sexta-feira, 23 de abril de 2021

UMA CHAMADA PERDIDA


Nota 1 Mais uma refilmagem de terror oriental fracassa pela falta de criatividade e clima de tensão


Já diz o ditado: tudo que é demais enjoa. E assim aconteceu com a onda de refilmagens de fitas de terror orientais que, apesar de intensa, não chegou a durar uma década. Colaborou para o esgotamento da seara o fato dos próprios produtores de olhinhos puxados reivindicarem seus espaços no mercado internacional, assim as vezes até o filme original e o remake disputavam a preferência de público quase que simultaneamente. Uma Chamada Perdida representa um dos últimos suspiros dessa toada em Hollywood, talvez até ajudando a enterrar de vez a ideia de produções inspiradas em fitas de horror japonesas, chinesas e afins. Sem ritmo e confusa, a trama tenta criar um vínculo entre uma série de mortes violentas e misteriosas através de chamadas de celulares. A vítima da vez recebe uma ligação, mas ao atender a linha cai. Logo em seguida, percebe que existe uma mensagem na caixa postal na qual escuta com sua própria voz as suas últimas palavras (gritos, gemidos e pedidos de socorro) e ainda fica sabendo pelo display do aparelho o dia e a hora exata em que morrerá, obviamente em questão de pouco tempo. O próximo a morrer é sempre alguém que estava na lista de contatos da vítima anterior e assim sucessivamente.

A jovem estudante Beth (Shannyn Sossamon) e o policial Jack Andrews(Eward Burns) acabam tendo seus caminhos cruzados por conta dessa estranha rede de ligações, ela uma vítima desesperada para encontrar uma forma de escapar da maldição e ele o homem da lei que se encarrega do caso ainda com o agravante de sua irmã possivelmente ter falecido por conta do mesmo esquema macabro. A garota já havia perdido duas pessoas próximas envolvidas nessa intriga e estava investigando por conta própria para tentar proteger uma amiga que também recebeu a chamada. É nesse momento que ela também descobre ser uma vítima potencial. Para sustentar o filme fadado a dar voltas em um mesmo assunto, é inserida uma trama paralela, diga-se de passagem inútil, na qual Beth ainda precisa enfrentar seus temores em relação ao olho mágico da porta de sua casa, algo que remete a lembranças ruins de sua infância. Quantos filmes de terror você já não assistiu que unem em um mesmo roteiro premonições relacionadas a mortes, traumas envolvendo problemas na infância e manifestações do além através de aparelhos eletrônicos? Pois é, deste engodo não sai absolutamente nada de novo e o repeteco ainda é muito mal feito.


É possível perceber que o terror oriental gosta de trabalhar com pessimismo a dependência dos seres humanos quanto a tecnologia, ironicamente mesmo sendo seus países representantes grandes polos de fabricação de engenhocas. Isso é perceptível desde O Chamado quando uma maldição se manifestava pela exibição de uma sinistra fita caseira de vídeo. A refilmagem em questão é do filme Ligação Perdida, lançado em 2003 e já dando sinais de desgaste da fórmula em seu próprio continente, tanto que ficou inédito em vários países. O ineditismo do enredo, digamos assim, provavelmente deve ter sido a carta na manga que o diretor francês Eric Valette acreditava ter. Então estreando em Hollywood, o cineasta já abre seu longa atestando que não deseja imprimir personalidade alguma em seu trabalho e busca desesperadamente simbolismos para justificar o cerne de seu enredo. Seu telefone, sua vida. Dessa forma, os crédito iniciais são ilustrados por cenas que atestam o quanto o celular se tornou onipresente em nossas vidas. Quem nunca bradou que iria morrer porque saiu de casa sem o aparelho que atire a primeira pedra. Para os personagens, suas sobrevivências dependem literalmente do celular, em solucionar o enigma que envolvem as estranhas ligações e suas relações com as macabras visões que os condenados passam a ter.

O diretor usa e abusa de convenções do gênero carregando nos efeitos sonoros para assustar e direciona repetidas vezes sua câmera para relógios numa tentativa frustrada de gerar tensão, assim como o excesso de alertas das vítimas quando poucos minutos de vida que lhes restam. Mesmo com erros de continuidade e falhas para dar ritmo ao longa que parece se arrastar além do necessário, a culpa do desastre não é apenas de Valette. O roteiro de Andrew Klawan é repleto de diálogos expositivos, mas mesmo assim ficamos com a sensação de que ele próprio não sabia como conduzir e justificar seu argumento. Entre alguns dos tropeços podemos citar o momento em que alguém tem a brilhante ideia de simplesmente deletar sua lista de contatos para tentar barrar a corrente de mortes e acaba sendo impedido pela mocinha que também se esquiva de procurar ajuda de alguém especializado em assuntos sobrenaturais. Por fim, a explicação dada para as origens das ligações soa confusa e a essa altura o espectador nem encontra mais sentido para nada por já ter cochilado várias vezes e perdido a linha de raciocínio. As cenas de assassinatos deveriam manter a tensão, mas são feitas sem esmero algum e os próprios personagens parecem conformados com o destino e não fazem nada para evitá-lo.


Mesmo sem contar com um bom roteiro, é certo que muitos filmes de terror acabam dando razoavelmente certo pelo simples fato de contar com um clima suficientemente amedrontador para fazer com que o espectador se envolva e não dê atenção aos problemas estruturais da obra. Uma Chamada Perdida não apenas sofre de um péssimo enredo como se revela um completo desastre que decepciona em todos os quesitos. Não nos sentimos imersos na atmosfera angustiante na qual os personagens deveriam estar não só por culpa do diretor quanto a concepção de uma ambientação sombria, mas Valette também peca feio na condução dos atores que parecem perdidos em cena. Admirável inclusive a apatia de Burns que já se meteu a fazer as vezes de diretor em outros longas. Esperava-se um mínimo de inteligência emocional do ator para se virar mesmo sem orientações de terceiros. Sua situação piora ainda mais com a investida do roteiro em criar um envolvimento amoroso entre seu policial e a protagonista, algo totalmente desnecessário para uma ideia que tinha tudo para tirar o sono do espectador. Ao final provavelmente a única e amarga lembrança que você terá deste filme seja do irritante toque de celular que vai grudar em sua mente.

Terror - 87 min - 2008

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