terça-feira, 20 de janeiro de 2015

127 HORAS

NOTA 8,0

História verídica é contada
de maneira inovadora e
apostando na valorização
dos recursos técnicos
Baseado em fatos reais. Uma história forte e comovente. Um exemplo de coragem e superação. Esqueça quaisquer preconceitos em relação as produções inspiradas em fatos verídicos quando o assunto for 127 Horas, um pequeno drama que caminhou a passos largos rumo ao sucesso e chegou a concorrer aos principais prêmios da temporada 2011, inclusive o Oscar. Tamanha exposição aguçou a curiosidade de muita gente, mas certamente muitos se decepcionaram com o que viram. Vendido como o filme do cara que fica o tempo todo sozinho em meio a uma situação limite (quem nunca ouviu tal definição?), muitos também devem ter se desanimado e nem chegaram a assistir. Bem, como sempre dito neste blog, é o recheio que faz um bom filme e neste caso ele é servido de forma bem diferenciada e que em nada lembra as tradicionais produções que envolvem histórias de superação. Antes de qualquer coisa vamos ao enredo. Aron Ralston (James Franco) sempre foi apaixonado por atividades radicais e ao ar livre. No início de 2003, quando fazia uma escalada em uma região montanhosa e desértica em Utah, nos EUA, por um descuido acaba pisando em falso e cai em uma fenda existente entre grandes rochedos. Sem ninguém por perto e para piorar com uma rocha prendendo um de seus braços contra a parede do desfiladeiro, Ralston precisou usar o que tinha em sua mochila para conseguir escapar. Quanto mais raspava a pedra, mais parecia que ela esmagava seu membro. As horas passam vagarosamente e sem ter como comunicar a alguém o seu paradeiro e contando com pouca água e apenas algumas bugigangas, a morte parece eminente e o aventureiro passa a fazer uma espécie de diário dos seus últimos momentos de vida com o auxílio de uma câmera de vídeo. Com ela o rapaz registra pensamentos, lembranças e delírios como forma de criar um registro para quem encontrasse o aparelho desta que parecia ser sua última aventura entregasse a seus familiares como uma recordação. Entre memórias de bons momentos com a família e amigos, situações de desespero e até devaneios acerca de um futuro incerto, a narrativa dedica-se praticamente do início ao fim a capturar tais reações psicológicas que perduraram por mais de cinco dias.
Pela sinopse este filme parece ser uma tremenda viagem sem nexo da qual é impossível um espectador em sã consciência deixar se envolver, mas quem der um voto de confiança deve no mínimo classificar o projeto como inovador. A luta do rapaz pela sobrevivência durante 127 horas se transforma em uma angustiante e admirável lição de amor à vida, mas ele não saiu ileso da situação. O final típico de obras baseadas em fatos reais trata de esmiuçar em algumas poucas palavras o futuro de Ralston, com a diferença de que neste caso o homenageado aparece feliz da vida e bem disposto para arrematar o pacote. Dizer que o rapaz não faleceu no tal acidente e não cometeu suicídio após o trauma, conclusões bem plausíveis, não estraga a surpresa do filme já que essa história verídica correu o mundo através dos veículos de comunicação e o final feliz era conhecido. Feliz em partes, afinal amputar o próprio antebraço foi a única maneira que o aventureiro encontrou para sair daquela enrascada. Como já dito, o que importa é o recheio e a forma como esta história angustiante e claustrofóbica é servida ao público e neste quesito o cineasta Danny Boyle merece aplausos. Após a superexposição que teve com a enxurrada de prêmios que recebeu por Quem Quer Ser Um Milionário?, é curiosa sua opção em trabalhar com um roteiro mais intimista, porém, a calmaria que a premissa denuncia é radicalmente transformada. O universo do protagonista transcende as barreiras dos rochedos através de sua imaginação. As cores fortes e a energia de seus pensamentos contrastam com o silêncio e os tons mais escuros impressos nas sequências mais dramáticas. A excelente fotografia, que passa ao espectador a dimensão do ambiente solitário, e o frenético jogo de edição, incluindo múltiplos quadros em uma mesma cena, foram muito bem utilizados e ajudam a dar certo movimento a obra que poderia facilmente se tornar desinteressante, apesar que tanta informação junta também não deixa de dispersar a atenção vez ou outra. Quem segura as pontas é James Franco, um jovem ator cujo trabalho mais famoso é seu papel de antagonista da trilogia Homem-Aranha. Aqui ele teve a chance de provar que é sim um bom ator e que pode tocar um filme sozinho, literalmente. Ele aparece solitário dialogando com sua câmera que faz as vezes do espectador em praticamente todo o filme dividindo seu espaço apenas com a apurada parte técnica. Na ausência de personagens coadjuvantes, qualquer som, imagem ou efeito ganha importância incomum e devem se encaixar perfeitamente à narrativa, pois não são apenas firulas e sim recursos incondicionais para o entendimento do enredo e da ação da própria ambientação sobre o psicológico do protagonista. Até o aparecimento de um urubu chama a atenção reforçando a impressão de sofrimento de Ralston como se a sua morte fosse eminente.
Um ponto a favor do roteiro é que ele não pretende levar quem assiste às lágrimas. Se você já acha angustiante assistir aqueles dramas familiares do tipo desgraça pouca é bobagem, saiba que aqui a sensação de dor é levada às últimas conseqüências, porém, longe de ser uma nauseante sessão tortura. O roteiro de Boyle em parceria com Simon Beaufoy, baseado na autobiografia de Ralston intitulada “Between a Rock and a Hard Place”, reserva momentos inspirados e até cômicos em meio a adversidade. Por exemplo, enquanto tenta não se entregar a tristeza, o rapaz começa a rever passagens tolas de sua vida, como quando comprou sua câmera filmadora, alternadas com lembranças até irônicas, como o fato de ter deixado uma garrafinha de isotônico dentro do carro e que tanta falta lhe faz agora. Tais sequências fantasiosas são um festival de ações de merchandising de marcas famosas no mundo todo, imprimindo o conceito de que até nas piores horas a mídia não nos abandona, já está enraizada em nossas vidas e memórias. Aliás, os créditos iniciais em ritmo alucinante de videoclipe mostrando o agito da população em seu cotidiano já demonstra o caos da vida moderna. Todos apressados, com celulares sempre em uso, usufruindo de fast food e trocando rápidas frases uns com os outros. A música intensa colabora para imprimir adrenalina à sequência. Fora desse ambiente, mas tão agitado quanto qualquer engravatado locomovendo-se na cidade grande, surge Ralston montado em sua bike e percorrendo longas distâncias em meio a natureza. Na hora do apuro, seus pensamentos e vontades se dividem entre o consumismo e a vaidade e a reflexão e a redenção. Boyle acabou realizando um trabalho que trafega tranquilamente tanto pelo cinema comercial quanto pelo alternativo, em uma viagem com várias idas e vindas, mas ainda assim totalmente compreensível. Claro que a produção divide opiniões e está longe de ser um dos melhores títulos lançados em 2010. Todavia, 127 Horas não deve ser tratado de forma alguma como uma produção qualquer. Tem seu valor experimental tanto no conteúdo quanto esteticamente e deve ser apreciado levando-se em consideração tais aspectos. Vale a pena viver esta experiência cinematográfica única e tirar suas próprias conclusões.

