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NOTA 5,0 Adaptação de Roman Polanski de clássico literário é esteticamente bela, mas fica a dever em emoção e é estranha à filmografia do premiado diretor |
Inocente até o último fio de
cabelo, não demora para que Oliver caia em uma armadilha e entre em contato com
o submundo. Sem perceber passa a praticar furtos induzido por um jovem malandro,
Artful Dodger (Harry Eden), que faz parte de um grupo de trombadinhas que vive
sob a batuta do velho Fagin (Ben Kingsley), um judeu que logo trata de ensinar
o "ofício" ao novato. Apesar da aparência bizarra e de ganhar a vida
através do trabalho de crianças, o novo tutor tem um comportamento ambíguo. Se
por vezes Fagin é severo, não são raros os momentos em que demonstra certa
preocupação com Oliver, mas o mínimo de carinho que recebe deste homem não é o
bastante. Felizmente o garoto não desiste de melhorar de vida e o destino
coloca em seu caminho um burguês de alma caridosa, O Sr. Brownolw (Edward
Hardwicke), justamente sua primeira vítima de assalto que se comove com a
situação do garoto e o adota informalmente dando-lhe roupas, alimentação e
prometendo uma educação digna. No entanto, o bando de criminosos não irá desistir
de trazê-lo de volta para o lado da bandidagem, até por medo de que o esquema de corrupção de
menores venha à tona. O malvado Bill Sikes (Jamie Foreman), parceiro de crimes
de Fagin, e a prostituta Nancy (Leanne Rowe), agora se encarregam de fazer a vigilância
de Oliver e acreditam que exista alguma conexão mais forte entre o menino e o
rico burguês e querem tirar proveito da suspeita. E o filme então segue o
calvário do protagonista acompanhando uma sucessão de encrencas em que se mete
tentando conquistar uma vida digna e feliz, mas sempre comendo o pão que o
diabo amassou nas mãos de pessoas ruins e gananciosas. O roteirista Ronald
Harwood tentou ser o mais fiel possível à obra homônima escrita por Charles
Dickens em 1838, uma história que faz parte do inconsciente literário mundial.
Você pode até não conhecer a trama em seus pormenores, mas de sua essência deve
ter suas lembranças de adaptações ou referências daqui ou dali. A versão
assinada pela dupla de roteiro e direção do aclamado O Pianista obviamente não é uma reprodução completa do livro. Seria
impossível resumir em pouco mais de duas horas todo o conteúdo, assim diversas
passagens e personagens foram suprimidos ou acabaram mal inseridos na narrativa
final, mas nada que interfira na apreciação do filme.
Polanski, após lidar com o pesado
e delicado assunto do nazismo em seu trabalho anterior, que inclusive lhe valeu
seu primeiro, merecido e porque não dizer tardio Oscar, queria fazer um filme
voltado para toda a família, mas conhecendo sua filmografia obviamente não
optaria por algo de degustação fácil. Se no aclamado filme homônimo lançado em
1948 e dirigido por David Lean, considerada a mais notória adaptação do livro,
a trama se misturava à realidade que vivia os horrores da Segunda Guerra Mundial,
anos mais tarde Polanski manteve a tônica adicionando à narrativa lembranças de
sua infância que até certo ponto guarda semelhanças com o que é vivido pelo
protagonista. Na Polônia ocupada por nazistas o futuro diretor de cinema também
se via obrigado a viver fugindo e se escondendo. O universo degradante que
retrata não separa as pessoas entre o bem e o mal. Todos tem seu lado positivo
e negativo, como a certo momento revela Nancy e o próprio Oliver. Aliás, com a
história praticamente toda focada nas aventuras e desventuras do protagonista, foram
exigidos muitos esforços do jovem Clark, na época com apenas 11 anos de idade.
Escolhido a dedo, o garoto tinha a aparência desprotegida e olhar cândido que o
personagem pedia, algo que fica evidente logo no início quando o órfão é sorteado
em uma brincadeira para a difícil missão de reclamar da pouca quantidade de
comida oferecida aos internos do orfanato, praticamente um campo de
concentração. Seu contato com os habitantes do submundo ao longo do filme lhe
tiram um pouco de sua inocência, mas jamais atingem seu puro coração, uma
construção de perfil bem conduzida por Polanski. Percebe-se todo um cuidado na
formatação dos personagens buscando o máximo de veracidade, mostrar pessoas com
suas virtudes e defeitos, alegrias e tristezas. Até o repugnante Fagin tem lá
seus momentos de leve amabilidade, fruto da sensibilidade e talento de Kingsley
que encarna com perfeição um vilão que na ânsia de sempre se dar bem acaba não
raramente traído por seus próprios atos. A caracterização perfeita dos atores e
figurantes, assim como a reconstituição cenográfica riquíssima em detalhes para
expor a degradação de Londres, é fruto de uma competente equipe técnica que se
baseou em gravuras da época, imagens que também inspiraram a ilustração dos
créditos iniciais e finais. É uma pena que todo o apuro técnico e empenho dos
atores não consigam elevar o Oliver Twist de
Polanski a um mero passatempo infelizmente passível de esquecimento. Falta
emoção à história e acompanhamos as situações com certo distanciamento, até
mesmo pelo fato da previsibilidade imperar, o que associado a longa duração
torna o programa monótono.
Drama - 130 min - 2005
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