia de Os Queridinhos da América a própria Roberts rompeu com o também ator Benjamin Bratt.
 

Com a onda de separações fervilhando na Meca do cinema, parecia que tudo conspirava a favor para uma publicidade extra para esta comédia que prometia sacudir o coreto, mas o resultado não causou o menor terremoto. De qualquer forma, esta produção passa longe de ser completamente um erro, pois garante uma sessão descompromissada e sem efeitos colaterais. O grande problema do projeto é a simplicidade do texto e dos personagens para um elenco que alcançaria comprovadamente resultados melhores. A conclusão, com a exibição do tal filme misterioso, coloca uma pá de cal sobre o restante do longa que poderia ficar um pouco acima da classificação de regular se Roth e Crystal não deixassem explícito que no final tudo acaba em pizza, inclusive nas entrevistas coletivas onde o que importa é rolar confusão. Quem sabe se Roberts tivesse brigado com um paparazzi ou apresentado um novo namorado durante o lançamento as bilheterias não teriam sido diferentes. Mas filme meia-boca rende dinheiro? A resposta é uma só: publicidade é tudo, seja luxo ou seja lixo.

Comédia - 102 min - 2001 


Leia também a crítica de:

Um comentário:

Luís disse...

Faz bastante tempo que assisti a esse filme, me lembro pouco dele, mas goto do elenco. Capaz mesmo que seja bem ruinzinho, comédias românticas às vezes têm bem pouco a oferecer, outras vezes conseguem pelo menos divertir.

Cara, passa no meu novo blog que discute cerimônias do Oscar: http://eooscarfoipara.blogspot.com.br/ Estamos discutindo o ano de 2010, quando Sandra Bullock venceu Melhor Atriz.