NOTA 6,0 Vendido como comédia romântica, longa fica devendo em humor e romance, mas é uma boa opção como drama inspirador e para a família |
Renée Zellweger não é nenhuma
adolescente, mas seu rosto angelical é perfeito para comédias românticas. Seu
nome é quase como um sinônimo do gênero, assim como nos anos 90, guardada as devidas
proporções, Julia Roberts ou Sandra Bullock eram suas representantes. Talvez
por isso Recém-Chegada não tenha feito sucesso. Embora conte com romance
e algumas situações de humor, seu foco se encontra em ambiente empresarial.
Isso mesmo, o longa narra a história de uma mulher que chegou desacreditada em
um lugar, passou por muitos problemas de ordem pessoal e profissional, mas
acabou vencendo na vida. O tema é um dos maiores clichês do cinema, é verdade,
é aquela velha fórmula que rege os filmes cujo enfoque é o mundo dos esportes
ou o ambiente acadêmico. Treinador ou professor insistente resulta em time
campeão ou grupo de estudantes disciplinados e com potencial despertado. A fórmula
é essa, não tem erro. Ou melhor, quando há falhas é porque não souberam embalar
o produto adequadamente, como é o caso da história de Lucy Hill (Renée), uma
ambiciosa executiva da agitada e moderna Miami que aceita ser transferida para
uma cidade completamente desconhecida por ela. Na gélida e melancólica região
de Minnesota sua tarefa é das mais ingratas: reestruturar uma pequena fábrica
local de alimentos, o que implicaria em uma grande quantidade de demissões.
Sentiu o drama não? Pequena cidade praticamente depende da economia gerada pela
tal empresa e muitos funcionários na rua é igual a revolta contra a responsável
por suas demissões. Lucy não se deu conta que não estava lidando com as pessoas
cínicas com quem estava acostumada e tampouco com listas onde os funcionários
eram simplesmente números que dependendo das somatórias de horas trabalhadas,
rendimentos e valores salariais poderiam ser limados da empresa sem pensar nas
consequências negativas que isso traria às suas famílias e à economia
local. Agora ela está em um lugar tradicionalista
onde a teoria de que o bater de asas diferenciado de uma borboleta pode ser
comprometedor faz valer seu poder. Qualquer mudança traz efeitos e as notícias
e fofocas se espalham rapidamente, assim como o troca-troca de alimentos entre
os vizinhos, e os nomes dos envolvidos nos conflitos não são poupados. Assim,
Lucy passa a ser vítima de uma revolta generalizada da diminuta população
local, mas em número suficiente para afrontar o poder daqueles que ocuparam
antes a vaga que hoje é da executiva.
Entre os desafetos da moça, para
variar, também se encontra seu interesse romântico. Ele é Ted Mitchell (Harry
Connick Jr.), um viúvo com uma filha adolescente que é um sindicalista
inflamado. Obviamente das brigas que os une também nasce o amor respeitando a
máxima de que os opostos se atraem. Ela é culta, realizada profissionalmente,
tem dinheiro e cuida da aparência. Ele tem um jeito bronco de se comportar, uma
profissão digna, mas sem glamour, têm dificuldades financeiras e é desprovido
de vaidades. Mesmo com todos estes predicados negativos ela consegue enxergar
nele o homem de seus sonhos. É aqui que está o principal problema da produção.