Drama - 97 min - 2010

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4 comentários:

renatocinema disse...

Belo filme que realmente apresenta o que é um drama.

Fotografia espetacular servindo como ponte da angústia do personagem.

Amei esse filme e a atuação de James Franco (ator de quem nem sou tão fã), mas que aqui merece elogios.

Foose disse...

Simples mas emocionante. "127 Horas" prova que não é preciso muito para se ter uma boa produção. O longa oferece uma fotografia boa e uma edição envolvente que te leva a refletir desde a grandeza do mundo até a importância de cada pequena escolha. James Franco surpreende e lhe coloca no lugar de "Aron" e principalmente nos extremos das escolhas que ele faz para tentar sobreviver. Uma lição de vida ou morte... imperdível!

Mais uma bela resenha, meu amigo... parabéns!!!

Um grande abraço...

Matheus Paes disse...

Eu achei o filme muito bom. Muito bem trabalhado, muito bem dirigido, muito bem escrito, muito bem fotografado!!! A trilha sonora é belíssima!!!

Achei digno da indicação ao Oscar, realmente não é melhor que O Discurso do Rei, mas é muito emocionante e angustiante, principalmente na cena principal do filme!!!

Guilherme, com relação à troca de links pra mim tá tudo certo cara, já tô colocando os seus links na barra de blogs aqui do Lente!!!

http://lentecritica.blogspot.com/

marcosp disse...

james... é lindo e competente como ator, perder pro DISCURSO DO REI, fala sério..., como na vida o Oscar, é priviligiado pelos lobistas..., fazer um filme sozinho, rir de si mesmo numa situação extremamente dramatica, não é para poucos..., uma pena ter cortado
a cena masturbatória, já que o filme tem base numa estoria real não poderia deixar nada de lado..., para estomagos e corações fracos
não assista...já para as pessoas de coragem e determinação é uma cartilha!