terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

AS MÚMIAS DO FARAÓ

NOTA 6,0

Com pinta de produção americana,
aventura francesa tecnicamente é
ótima, mas falha ao mesclar gêneros
e deixar as múmias em segundo plano
Por mais que o tempo passe infelizmente ainda o público em geral cultiva uma imagem errada do cinema feito fora de Hollywood, rotulando automaticamente as produções como  realizações que visam exclusivamente atender aos anseios da crítica especializada e para colecionar indicações a prêmios. Por causa desse pensamento metódico e arcaico muitos filmes excepcionais acabam encontrando dificuldades para chegaram ao mercado e se comunicar com o grande público.  Porém, vez ou outra produtores e diretores desafiam esses conceitos e investem em algo que possa se assemelhar ao cinemão americano, claro que guardadas as devidas proporções. Não chegam a arrebatar multidões e tampouco o resultado final é excepcional, porém, a experiência é válida para termos contato com outras culturas e maneiras de se fazer cinema.  Histórias ambientadas em mundos fantásticos ou que apresentam algum tipo de herói que possam dar origem a uma franquia ainda são raros investimentos fora dos EUA, mas aos poucos as coisas estão mudando e esse pode ser um caminho a ser desbravado, claro que com o apoio de uma boa campanha de marketing. Esse poderia ser um ponto para justificar o desconhecimento de boa parte do público da existência de As Múmias do Faraó, aventura francesa que poderia suprir a vontade de ver algo novo e fora do eixo Hollywood. É uma pena que aliada à falta de propaganda, a obra em si está longe de ser um trabalho primoroso, pelo contrário, tem graves problemas de ritmo ao não conjugar bem ação, comédia e até mesmo drama. Contudo, surpreende quanto aos aspectos técnicos contando com ótima trilha sonora, fotografia, figurinos e cenografia. A trama se passa no início do século 20 e tem como protagonista Adèle Blanc-Sec (Louise Bourgoin), uma espécie de Indiana Jones de saia e batom. Ela é uma jovem e corajosa repórter que já viveu muitas aventuras, mas no momento quer se dedicar a uma missão pessoal. Ela decide viajar para o Egito para encontrar a cura da doença de sua irmã Agathe (Laure de Clermont-Tonnerre) que vive em estado vegetativo desde que sofreu um acidente. Há indícios de que a solução estaria dentro da tumba secreta de Patmosis, uma múmia que em vida dedicou-se à medicina, mais especificamente a cuidar pessoalmente do lendário faraó Ramsés II.

Adèle pretende levar a múmia para Paris e entregá-la para o professor Esperandieu (Jack Nercessian), um especialista em história antiga que desenvolveu uma forma de ressuscitar os mortos, mas para tanto terá que enfrentar Dieuleveult (Mathieu Almaric), um velho desafeto que está disposto a impedir a viagem da moça. Enquanto isso, na capital francesa, o mestre ancião continuava com seus experimentos e conseguiu fazer um ovo dos tempos dos dinossauros chocar e dar vida a um pterodátilo que passa a aterrorizar a cidade e parece só obedecer aos comandos do professor como se fosse hipnotizado. Quando está longe de seu “criador”, o animal jurássico recobra seus instintos naturais de caça para sobrevivência. Fazendo uma crítica a hierarquia atual e comprovando que preguiça é um problema muito antigo, o caso é levado até as autoridades do governo francês que uma a uma o passam adiante até que o pepino chega às mãos do inspetor Capolini (Giles Lellouch), um bonachão que podia ter evitado muitos problemas caso fosse mais atento afinal o dinossauro saiu voando pela primeira vez da casa do professor praticamente debaixo do nariz dele. Quando finalmente seus neurônios conseguem ligar os pontos, o velho cientista acaba sendo condenado à guilhotina, o que atrapalharia os planos de Adèle. Ao retornar para Paris, a aventureira percebe que coisas estranhas estão acontecendo e o pânico tomou conta da população, mas sua principal preocupação é barrar Capolini e para tanto ela terá a colaboração de Andrej Zboroeski (Nicolas Giraud), um jovem inteligente, mas pouco confiante e que mal consegue pronunciar o próprio nome, assim coleciona tentativas frustradas de conquistá-la. Apesar do título, está claro que esse não é um filme convencional de múmia, aliás, elas quase fazem figuração tendo participação ativa somente nos minutos finais, o que pode ser decepcionante para os fãs de aventuras no deserto. Por outro lado, o visual desenvolvido para essas criaturas milenares é algo único, criações que dá vontade de assistir com opção de câmera lenta só para observá-las mais detalhadamente. Talvez nunca a sétima arte as tenha apresentado dessa maneira, contudo, seus movimentos rígidos podem causar estranhamento pelo fato do público ter se acostumado com a agilidade dos mortos-vivos da franquia A Múmia. Já o tal pterodátilo não é uma criatura para receber elogios, principalmente quando é apresentado muito de perto, totalmente falso. De qualquer forma, o destaque mesmo é dado à heroína feminina já que as garotas nas aventuras geralmente são retratadas apenas como o interesse romântico dos mocinhos, aquela figura necessária para sofrer nas mãos dos vilões e levar as histórias ao clímax.

