Nota 7,0 Morte de um jovem levanta discussões sobre bullying, rejeição e relações de poder
As sinopses publicadas nos encartes dos
DVDs deveriam vender corretamente as histórias dos filmes, mas muitas delas só
se limitam a elogiar atores e realizadores ou sintetizar em pouquíssimas
palavras o enredo. O pior é quando vendem a trama de forma errada como é o caso
de Mistério
em River King, cuja distribuidora vende como um suspense policial
acerca do assassinato de um adolescente e seu próprio espírito ajudaria nas
investigações. Bem, até existe um ensaio para seguir tal caminho, mas parece
que quem redigiu o texto publicitário não assistiu o filme todo. A trama começa
mostrando o detetive Abel Grey (Edward Burns) e seu companheiro de polícia Joey
(John Kapelos) encontrando um jovem morto congelado dentro de um lago e com
estranhas marcas vermelhas no corpo. Ele é Gus Pearce (Thomas Gibson),
estudante de um tradicional colégio de uma região fria e afastada dos EUA que
segundo seus colegas de turma não se sentia a vontade na instituição e andava
tendo atitudes estranhas ultimamente. Uma das professoras do garoto, Betsy
Chase (Jennifer Ehle), afirma que na noite anterior a descoberta do corpo viu
Gus discutindo no bosque com a jovem Carlin Leander (Rachelle LeFevre), que
apesar da aparente proximidade do falecido estava namorando Harry (Jamie King),
um valentão da escola. Os policiais afirmam que o caso foi um suicídio, mas
Abel desconfia de que existe algum mistério por trás de tudo, principalmente ao
descobrir que Gus estava tentando fazer parte de um grupo, uma espécie de seita
da qual só podiam fazer parte os membros que passassem por um trote impossível
de se cumprir, ou melhor, quase. O detetive desconfia que Harry e Carlin são as
chaves para desvendar o caso, mas parece que todos a sua volta estão preferindo
abafar o episódio, inclusive seu o próprio Joey que deveria estar em busca da
verdade. O diretor Nick Willing consegue construir uma interessante narrativa
que cativa o espectador e o convida a fazer parte das investigações
colecionando pistas, porém, peca ao criar certos ganchos que não levam a lugar
algum como um suposto trauma do passado envolvendo a morte do irmão que
alimentaria o desejo de Abel por justiça a qualquer custo no presente.
Baseado no romance "The River King", de Alice Hoffman, o
roteiro de David Kane consegue fisgar a atenção do espectador desde os
primeiros minutos, até porque a paisagem escolhida para desenvolver a trama é
um convite a parte para o suspense. Terrenos cobertos pela neve e um clima
melancólico que chegam a passar a nítida sensação de frio ao espectador seriam
um excelente palco para uma trama envolvendo assombrações, talvez por isso
exista uma alusão ao assunto pelo fato de uma imagem misteriosa surgir em uma
foto que Betsy tira do quarto do falecido, mas tal temática não chega a ser
explorada. A trama segue um rumo policial tradicional colhendo pistas que levam
a crer que as raízes deste caso se encontram em um problema envolvendo bullying
e um amor não correspondido, temas corriqueiros em produções envolvendo
adolescentes. Contudo, as coisas não se resolvem tão facilmente. Existem
pequenos detalhes que explicam a trajetória de Gus até sua morte, o que garante
uma dose extra de adrenalina ao filme e uma reflexão sobre como brincadeiras
aparentemente inofensivas podem levar a consequências trágicas e a posição que
as pessoas assumem inevitavelmente dentro de grupos sociais. Tal qual no mundo
dos adultos, os jovens também naturalmente se dividem entre dominadores e
subordinados, pólos opostos neste caso não impostos por posições sociais ou
hierárquicas, por exemplo, mas rótulos que involuntariamente as pessoas aceitam
por se sentirem em vantagem ou em desvantagem em relação ao grupo do qual
desejam ser aceitos. Velhos problemas, mas que ainda provocam dores de cabeça.
Por estas razões Mistério em River King é um bom suspense que não é artificial
como pode erroneamente parecer. Tem conteúdo, trama intricada e bem amarrada,
uma atmosfera envolvente, porém, só não é perfeito por causa dos já citados
ganchos narrativos mal inseridos ou desnecessários. Vale uma conferida para
lembrar que um bom suspense não precisa ser indecifrável e tampouco que para
atender ao público em massa lançar mão de clichês e sangue e violência
gratuitos seja inevitável.
Suspense - 99 min - 2005
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