NOTA 2,0 Com o humor raso e grosseiro como de costume, Adam Sandler se divide em dois personagens e carrega Al Pacino para uma absurda produção |
Homens vivendo papeis femininos há tempos não causam
estranheza graças ao empenho e talento de atores como Dustin Hoffman em Tootsie,
Robin Williams em Uma Babá Quase Perfeita e até mesmo John Travolta em Hairspray
- Em Busca da Fama, este com certo quê de caricatural propositalmente. Um ator
contracenar consigo mesmo também se tornou algo obsoleto, principalmente depois
que Eddie Murphy conseguiu a proeza de contracenar com meia dúzia de
personagens vividos por ele próprio sob pesada maquiagem (literalmente) em O
Professor Aloprado. Sendo assim, o que teria chamado a atenção de Adam Sandler
para protagonizar em dose dupla a comédia grosseira Cada Um Tem a Gêmea Que
Merece? Bem, seu currículo prova que surpreender o expectador com novidades não
é lá sua praia, mas melhor acreditar que tenha topado participar de um projeto
tão tolo em nome da amizade de longa data com o diretor Dennis Dugan. Até então
este era o sétimo trabalho da dupla, uma parceria iniciada em 1996 com Um
Maluco no Golfe e que a cada novo filme lançado parece querer superar o nível
de baixaria alcançado pelo anterior. O Paizão, de longe, pode ser considerado o
que de melhor fizeram juntos. No longa em questão Sandler se desdobra para
viver os irmãos Jack e Jill Sadelstein, gêmeos que apesar de fraternos (de sexo
oposto) são idênticos tal qual fossem univitelinos, uma mera desculpa para
colocar o ator em trajes ridículos e com peruca desgrenhada compondo uma figura
que é uma verdadeira aberração. Há anos eles não se encontram, mas certa vez
ela decide aparecer na casa do irmão para passar o feriado do Dia de Ação de
Graças, a oportunidade perfeita para reatarem os laços familiares. Será mesmo? Jack está casado, tem filhos,
vive em uma bela casa e dirige uma agência de publicidade. Já Jill viveu por
anos na barra da saia da mãe recentemente falecida e acabou solteirona, vivendo
em uma cidade do interior e ocupando seu tempo com fofocas e perturbando
qualquer um que cruze seu caminho com seu jeito expansivo e inconveniente. É
óbvio que os irmãos não se dão bem e Jack conta os minutos para se livrar do
tribufu o mais rápido possível, mas ela decide esticar um pouquinho a temporada com a família que irá viver
momentos um tanto constrangedores em sua companhia.
Para mantê-la ocupada, o publicitário então decide lhe
arranjar companhia colocando um perfil em um site de relacionamentos, mas sem
sucesso. Um único pretende surge e, diga-se de passagem, foge em meio a um
jantar deixando a caipirona ainda mais tresloucada, porém, para compensar, o
destino coloca em seu caminho ninguém mais ninguém menos que Al Pacino... Oi? É
isso mesmo! O ator participa como ele mesmo e surpreende com sua total
desenvoltura em se autoridicularizar. Unindo o útil ao agradável, Jack aproveita
que está em negociações com o astro para que ele estrele a campanha de
marketing de uma badalada rede de cafeterias para tentar descolar um cunhado
rico e famoso, o que vem a ser a piada mais infame do longa, afinal Sandler não
está interpretando uma mulher de verdade e não engana ninguém. Simplesmente
está em cena vivendo praticamente um ensandecido travesti que faz de tudo para
chamar atenção. Fica claro que o comediante não se esforçou minimamente para
compor uma Jill crível e o próprio roteiro tira proveito desse deslize
exaltando a dúvida se ela realmente é mulher, mas o nonsense perde um pouco a
graça quando é explorada a feiúra da personagem. Só belos rostos podem
encontrar um amor? O problema é que a solteirona também é estridente e hiperativa,
predicados que não favorecem em um relacionamento, mas ainda assim ela chama a
atenção de um astro de Hollywood. Ultrapassando os limites do bom senso, o
protagonista de Perfume de Mulher exagera nas declarações de amor, mas tem sua
participação absurda de certa forma atenuada por tocar na nostalgia do público
ao fazer algumas menções à sua própria carreira, como lembrar de clássicos como
O Poderoso Chefão e Scarface, além de aceitar tirar da sarro de sua predileção
por textos shakespearianos e do fato de ter ganho apenas um Oscar. Contudo,
estes são alguns raros momentos de criatividade do longa. Sandler, acostumado a
críticas negativas, aqui tem que se contentar a dividir tais lembranças com
Pacino cuja carreira está clamando por aposentaria visto a qualidade de seus
últimos trabalhos. Aqui é o fundo do poço. Teria sido melhor que fizesse apenas
uma política da boa vizinhança tal qual Johnny Depp que também surge como ele
mesmo em uma rápida e descartável sequência.
