Nota 2,0 Longa acaba deixando explícita uma mensagem de preconceito contra os muçulmanos
O fatídico 11 de setembro de 2001
continua rendendo ao cinema. Além das produções que enfocam eventos e tristes
histórias ocorridos nesta data, há ainda os títulos que exploram o clima tenso
e a aversão ao povo muçulmano que se propaga pelo mundo todo desde então, mas O Mercador de Pedras exagera na dose de
preconceito e não faz questão alguma de ser imparcial. É preciso estar atento
para não confiar que a visão do diretor e roteirista Renzo Martinelli seja uma
verdade absoluta. Seu longa começa de forma bastante previsível mostrando uma
tentativa de ataque terrorista no qual acaba se envolvendo a esposa de um
estudioso sobre o islamismo. Alceo Rondini (Jordi Mollà) está passando férias
na Turquia acompanhado de Leda (Jane March) e mantendo certa amizade eles nem
desconfiam que estejam participando de um jogo perigoso tramado por Ludovico
Vicedomini (Harvey Keitel), um carismático negociador de pedras preciosas que
vive viajando para a Europa e o Oriente Médio. Contudo, por trás de sua amigável
aparência ele esconde um grande segredo. Junto com seu parceiro de negócios
Shahid (F. Murray Abraham) ele conspira um ataque terrorista em grande escala,
mas quando seu plano está prestes a ser concretizado o destino acaba por
surpreender fazendo-o se apaixonar por Leda que corresponde aos seus
galanteios. Agora ela terá que escolher entre o amor e a segurança oferecidos
pelo marido ou por essa paixão repentina e avassaladora, mas Rondini está
disposto a desmascarar seu rival. Curiosamente aquele que deveria ser o herói
da história na verdade acaba sendo o calcanhar de Aquiles da produção. Ele
prega em seus discursos que os muçulmanos irão destruir o Ocidente e no final
chega até a dar uma duvidosa lição de História afirmando que a luta entre o
povo ocidental e o oriental já dura séculos, o que é um fato, mas fala com
pessimismo quanto aos avanços do islamismo pelo mundo, inclusive taxando como
uma religião doentia. Em outras palavras, ele trata a cultura e a religião dos
muçulmanos com preconceito tratando de rotular a todos que fazem parte desse
povo como criminosos inconsequentes e individualistas.
A guerra entre pólos opostos religiosos
seria o que muitos chamam de "nova cruzada". Na Idade Média as
batalhas financiadas e comandadas com ajuda da Igreja católica eram chamadas de
cruzadas, confrontos nos quais muitos inocentes morriam e seus algozes eram
guiados segundo os desígnios de Deus. Para o protagonista, os novos mártires de
Alá são testemunhas da guerra contra as injustiças sociais e se sacrificam em
nome de um bem maior. Cansados da opressão ocidental, jovens já crescem sabendo
que terão vidas curtas, mas suas passagens pela Terra de suma importância para
seu povo. E se engana quem acha que eles são pessoas pouco instruídas e por
isso de fácil manipulação. As novas gerações de suicidas são compostas por
jovens de classe média, não tem problemas de integração social e padrão de vida
em geral mais alto que seus contemporâneos. Por que pessoas assim se
arriscariam em nome de uma guerra secular que não leva a lugar algum? Fé
exagerada, tradições, conchavos políticos, dinheiro envolvido ou pura maldade?
E da parte ocidental, será que o preconceito com os muçulmanos não passou dos
limites? Será que os próprios ocidentais não são os responsáveis pelo ódio
alimentado pelos orientais? Bem, quem busca respostas para tais perguntas fuja
de O Mercador de Pedras. O roteiro, escrito em
parceria com Fabio Campus e inspirado no romance de Corrado Calabrò, acaba por
oferecer um desserviço, manipulando fatos e alimentando um ódio que já passou
da hora de ser extinto. Ao subirem os créditos finais, se alguém se manter
desperto até eles, o sentimento deve ser um só: repúdio. O cinema deve ajudar a
quebrar preconceitos e não reforçar pensamentos medíocres. De qualquer forma,
vale uma conferida e uma boa discussão tanto a respeito da guerra absurda
abordada quanto sobre o que levou os realizadores a apostarem em um projeto
perigosamente taxativo quanto as opiniões que defende. Pelo menos o triângulo
amoroso trata por salvar a produção de ser totalmente dispensável. A relação do
trio é bem construída e intrigante, mas é uma pena ver bons atores como Keitel
se metendo em produções tão mesquinhas.
Drama - 119 min - 2006
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