quinta-feira, 29 de julho de 2021

TUDO ACONTECE EM ELIZABETHTOWN


Nota 6 Com mensagens afetivas e universais, obra peca pela irregular mistura de gêneros e duração


O tempo é o senhor da razão e para o cinema ele age da mesma forma. O que era um sucesso estrondoso quando lançado pode se tornar algo totalmente esquecível no futuro ou pode ocorrer o contrário, assim o que passou em brancas nuvens ou foi criticado negativamente pode vir a se tornar cult. Para tais resultados, podemos ser influenciados por inúmeros fatores como pouca experiência de vida para compreender um enredo, a crença nas críticas de terceiros e até a adoração exagerada por algum artista ou diretor pode apontar qual caminho seguiremos na hora de formar uma opinião. O que é certo é que dificilmente chegaremos a um consenso para a avaliação de um filme, cada um pode e tem o direito de tecer suas próprias conclusões. Seguindo essa linha de pensamento, podemos concluir que Tudo Acontece em Elizabethtown é um título excelente para suscitar discussões do tipo. Quando lançado não fez sucesso e foi malhado pela crítica, mas hoje é até visto como um simpático título no currículo do diretor Cameron Crowe, elogiado pela crítica e público por filmes como Jerry Maguire – A Grande Virada e Quase Famosos. Bem, nesta mistura de romance, drama e comédia que se desenrola em uma pequena cidade americana de caráter tradicional e interiorano é difícil entender como alguns apontam a obra como redondinha, jargão utilizado para denominar algo perfeito. 

Drew Baylor (Orlando Bloom) está vivendo uma fase difícil. Perdeu o emprego, foi abandonado pela namorada e está sem saber o que fazer da vida. Prestes a cometer suicídio, ele recebe a notícia de que seu pai morreu, o que o obriga a voltar à cidade de Elizabethtown para o velório e assim confrontar memórias do passado de sua família e até mesmo conhecer parentes que não fazia a menor ideia que existiam. No caminho, mais especificamente dentro do avião, ele faz amizade com a aeromoça Claire (Kirsten Dunst), que pouco a pouco se aproxima do jovem e tenta ajudá-lo a reorganizar sua vida. Resumidamente, essa é a sinopse e renderia um bom filme de uma hora e meia no máximo, mas o problema é que o desenrolar da trama conta com um ritmo irregular, excesso de personagens secundários e uma duração exaustiva. Vendida com aura de comédia romântica, a obra na verdade privilegia o aspecto dramático do argumento. Existe um casal bem simpático em cena e que cativa o espectador, mas não há um vilão em forma física entre eles, mas a vilania ficaria por conta das atitudes deles próprios que vivem se esbarrando, mas deixam clara a ideia que só querem aproveitar o momento, nada de compromisso sério. Como eles dizem, são os substitutos ideais um para o outro quando seus respectivos amores não estão por perto. 


A amizade colorida se torna crível graças as boas interpretações de Bloom e Dunst, na época ambos tentando firmar seus nomes em Hollywood. Na comparação de desempenho, quem ganha é a mocinha que rouba a cena com frases e sorrisos otimistas do início ao fim, embora as vezes seu entusiasmo ou tagarelice cansem. Todavia, o encontro dos personagens principais faz jus a frases-clichê como "estava escrito nas estrelas" ou "as coisas não acontecem por acaso". Baylor estava no fundo do poço e Claire surge em seu caminho como uma enviada dos céus, não por acaso eles se conhecem durante um vôo. Com ela o rapaz aprende que a vida tem que seguir em frente e nesta relação podemos encontrar o motivo de tantas pessoas apreciarem este trabalho: a mensagem positiva deixada ao espectador como se fosse um trabalho talhado nos mínimos detalhes para amenizar a dor de quem está sofrendo, seja por motivos sérios ou banais. Aprender a enxergar o lado positivo das situações, rir de bobagens do dia-a-dia e usufruir do carinho e amizade daqueles que se solidarizam em momentos difíceis são alguns dos recados que o cineasta manda. Crowe oferece uma história sensível e que poderia ser vivenciada de diversas formas e por qualquer tipo de pessoa.  Talvez o caminho que adotou para contá-la seja o problema, uma forma peculiar que dialoga com seu estilo, mas que provavelmente crie dificuldades para muitos vivenciarem plenamente as emoções que desejou transmitir.

Ao término, ficamos com a sensação de que assistimos a um caldeirão de referências proposto por um cineasta de renome que já tem seu fã clube que o defenderá de qualquer exagero, mas no fundo ele poderia contar a mesma história de forma mais enxuta e sem desperdícios, inclusive de elenco. Temos Alec Baldwin mais uma vez subaproveitado em um papel coadjuvante enquanto Susan Sarandon surge como a mãe do mocinho com um personagem desinteressante e que a certa altura faz um discurso embaraçoso com direito a uma dancinha no funeral do ex-marido. Aliás, as despedidas ao falecido são feitas com pompas de celebridade, afinal o homem era adorado na cidadezinha onde passou toda a sua vida, mas é aí que as coisas ficam esquisitas de vez. O excesso de parentes e amigos do defunto que aparecem para tumultuar o funeral, pedindo pelo enterro e não a cremação como desejam os filhos, ficam perdidos na trama que também peca pelos exageros de canções famosas pontuando tudo. Por fim, próximo à conclusão, Baylor faz uma longa viagem de carro ao som de uma trilha sonora pop e com direito a referências culturais e históricas a cada parada, tudo minuciosamente cronometrado e escolhido previamente pela eficiente Claire, o ponto mais fantasioso do enredo e que desemboca em um final previsível. Bem, as músicas são marcas registradas dos trabalhos de Crowe e ajudam a dar um pouco de sentido a cenas dispensáveis em qualquer filme, mas aqui a função das baladas extrapolam um pouco. 


Crowe talvez tenha se empolgado ao realizar uma obra praticamente autobiográfica. Ele próprio é de uma cidade pequena e onde todos se conhecem e pouco antes de realizar este filme também perdeu seu pai. Tentando passar para a tela todas as emoções e dúvidas que estava sentindo, acabou montando um projeto em que vários gêneros e referências se misturam, mas nem sempre de forma homogênea e agradável, chegando a haver no evento fúnebre rock ao vivo embalando um incêndio, algo um tanto surreal. É estranho, mas Tudo Acontece em Elizabethtown é um filme que nos deixa em cima do muro na hora de avaliá-lo. Não é de todo ruim, mas também está longe de ser excepcional. Mexe com nosso emocional em diversas partes, mas em outras nos deixa com vontade avançar as cenas tamanha a falta de conteúdo. Algumas canções podem fazer parte da trilha sonora de nossas vidas também, mas outras parecem adicionadas em momentos inoportunos ou por puro merchandising. Risadas, sorrisos amarelos, alguns lampejos de dispersão e um leve lacrimejar. Romantismo, momentos melancólicos e outros bobinhos. Acontece de um tudo em Elizabethtown, literalmente.

Comédia romântica - 123 min - 2005

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3 – 4 Regular, serve para passar o tempo
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9 – 10 Excelente, praticamente perfeito do início ao fim
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