NOTA 10,0 Longa trata de temas ligados à terceira idade com emoção, humor e protagonistas cativantes |
Chegar à velhice com saúde e
ainda conseguindo manter certa independência financeira e até mesmo dos
parentes é o sonho de qualquer pessoa que deseja ter uma vida longa, afinal de
contas o que adianta viver muitos anos sem poder aproveitá-los plenamente? A
co-produção entre a Argentina e a Espanha Elsa e Fred – Um Amor de Paixão
trata justamente sobre os problemas e anseios da terceira idade, uma fatia da
população que cada vez cresce mais e precisa reconquistar seu espaço na sociedade.
Eles não estão mortos por isso ainda tem o direito, ou melhor, o dever de
sonhar e fazer planos para o amanhã. Rotina, manias, amor e lembranças dos
protagonistas são abordados pelo divertido e emocionante enredo desenvolvido
pelo diretor e roteirista Marcos Carnevale. Elsa (China Zorrilla) é uma mulher
de 82 anos cheia de vida que procura aproveitar ao máximo cada novo dia. A
viúva passa a sentir certo interesse em seu novo vizinho, o também idoso
Alfredo (Manuel Alexandre), que perdeu sua esposa há sete meses. O problema é
que ele é muito introspectivo, sofre por ser hipocondríaco e preferiu
aproveitar seus últimos anos de viva isolado tendo apenas a companhia de seu
cachorro de estimação. Eles se conhecem por conta de uma das trapalhadas de Elsa
que bate sem querer seu carro no da filha de Alfredo e é obrigada a pagar os
custos do concerto. Logo nos primeiros minutos já descobrimos o perfil da
idosa. Ela espia a movimentação da mudança do vizinho, foge para não pagar o
prejuízo que causou com o carro e inventa uma desculpa lacrimejante para não
entregar o cheque à filha de Alfredo, mas não a julguem como uma pilantra. Digamos
que no jargão popular ela é uma velhinha sacudida. O vizinho, ao contrário, é
sincero, recluso, correto, metódico e demonstra ter bom coração. Pouco a pouco
seu pacato cotidiano vai ganhando vida com os insistentes convites para sair e
telefonemas de Elsa, que um dia já foi uma bela mulher que lembrava a
protagonista do filme A Doce Vida, de
Frederico Fellini. Apaixonada pela cena em que a musa entra na Fontana di
Trevi, em Roma, e se declara para o mocinho, a espevitada senhora sonha em um
dia poder repetir a sequência lá mesmo naquele monumento.
Apesar de a história contar com
situações e diálogos previsíveis, os co-roteiristas Lilly Ann Martin e Marcela
Guerty em parceria com Carnevale conseguiram fazer uma premissa simples crescer
ao ponto do longa divertir e emocionar em proporções semelhantes e com ótimas
sequências vividas com intensidade pelo ótimo casal de protagonistas. A
mensagem da trama é simples: a vida está aí para ser vivida e o relógio não
pára. São várias as frases e cenas marcantes que traduzem literalmente esta
realidade. Em uma das conversas, Elsa diz que Alfredo não tem medo da morte,
mas sim de viver. Reclama de aproveitar um bom jantar com medo que o alimento
provoque alguma doença, mas o alerta de que quando ele realmente estiver preso
a uma cama sentirá por não ter vivido esse prazer. Ele acha um absurdo a conta
do restaurante, mas os bons momentos que guardará na memória daquela refeição
não há dinheiro que pague. É curioso, mas após estas duas mensagens de efeito,
é inserida uma sequência que as desconstrói. Elsa convence o amigo a sair de
fininho do restaurante para não pagar a conta e quando estão no carro indo
embora Alfredo pensa que estão sendo perseguidos pela polícia e passa mal. Quando
vai ao hospital é alertado que não pode comer comidas pesadas, açúcar e viver
emoções fortes, tudo aquilo que ele experimentou em menos de duas horas. Essa é
apenas uma das ótimas lembranças que este longa certamente lhe deixará, mas não
basta achar belo, é preciso compreender sua mensagem. As pessoas planejam
demais o amanhã, sem nem mesmo saber se ele vai existir, e esquecem-se de viver
o agora. Elsa realiza suas vontades o mais rápido possível sem medir
conseqüências e talvez por causa desse seu desprendimento é que conquistou uma vida longa e de qualidade, mas nem o mais
forte dos seres humanos está livre de alguma surpresa do destino como o longa
sutilmente induz.
A bela história de amor
construída pelos protagonistas nos faz por alguns momentos esquecermos que são
dois idosos em cena. Praticamente eles estão descobrindo o amor como um casal
de adolescentes, mas mais do que isso estão dando um ao outro um motivo a mais
para viver. Elsa tem o objetivo de resgatar a felicidade perdida de Alfredo
enquanto ele faz o possível para acreditar nas mentiras contadas pela
companheira para deixar a vida mais alegre. Fugir da realidade é a ordem para
se viver por muito tempo e com qualidade? Não levando totalmente ao pé da
letra, talvez esta seja a grande mensagem que nos deixa Elsa e Fred – Um Amor de Paixão,
uma obra que mais que nos provar que nunca é tarde para amar, serve para nos lembrar
de que nunca é tarde para viver. Esse sentimento de recomeço é totalmente
evidenciado pela forma de agir e se comportar de Alfredo que inicialmente é um
senhor abatido, cabisbaixo e de olhar triste, mas que depois passa a ter mais
segurança ao caminhar e falar e não se envergonha de dar uma exagerada
gargalhada em público. Para evidenciar essa mudança comportamental, até mesmo
os movimentos de câmera e a trilha sonora tornam-se importantes. Embora
privilegiem a contemplação, é perceptível uma leve aceleração em seus ritmos
quando o idoso finalmente é contagiado pelo entusiasmo de Elsa, esta que do
início ao fim tem sorrisos para dar e vender. Como qualquer ser humano ela é
imperfeita. Comete erros propositalmente e fala e faz o que bem entende, mas
está longe de sofrer de algum tipo de demência decorrente da idade. Totalmente
lúcida, a personagem é inspiradora. Seja você criança, adolescente, adulto ou
idoso, certamente irá se apaixonar por este filme admirável que nos faz lembrar
que o amor não depende necessariamente do sexo para existir. Sem trocar nenhuma
carícia exagerada, Elsa e Fred colocam no chinelo muito casalzinho de romances
adolescente. Respeito e admiração seguram esta relação e assim é que o amor
entre eles surge, um sentimento que os faz querer viver mais e mais até que o
tempo lhes permita.
Comédia romântica - 105 min - 2005
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