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NOTA 6,0 Animação tem visual caprichado e original, mas peca no quesito narrativa com seu ritmo arrastado e trama por vezes enfadonha |
Os filmes de animação levam certa vantagem em termos de
impacto em relação aos demais gêneros. Dificilmente nos decepcionamos com as
criações visuais, sejam de personagens ou cenários, ainda mais quem realmente
curte e entende de cinema e tem noção das dificuldades que cercam a produção de
cada minuto de um desenho. É um trabalho respeitável, mas nem só de imagens se
faz um filme, mesmo se ele for uma obra muda. É justamente a narrativa de 9 – A
Salvação o seu grande problema. Apesar da forma escolhida para contar a
história seja um chamariz para o público infantil, certamente a garotada não
irá curtir, todavia, até para os adultos o envolvimento fica comprometido.
Embora curto este desenho parece ter uma narrativa extremamente arrastada, sensação
acentuada pela temática razoavelmente pesada do enredo e a falta de humor.
Conteúdo relevante oferecido com estética de produto infantil, isso cheira a
Tim Burton, certo? Bem, realmente o criativo cineasta está envolvido neste
projeto, mas apenas como produtor apadrinhando o trabalho do diretor estreante
Shane Acker que concebeu esta animação primeiramente como um curta-metragem como
projeto de conclusão de curso da faculdade. Além de vários prêmios em festivais
universitários, o aparente pequeno trabalho acabou extrapolando limites, sendo
exibido no Festival de Sundance e chegou a concorrer o Oscar da categoria em
2006. O curta trazia como personagem principal um boneco de pano com olhos que parecem
binóculos cujo nome era um tanto diferente, o numeral 9. Ele habitava um mundo
destruído e vivia cercado por ruínas e bugigangas quebradas ou sem serventia e
nesse cenário caótico este pequeno ser vagava sem rumo, apenas carregando as
trágicas lembranças da morte de seu amigo 5 e da ocasião em que enfrentou uma
máquina exterminadora. Esta simples sinopse deixava muitas dúvidas e
curiosidades no ar e foi a vontade de explorar mais este universo enigmático
que levou Acker a trabalhar em cima do projeto de um longa e não é difícil
identificar os elementos que levaram Burton a investir na ideia: a atmosfera
sombria, o visual impactante dos personagens, o medo do desconhecido e um
protagonista solitário sentindo-se sem rumo na vida. Contudo, mesmo com a ajuda
de um cineasta renomado, transformar um curta em um longa-metragem não foi
fácil e a produção levou cerca de quatro anos para dar esse salto evolutivo,
porém, o resultado final ficou aquém do esperado. Pode parecer estranho, mas um
filme com aproximadamente 80 minutos de duração acabou sendo menos eficiente que
uma produção de 10 minutos. A economia de explicações cedeu espaço para
desnecessárias explanações que no fundo caem no lugar comum: a ganância e o
desejo do poder do homem é que destruíram o mundo, dando a entender que o
cenário em que a trama é desenvolvida é o Planeta Terra, outro dado omitido no
curta.

Outras citações a filmes famosos estão espalhadas ao longo
da narrativa de forma implícita ou explícita. Temos na narrativa alusão a O
Exterminador do Futuro, o visual das feras lembra os modelos das naves da
primeira versão de Guerra dos Mundos e sobram referências a Matrix e outras
ficções, além de um trecho que resgata a magia da canção “Somewhere Over the
Rainbow”, tema do clássico O Mágico de Oz, entoada enquanto os bonequinhos
festejam uma vitória contra as máquinas, mas o clima suave e alegre é quebrado
repentinamente com o ressurgimento do vilão. Fora as citações tão comuns no
gênero das animações, como já dito o ponto alto da produção é seu visual rico
em detalhes, com cores escuras e envelhecidas e iluminação baixa, e os designs
dos personagens, estes que podem aparentar serem feitos com a técnica do
stop-motion (animação com massinhas), mas Acker lançou mão de alta tecnologia
conseguindo resultados incríveis, uma estética originalíssima que deu aos
bonecos de panos um irresistível aspecto artesanal, uma textura perceptível
como se eles fossem feitos de lã ou algum tipo de fibra. Com designs
simpáticos, é fácil se sentir cativado pelo grupo de números, ainda mais porque
cada um é dotado de ao menos uma característica de fácil identificação, sendo
obviamente o 9 o mais carismático por conta de sua determinação, uma lição para
aqueles que costumam desistir de seus objetivos diante das dificuldades,
mensagem que pode ser entendida a questões mais complexas como a destruição da
Terra. O homem não deve desistir e se conformar que o planeta está em perigo,
mas deve encarar o problema com seriedade e ter a consciência que seus atos
errados podem influenciar. É uma pena que poucos conseguem fazer a associação
do conteúdo do filme e problemas da realidade e se lembrar da velha história
que o lixo jogado na rua hoje pode ser a enchente de amanhã que causará mortes
e destruição diante de uma animação de tanta qualidade técnica, mas que fica
devendo em termos narrativos infelizmente. Embora arrisque a falar até da
temática morte de maneira madura, inserindo cenas de humanos entre os escombros
e mantendo o desfecho da obra que originou o longa, a obra caminha bem até a
sua metade por instigar a curiosidade do espectador, mas depois disso torna-se
enfadonha com diálogos que explicam além do necessário para a compreensão e
cenas de ação comuns. 9 – A Salvação recupera o fôlego na reta final deixando
uma mensagem de esperança para a continuidade da Terra, mas de qualquer maneira
não é uma animação perfeita, deixando que seu visual torne-se mais importante
que seu conteúdo. De qualquer maneira vale uma conferida para conhecer o
trabalho de um cineasta que não fez estágio nos desenhos infantis e partiu
diretamente para falar com gente grande.
Animação - 79 min - 2009
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