Falando nisso, esta comédia também dá uma manchada de leve
no currículo de Katie Holmes, mais conhecida como a ex-senhora Tom Cruise e
outrora queridinha dos teens americanos. A moça está envelhecendo e cada vez
mais se tornando uma figurante de luxo. Como Erin, esposa de Jack, ela está em
cena apenas para preencher lugar à mesa nas refeições dos Sadelsteins. Se todas
as suas cenas fossem descartadas na edição ninguém sentiria falta dela e o
público se beneficiaria com alguns preciosos minutos a menos de uma comédia que
embora relativamente curta parece durar o dobro do tempo já que não há
propriamente uma história a se contar e sim uma forçada tentativa de alinhavar
esquetes cômicos. O roteiro de Steve Koren, de Click, com pitacos do próprio
Sandler como de costume nas produções que estrela, não se preocupa em contar
uma história plausível, mas sim em inserir piadas onde seja possível. O
problema é que o estilo de humor adotado é falho. Embora ao longo da trama
lições de moral sobre a importância da família, espírito de solidariedade e bons
sentimentos sejam exaltados, a cada cinco minutos (ou até menos) temos alguma
tirada escatológica ou preconceituosa. Não faltam menções a cocô ou puns e as
minorias são representadas por estereotipados latinos, indianos e até
sem-tetos. O longa também falha ao apostar no curioso fenômeno dos "twin
powers", aquelas manjadas histórias sobre gêmeos que conseguem ter as
mesmas sensações um do outro ou até mesmo compartilhar pensamentos. Tudo é
usado em prol do escracho. Para não dizer que nada se salva da produção, até
que é divertida a cena em que os irmãos vão ao cinema na companhia de Gary
(Rohan Chand), o filho de Jack. O garoto sentado entre eles observa com atenção
como seu pai e sua tia são iguaizinhos repetindo gestos, expressões e até mesmo
jeito de gargalhar, isso porque pouco antes eles discutiam sobre como se
enxergavam diferentes um do outro. Aliás, o menino e sua irmã Sofia (Elodie
Tougne) parecem ser os únicos da família a gostarem da companhia da caipirona.
Pudera, são tão esquisitos quanto ela. O menino tem o costume de ficar com
objetos ou bichos colados pelo corpo com fita adesiva e a garota se veste igual
a suas bonecas. Começando e encerrando com depoimentos divertidos e verídicos
de gêmeos ressaltando o que há de bom e as desvantagens nisso, Cada Um Tem a
Gêmea Que Merece tinha potencial para ser uma divertida e até mesmo reflexiva
comédia a julgar por seu argumento inicial, mas se contenta a seguir um caminho
medíocre. Em determinado momento Pacino brada que o videotape do tal comercial
deveria ser destruído para que ninguém assistisse tamanha bobagem. Não seria
uma cena de bastidores inserida por engano demonstrando que lhe caiu a ficha no
que se meteu?
Comédia - 91 min - 2011
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