quarta-feira, 27 de julho de 2016

O OUTRO LADO DA NOBREZA

NOTA 8,0

Drama de época tem mensagem
atual com protagonista que
almeja vida de luxúria e riquezas,
mas se decepciona com seu sonho
O que é ser um nobre? Uma pessoa que não tem nada para fazer e que gasta seu tempo ocioso com festas, bebedeiras, comendo de tudo do bom e do melhor, além de estar sempre adornado por belas roupas e jóias? Talvez esta fosse a visão de Robert Merivel, o protagonista do drama de época O Outro Lado da Nobreza. Interpretado pelo ator Robert Downey Jr. em um momento em que os excessos de sua vida pessoal ainda não chamavam mais a atenção que seus trabalhos, o personagem é um jovem e talentoso estudante de medicina londrino do século 17, época em que sua profissão estava sendo muito requisitada, mas a ciência era desafiada pela superstição visto que até os mais ricos eram em sua maioria desprovidos de cultura. Merivel acabava se destacando entre seus colegas da área por sua coragem em realizar tarefas com total naturalidade, como tocar o coração de um paciente que estava com o órgão exposto, porém, o que ele tinha de competente também tinha de mulherengo, tanto que até penhorou sua caixa de instrumentos para pagar suas diversões. Observando atentamente o citado episódio do toque no coração, o rei Charles II (Sam Neil) resolve chamá-lo para ajudar a salvar a vida de alguém que está morrendo e sem a qual não pode viver. Se conseguir curá-la ele se tornaria o médico oficial da corte. Aceito o desafio, Merivel se espanta ao descobrir que a tal Lulu não é uma mulher e sim a cadela de estimação do rei. Seus conhecimentos de medicina não eram tão amplos a ponto de recuperar um animal, mas a sorte estava do seu lado e repentinamente a paciente dada como morta começa a gemer e a latir. A partir desse dia sua vida muda completamente deixando sua vocação de lado e permitindo que a cegueira da ambição o atingisse. Vivendo de luxo, diversão e fazendo todas as vontades do rei, inclusive diverti-lo com palhaçadas, há quem diga que o médico se tornou um bobo da corte sem se dar conta, todavia, dos mais bem pagos. Seu amigo de faculdade, John Pearce (David Thewlis), tentou lhe abrir os olhos sobre a realidade da vida entre os nobres, mas Merivel preferiu virar as costas e ir morar no palácio. Mal sabia que a vida de regalias lhe custaria um preço alto.

Certo dia Merivel fica sabendo que Celia Clemence (Polly Walker), uma das amantes do rei, está prestes a se casar, mas se espanta com a calmaria do monarca com a notícia. A tranquilidade é justificada pelo fato de que o próprio Charles II é quem deseja o casamento, inclusive escolherá o noivo. Como não pode abandonar a esposa, não consegue viver com apenas uma mulher e não quer que as amantes fiquem mal faladas, o rei arranja casamentos para as moças com pessoas de sua confiança e é claro que o mais novo membro da corte é a bola da vez. Em troca ele ganhará um título de nobreza e uma casa própria em região afastada do centro de Londres, porém, terá que abandonar de vez a medicina e prometer jamais tocar na esposa, mantendo um casamento de fachada. Pearce novamente tenta abrir os olhos do amigo para a armadilha desta proposta, mas seduzido pela ganância o rapaz aceita. Os primeiros dias de casado já são atípicos. Celia fica com o monarca enquanto o marido parte sozinho para a casa nova onde acredita ter a liberdade para se divertir, ainda mais acobertado pelo Sr. Will Gates (Ian Mckellen), fiel serviçal que lhe arranja companhia feminina. Quando a esposa chega o clima na casa fica mais pesado, pois ela se estranha com o marido inicialmente, mas é óbvio que ele irá se apaixonar e será correspondido. Para não magoar a amante com sua ausência, o rei envia à casa dela o pintor Elias Finn (Hugh Grant) que deveria pintar um retrato dela e assim que estivesse pronto entregar-lhe e aproveitando a situação levar a amada para revê-lo. Merivel sabia que o rei desejava que a pintura demorasse a ficar pronta, tempo suficiente para desfrutar das demais amantes, e ele próprio faz o que pode para retardar o término procurando fazer com que a esposa esqueça o monarca. Como a ambição parecia imperar na época, Finn decide apostar na recompensa a sua lealdade e conta a Charles II o que realmente estava acontecendo para atrasar tanto a entrega do quadro. Eis que a vida do fanfarrão muda completamente. Merivel perde tudo o que conquistou e precisa voltar a exercer a medicina longe da nobreza, mas a Peste está se espalhando pela Inglaterra e isso o aflige.

Há males que vem para o bem. Longe da luxúria, das riquezas e da vida de ilusões palaciana, Merivel começa a se tornar uma pessoa melhor. Ele passa a atender em um sanatório cuidando de pessoas com problemas mentais e aos poucos recupera a sua competência e o prazer em exercer a medicina, força que aumenta ainda mais quando se apaixona por Katherine (Meg Ryan), uma das internas com uma triste história em seu passado. Contudo, o final feliz para a vida deste homem está longe de acontecer e muitas emoções ele ainda vivenciará. A narrativa criada por Rupert Walters segue um caminho bastante previsível, mas consegue envolver o espectador graças a sua perfeita cadência e ao conjunto de elementos reunidos pelo diretor Michael Hoffman, de produções de estilos distintos como Um Dia Especial e O Clube do Imperador. Além de um elenco de primeira, também temos em cena imagens de encher os olhos, mérito da equipe de fotografia, direção de arte e figurinos, estes dois últimos merecidamente premiados com o Oscar. Surpreende o fato do longa abordar de forma branda os podres da vida dos nobres, uma temática rica para uma exploração mais polêmica, mas Hoffman estava mais interessado em criar um fiel retrato da época com o básico para o espectador compreendê-la. O título original “Restoration” tem um duplo sentido. Na época em que a trama se desenvolve, Charles II voltava ao trono da Inglaterra após mais de uma década de governo do puritano Oliver Cromwell. Era um tempo literalmente de restauração do poder da monarquia, mas somada a descobertas científicas, novas manifestações artísticas e a explosão da luxúria, ainda que os desastres naturais, a Peste e as práticas médicas arcaicas se fizessem presentes para atenuar a euforia. Por uma restauração também passa o protagonista que após experimentar um mundo de sonhos percebeu que ele não é eterno e que é preciso se anular praticamente para sobreviver dentro dele. A decepção com a nobreza acabou sendo benéfica transformando-o em um ser humano melhor, mais caridoso e mais centrado em suas ações. Ninguém é bom completamente e também é praticamente impossível ser uma ovelha negra em tempo integral. O que temos é a opção de escolher o caminho do bem ou do mal e nessa decisão muitos fatores influenciam, principalmente as más companhias. Trazendo a tona a boa e velha lição de moral a respeito da preservação de valores, O Outro Lado da Nobreza, mesmo sendo uma produção de época, traz uma mensagem perfeitamente apreciável para a contemporaneidade, tempos em que ter é mais importante do que ser. 

Vencedor do Oscar de direção de arte e figurinos.

Drama - 117 min - 1995

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