Baseado em "Les Aventures Extraordinaires d'Adèle Blanc-Sec", de Jacques Tardi, estes quadrinhos franco-belgas são desconhecidos no Brasil e consequentemente o longa-metragem tem dificuldades para achar seu público, embora tenha na bagagem uma passagem de sucesso pelos cinemas franceses e ter sido exibido no Festival de Cannes. Talvez para rivalizar com as aventuras protagonizadas pelos famosos heróis Asterix e Obelix (detentores de uma filmografia em desenho animado e também em live-action), as histórias de Adèle surgiram inicialmente como tiras em jornais e no início ela era uma escritora de ficção que depois passou a se dedicar ao jornalismo investigativo. Sempre com olhar crítico e abordagens interessantes, foram nove livros publicados entre 1976 e 2007 contando as aventuras dessa aventureira que ganhou sua versão cinematográfica graças a Luc Besson, cineasta, roteirista e produtor que alterna projetos ambiciosos hollywoodianos, como O Quinto Elemento, com produções menores em sua terra natal, como o cult Subway. Na realidade faz tempo que ele deve estar obcecado pelo comum comentário “nem parece um filme francês” e tem apostado cada vez mais em produções em estilo americano de olho no faturamento. Infelizmente, As Múmias do Faraó não corresponderam às expectativas. Os primeiros minutos trazem um arsenal de informações que podem confundir assim como o excesso de personagens, embora exista uma narração para auxiliar o espectador. Conforme a narrativa avança as coisas vão sendo colocadas em seus devidos lugares e conseguimos nos situar melhor no enredo. O problema é a falta de unidade da obra. A aventura e o suspense brigam por espaço com o humor que parece sobressair (comédia à moda francesa fique claro) e o diretor comete um grave deslize a certa altura ao colocar a protagonista em uma cena relaxando em uma banheira com os seios a mostra por consideráveis minutos. Não era um filme-família? De qualquer forma, a narrativa não é de todo ruim, é pontuada de bons momentos como a sequência de fuga de Adèle do Egito, algumas piadas envolvendo Zboroeski e o passeio das múmias por Paris admirando a paisagem e até sugerindo um detalhe arquitetônico que se tornaria característico do prédio do Museu do Louvre. A irônica cena final dá um excelente gancho para uma paródia de um dos maiores sucessos do cinema de todos os tempos, Titanic, mas os anos passam e uma nova chance para Adèle na frente das câmeras parece cada vez mais distante.

Aventura - 107 min - 2010 - Dê sua opinião abaixo.
-->
AS MÚMIAS DO FARAÓ - Deixe sua opinião ou expectativa sobre o filme
1 – 2 Ruim, uma perda de tempo
3 – 4 Regular, serve para passar o tempo
5 – 6 Bom, cumpre o que promete
7 – 8 Ótimo, tem mais pontos positivos que negativos
9 – 10 Excelente, praticamente perfeito do início ao fim
Votar
resultado parcial...

Um comentário:

Luís disse...

Infelizmente, eu não conheço essa obra, mas acredito que deva ser interessante. Honestamente, gosto de filmes franceses, mas não acho que já tenha visto um filme de ação ou aventura produzido por esse país, o que é uma pena! O seu texto mostra um filme que, apesar de parcialmente deficiente, vale a pena ser conferido.

Gostaria de sugerir um blog do qual faço parte para que você visse, chama "Um Oscar por Mês" - título quase autoexplicativo:
http://umoscarpormes.blogspot.com/
Espero que o confira, será legal ouvir sua opinião lá.