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NOTA 4,0
Religioso aloprado tenta evitar o aumento das estatísticas de divórcios com testes que são uma verdadeira prova de fogo para noivos |
A instituição do casamento está
em crise! Embora ainda existam muitos casais dispostos a se unir seguindo todas
as convenções do matrimônio religioso, é fato que a quantidade de divórcios é
assustadora, inclusive de uniões que chegam apenas a durar alguns meses. Se os
convidados da festa podem se sentir magoados ao descobrirem que seus presentes
nem chegaram a ser usados pelos noivos imagine a sensação de frustração das
famílias dos pombinhos que gastaram horrores com igreja, burocracia, roupas e
comes e bebes. No fundo quem lucra com esses fracassos são costureiros,
cabeleireiros, buffets e lojas de apetrechos domésticos e eletrônicos. Chega a
ser absurdo pensar que o casamento no fundo se tornou um comércio e um veículo
de ostentação e os verdadeiros sentimentos que deveriam estar envolvidos no
evento ficam em segundo plano. Talvez pensando nisso é que os roteiristas Kim Barker, Vince Di Meglio e
Tim Rasmussen, este último com o ótimo Entrando
Numa Fria Maior Ainda no currículo, tiveram a ideia para a comédia Licença
Para Casar. Assumidamente água-com-açúcar e com final feliz garantido,
a pergunta que não quer calar é se realmente eram necessárias três cabeças para
roteirizar um filme tão previsível e irregular. A trama tem como protagonista
um jovem casal que apesar de já morar junto a algum tempo decide regularizar a
situação no cartório e perante a igreja. Sadie (Mandy Moore) e Ben (John
Krasinski) passaram todo o período de namoro às mil maravilhas e nem a ligeira
diferença de classe social estremeceu a relação, assim o casamento tinha tudo
para dar certo. Ironicamente os problemas surgem justamente nos preparativos a
festa. Eles resolvem aceitar a sugestão da família da moça e pretendem se casar
na mesma igreja em que os pais da noiva se casaram. O local é comandado a
punhos de ferro pelo reverendo Frank (Robin Williams), figura querida e
respeitada pela comunidade e que até da uma forcinha neste caso para os noivos
e encontra uma data na disputada agenda de matrimônios. Eles terão apenas três
semanas para preparem a festa, mas dos males esse é o menor. O grande problema
é o tal curso preparatório ministrado pelo pároco.

Frank criou e patenteou uma
espécie de vestibular matrimonial que visa descobrir se os noivos realmente
estão preparados para a união, quiçá descobrir se realmente se amam a ponto de
suportarem os pequenos problemas cotidianos que vão desde o mau hálito ao
acordar até a troca de fraldas dos futuros filhos. As intenções até que são
válidas procurando resgatar a importância do matrimônio e diminuir o número de
separações, mas o problema é que o religioso, desculpe a heresia, é infernal e
conta até com a ajuda de um guri capetinha
(Josh Flitter) para testar os casais até o limite da paciência. Bem,
completamente apaixonado, obviamente não se recusa a realizar o desejo da
namorada e mesmo não simpatizando com Frank aceita fazer o cursinho. Sempre com
um sorriso estampado no rosto, o pastor não tem o menor pudor e intromete-se na
intimidade dos noivos com a maior cara-de-pau e os submete a uma série de
situações humilhantes e desconfortante para avaliar a maturidade e seriedade do
casal. Entre as várias situações embaraçosas que passam, Ben e Sadie terão que
cuidar de uma dupla de bebês de brinquedo com uma incrível capacidade para
chorarem alto e sujarem fraldas. Também terão que se submeter a abstinência
sexual, talvez a maior prova de fogo que poderia ser imposta ao noivo, mas sua
companheira é muito devota a religião e quer cumprir o regime de cama
fielmente. Será que hoje em dia tal situação é crível? Bem, religião não se
discute, mas é fato que fanáticos não medem esforços para cumprir mandamentos
por mais absurdos que possam parecer para o século 21, contudo, tal argumento
enfraquece neste caso a narrativa que aparentemente é apenas uma desculpa para
divulgar o nome de Mandy Moore. Com um clássico romântico contemporâneo no
currículo,
Um Amor Para Recordar, a
atriz e cantora busca incessantemente um novo sucesso, mas está difícil. Sadie
é uma personagem insossa que parece estar de bem com a vida mesmo com todos os
perrengues proposto por Frank. Impossível crer em tanta ingenuidade, até porque
se ela fosse tão religiosa ela jamais aceitaria dividir a cama com o namorado
antes de trocar as alianças. Aliás, a própria família da moça não demonstra
tanto apego as tradições ou convenções para justificar o comportamento dela.
Sem despertar emoções no espectador, a atuação do casal principal
consequentemente acaba sendo comprometida, soando constrangedores momentos como
em que Ben é obrigado a guiar Sadie vendada na direção de um veículo, mais um
exercício para testar a confiança em sua parceira.

Krasinski, na época mais
conhecido por atuações em séries de TV, não tem aquele perfil de galã garanhão
ou valentão, mas talvez seja justamente este perfil de homem comum que o faça
ser o destaque da produção, ainda que não consiga atingir o clímax de
interpretação necessário nos momentos exigidos. Pelo menos desde o início seu
personagem demonstra um pé atrás com as atitudes de Frank e sua participação na
trama cresce a partir do momento em que ele passa a investigar o passado do
religioso. Já Williams que teoricamente deveria ser o chamariz acaba não
conquistando o espectador. Embora seu personagem arquitete situações divertidas,
ao mesmo tempo ele é insuportável e com momentos de exagero desnecessários. Seu
assistente dá a entender que a lista de alunos do curso que desistiram do
casamento é extensa, mas curiosamente a imagem do reverendo permanece
inabalável perante a comunidade, algo necessário para colocar o casal
protagonista na posição de heróis, aqueles que venceram o desafio e não
sucumbiram as provocações. Quando finalmente entram em acordo que Frank é um
capeta e que seu único objetivo é separá-los, Ben e Sadie partem para a corrida
contra o tempo para retomar a harmonia do relacionamento, afinal o happy end
tem que estar garantido. Com direção de Ken Kwapis, do também irregular
Quatro Amigas e um Jeans Viajante,
Licença
Para Casar é uma reunião de clichês com o único objetivo de fazer o
espectador manter um sorriso constante, seja de piadas bobinhas, repugnantes ou
de duplo sentido, apoiando-se principalmente no carisma e fama de Williams que
não deve ter feito esforço algum para interpretar um papel que sintetiza praticamente
tudo aquilo que o ator fez durante toda a sua carreira no campo de humor, além
de usar o improviso a vontade. Para quem não conseguir achar graça alguma em
uma história que se bem analisada não se conecta com os tempos atuais (podendo
ser um argumento válido para uma comédia de época), o diretor foi bondoso e
tentou compensar a frustração nos créditos finais apostando em erros e armações
das filmagens. De qualquer forma, algumas discussões a respeito sobre a
futilidade e o comércio que se tornou o casamento salvam o longa de ser um
desastre total.
Comédia romântica - 90 min - 2007
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