Uma comédia romântica sem romance não existe. A química entre Renée e Connick é
tão fria quanto a paisagem que os cerca e o espectador não se sente envolvido
neste caso de amor, afinal nem mesmo os personagens parecem estar em sintonia,
ambos mostrando-se muito mais a vontade no âmbito profissional. Bem,
descartando a fraca trama romântica, é justamente o lado empresarial da
narrativa que elevam o nível de avaliação deste projeto, passando bem longe do
lixo que algumas críticas o resumem. Talvez desde que o mundo é mundo crises
econômicas sempre estiveram em pauta, mas no século 21 parece que elas se
agravaram e nem quem tem uma vida financeira confortável pode se dar ao luxo de
não se preocupar com o tema. Portanto vem a calhar um filme que fale um pouco
sobre o universo financeiro das empresas com uma linguagem simples, ainda mais
para nós brasileiros que rotineiramente somos noticiados de greves e manifestações
de trabalhadores que se sentem injustiçados com demissões repentinas e em
massa, mas alguém já parou para pensar no lado das empresas? Cortes de pessoal às
vezes são inevitáveis para manter a saúde financeira das fábricas e nos
contratos dos trabalhadores não há cláusulas que asseguram o emprego
permanente. O problema é que os chefões querem lucrar muito mais em cima do
trabalho dos menos favorecidos? Bem, esse é um tema complicado, sendo mais
facilmente resolvido em casos como a empresa problemática de Lucy, sem dúvidas
uma exceção em um mercado tão competitivo e cruel. A região em que as ações do
filme passam parece um mundo a parte, quase parado no tempo, um lugar feliz e
que não deixa aberturas para duvidarmos que o conflito principal rapidamente
será sanado e que a prosperidade irá prevalecer. Tal visão pode tirar
completamente o realismo da trama, mas ao que tudo indica o diretor dinamarquês
Jonas Elmer não tinha pretensões de que esse longa fosse algo além de um
entretenimento saudável, portanto, discussões mais aprofundadas sobre o mundo
dos negócios não estavam no planejamento.
Mesmo com a relação conturbada
com Mitchell e enfrentando o frio e a calmaria de Minnesota, Lucy também tem
seus prazeres na cidade, principalmente com a amizade da bondosa Blanche
(Siobhan Fallon) que a ajuda a se adaptar ao clima tradicionalista. Sempre
estabelecendo contrapontos entre o estilo de vida da executiva e os costumes do
povo local, os roteiristas Ken Rance e C. Jay Cox encontram nesse estranhamento
o grande gancho para puxar a atenção do espectador que por mais urbano e
moderninho que seja sente-se seduzido ao ver cenas de apelo afetivo como uma
reunião de senhoras para tomar um chá da tarde ou atos de extrema generosidade
entre vizinhos, cenas comuns em ambientes interioranos onde a rapidez e a
alienação da comunicação via celular ou internet felizmente ainda não se
consolidaram. Para driblar a má impressão que deixou na cidade em um primeiro
momento, Lucy é tomada pelo espírito do profissionalismo, ou seja, deixou as
diferenças de lado para se focar no que seria melhor para a fábrica que
teoricamente sustentava a todos na região. Para atrapalhá-la, chega da matriz a
ordem de fechar a filial e obviamente as suspeitas da decisão recaem sobre a
moça, mas sabemos que tudo vai acabar bem no final das contas. E neste caso uma
conclusão literalmente açucarada. Graças à tapioca, também consumida na versão
salgada, Lucy consegue dar novos rumos à empresa e consequentemente à sua vida.
De um pequeno hábito de consumo local a moça tirou a solução dos problemas,
gancho que lembra a um antigo filme protagonizado por Diane Keaton, Presente de Grego, no qual ela é
obrigada a cuidar de um bebê e da tarefa de fazer papinhas encontrou a chave do
sucesso do profissional. Podem dizer que Recém-Chegada é um produto típico
para sessões da tarde e totalmente descartável, mas ai é uma questão de ponto
de vista. Está longe de ser um romance para adolescentes e não atende também
completamente as expectativas de platéias adultas com tal objetivo, porém, é um
típico feel good movie, aquele tipo de produção que não faz mal a ninguém e
deixa o espectador com uma agradável sensação de saciedade. Elmer, estreando no
cinema americano, de quebra ainda realizou uma obra com vida útil prolongada,
pois é uma opção perfeita para motivação e incentivo a empreendedores,
administradores e porque não sonhadores. Agora se você é do tipo que preza em
primeiro lugar pela simpatia que sente pelos atores na hora de escolher ou
avaliar um filme e tem um pé trás com a cara de cachorrinho pidão de Renée, com
direito a incontáveis biquinhos, dispense esta opção.
Comédia romântica - 97 min - 2009
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