
Ter certo apego a algum tipo de religião faz bem, mas pode
se tornar algo perigoso quando as crenças tomam proporções exageradas. São
vários os casos espalhados pelo mundo todo sobre pessoas comuns que
repentinamente passaram a ser idolatrados como ídolos religiosos, mas tais
exemplos são mais frequentes em países latinos devido as suas tradições
predominantemente católicas. Também são corriqueiras as notícias de que em
regiões menos favorecidas muitas mortes acontecem e geralmente envolvendo
imigrantes que buscam melhores condições de vida, sendo que as mulheres são as
principais vítimas. O diretor Kevin James Dobson aliou estes dois temas
em
A Virgem de Juarez, que traz a atriz Minnie Driver interpretando Karina
Davies, uma repórter investigativa que viajou para Juarez, uma pequena e
antiquada cidade que fica na fronteira entre o México e os EUA, para fazer
reportagens sobre a série de assassinatos de mulheres que estavam ocorrendo no
local. A coincidência é que todas as vítimas são imigrantes e operárias de
fábricas da região, o que indica que uma gangue organizada está envolvida
nestes casos. Todavia, o que impressiona a jornalista é a história da “Virgem
de Juarez”, uma garota que sangra nas mãos através de misteriosas chagas, semelhantes
a de Jesus Cristo quando crucificado, o que seria um sinal de santidade.
Mariela (Ana Claudia Talancón) reforça os boatos afirmando que viu a Virgem
Maria e que ela lhe passou uma missão. Karina então vê a garota ser explorada
como um símbolo religioso com o consentimento de Herrera (Esai Morales), um
pároco local, e vai fazer de tudo para abrir os olhos da jovem e denunciar o
esquema de corrupção ali instaurado, contudo, vai acabar mexendo em um
verdadeiro vespeiro. Como a personagem de Driver diz, em outras palavras, se
muitas reportagens foram publicadas sobre estas situações problemáticas e nada
foi feito para barrá-las não se deve abandonar os casos. Mesmo com todos os
indícios sobre exploração de trabalhadoras, sequestros, mortes e ligação de
grupos religiosos com estes e outros crimes, as autoridades pouco fazem para
detê-los alegando falta de estrutura e problemas burocráticos para agirem
ativamente. Por isso até hoje os noticiários vira e mexe trazem a tona tais
assuntos e muitas vezes com finais trágicos.

A Virgem de Juarez é um drama aparentemente atemporal afinal
é preciso continuar publicando as denúncias para pressionar as autoridades e
alertar a população. Bem, nesse sentido até que o roteiro de Michael Fallon,
baseado em diversos fatos reais, tem sua serventia, pois mostra de forma
eficiente como os grupos criminosos agem nas regiões menos favorecidas. Como a
polícia é vagarosa, os bandos se aproveitam dos imigrantes que chegam para
trabalhar nas fábricas instaladas por lá. As fronteiras do México abrigam
muitas multinacionais americanas que se instalam por ali para pagar menos
impostos e ter mão-de-obra barata, assim é muito fácil aliciar garotas pobres e
com pouco grau de instrução para a prostituição e comércio de drogas. Este
drama mantém o foco mais em cima dos crimes de exploração sexual, mas mexe um
pouco mais na ferida ao fazer uma ligação desse submundo com o catolicismo.
Após uma garota sobreviver a uma tentativa de estupro e surgir com stigmatas o
próprio padre local parece apoiar a iniciativa de transformá-la em um ícone
religioso capaz de atrair devotos até mesmo de outros países em busca de
milagres. A índole do pároco ainda é questionável pelo fato de seu irmão ser
metido com crimes e mesmo assim ficar com a responsabilidade de guardar em
segurança a suposta garota-santa. Até aí o filme vai bem, mas o problema é que
seus realizadores não tiveram coragem em se aprofundar nestes temas e assim
ficamos sem respostas claras quanto aos benefícios que os religiosos, a polícia
e os governantes de Juarez recebem com a exploração da fé e por se fazerem de
cegos quanto aos atos dos criminosos que parecem ter passe livre. Portanto
temos aqui apenas o razoável registro de uma denúncia que ainda tem muito a
revelar. Quanto a produção e as atuações, bem, a julgar pela preguiçosa duração
do longa (descontando créditos iniciais e finais não chega a uma hora e meia de
arte), dá para imaginar o padrão: toque de caixa e piloto automático
respectivamente.
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