NOTA 8,0 Embora trate de um assunto delicado, longa adota um tom descontraído e revitaliza premissa batida e depressiva |
O
longa dirigido por Jonathan Levine guarda boa parte de seus trunfos na relação
entre Adam e seu grande amigo Kyle (Seth Rogen). Um é o oposto do outro tanto
no aspecto físico quanto na personalidade, mas existe uma cumplicidade única
entre eles e que fisga a atenção do espectador logo nos primeiros minutos. Kyle
está sempre disposto a elevar o astral do rapaz, que em um primeiro momento
fica sem reação ao saber da doença, e suas tentativas para fazer o bem divertem
o público, embora suas ideias sejam típicas de um jovem que se esqueceu de
crescer. Para ele o melhor remédio neste caso é aproveitar a vida ao máximo sem
se preocupar com o amanhã, ou seja, na sua visão do problema, simplesmente
farrear a vontade e pegar quantas garotas puder, afinal a morte iminente traria
como talvez único benefício o fato de não poderem lhe atribuir
responsabilidades póstumas. Adam leva na boa as infantilidades do amigo e por
incrível que pareça ele próprio não está tão preocupado com seu estado de
saúde, sentindo-se perfeito ou pelo menos deixando transparecer uma falsa
tranquilidade. Obviamente a uma certa altura será impossível conter seus
sentimentos e chegará o momento dele extravasar a sua raiva, embora não existam
culpados para o aparecimento do tumor, isto seja uma triste fatalidade. Na sua
luta pela vida ele ainda conta com a ajuda da mãe, a zelosa Diane interpretada
com vigor por Anjelica Houston, uma mulher que procura restabelecer os laços
afetivos com o filho neste momento difícil após anos de distanciamento sem
motivo aparente e que também se desdobra para dar o máximo de qualidade de vida
ao marido que há anos sofre com o Mal de Alzheimer. Outra colaboração
importante é a da psicóloga estagiária Katherine vivida por Anna Kendrick, que
passa a ser o interesse romântico do protagonista quando ele termina o namoro
ao descobrir que era traído pela garota com quem sonhava em se casar, ou
melhor, ao constatar que a moça só mantinha o relacionamento para não magoá-lo,
esperando um momento oportuno para chutá-lo sem causar maiores danos que alguns
dias de coração partido. O interessante da relação estabelecida entre paciente
e médico neste caso é que não existe um instinto de superioridade de um para o
outro. Os dois estão no mesmo barco se adaptando as suas novas realidades.
Adam, embora tenha um semblante maduro, mostra suas fragilidades ao lidar com
os obstáculos que a doença lhe impõe e pouco a pouco vai se convencendo de como
pode se sair bem dessa, aceitando inclusive com bom humor raspar o cabelo. Já
sua analista ainda não tem as manhas de como lidar com os clientes, sendo pouco
sutil na maior parte do tempo, mas no decorrer da trama vai conquistando
confiança em si mesma e consequentemente para impor em seu trabalho. Na troca
de experiências, os dois saem ganhando. Ela ganha bagagem para sua vida
profissional e ele incentivos sinceros para seguir em frente, além é claro do
amor que surge e que delicadamente é sugerido.
Levine não abre mão das inevitáveis implicações,
discussões e dúvidas a respeito do câncer, mas é curioso como ele consegue
introduzir o humor a uma premissa que tinha tudo para descambar para um
lacrimoso drama. Como já dito, boa parte da graça é carregada pelo personagem
Kyle, que traz consigo piadas relativamente grosseiras, a especialidade de seu
intérprete, mas no geral o riso involuntário surge da forma embaraçosa como as
pessoas que cercam o protagonista o abordam quanto a doença, fazendo jus a
expressão pisando em ovos. Não são raros os momentos em que ocorre uma saia
justa, mas Adam tira de letra e não leva as coisas para o lado das provocações.
Lembrando, assim como ele está se ajustando a sua nova realidade, quem está ao
seu lado também precisa fazer o mesmo. Com muita naturalidade nas apresentações
das situações e nas interpretações, permitindo inclusive alguns improvisos dos
atores nos momentos em que a descontração é permitida, 50% não deve ser visto
como uma obra cujo objetivo principal seria quebrar os padrões que o gênero
construiu ao longo dos anos para temáticas que envolvem problemas de saúde. O
filme simplesmente quer contar uma boa história de maneira realista, afinal de
contas a vida de ninguém é uma eterna comédia ou um dramalhão sem fim. A
realidade de todos é feita de bons e maus momentos, sorrisos e lágrimas, e
mesmo quando estamos vivendo um período difícil sempre haverá espaço para uma
pontinha de alegria e vice-versa. Embora
cumpra seu papel em trazer explanações a respeito do câncer não apenas a nível
hospitalar, mas principalmente provando que o paciente pode e deve tentar levar
uma vida absolutamente normal na medida do possível, diga-se de passagem, uma
mensagem entregue ao público de forma muito mais eficiente que muitos dramas,
esta produção é rotulada comercialmente como uma comédia. O correto seria uma
“dramédia”, um subgênero não oficial que é uma constante veia de trabalho do
cinema independente, nicho no qual esta fita está inserida. Aquelas produções
consideradas “comédias-cabeça” geralmente tem uma mesma base. Pegar um assunto
espinhoso e trabalhá-lo de forma leve, mas sem jamais abdicar do direito de
levar o público a reflexão. E é por essa razão que trabalhos desse tipo merecem
nossa atenção. Expor pessoas doentes ao ridículo é muito fácil (que nos diga os
irmãos-cineastas Farrelly e seus discípulos), mas tratá-las de forma natural,
com dignidade e respeitando suas limitações, porém, sem apresentá-las como
inválidas, é um desafio e tanto. Se você ainda não conferiu este longa por
receio só de ouvir falar a palavra câncer fique tranquilo. Esta é uma das raras
oportunidades que o cinema nos deu nos últimos anos para pensarmos nesta doença
não como um fim eminente, mas como um recomeço por vezes providencial, que nos
leva a reflexão, a dar mais valor as coisas importantes da vida e
consequentemente a formar seres humanos melhores.
Drama - 100 min - 2010
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