quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

O DITADOR (2005)

NOTA 9,0

Fatos verídicos e ficcionais
casam-se com perfeição em
drama que expõe os podres da vida
de um ditador pouco conhecido
Quando você vota em um político, principalmente para presidente e outros cargos de alto escalão, você sabia que estará definindo não só o futuro do seu país como também pode ajudar a interferir nos rumos da História mundial? Para tomarmos conhecimento disso é que são de suma importância filmes como O Ditador que revela particularidades a respeito da vida de Rafeal Leonidas Trujillo. Quem? Pois é, seu nome dificilmente consta nos livros escolares e tampouco é mencionado quando a ditadura é destaque em retrospectivas e especiais da imprensa, mas sua carrasca atuação no comando da Republica Dominicana por três décadas seguidas, tendo seu auge em meados dos anos 50, interferiu também nos caminhos traçados por outros países. Baseado no romance “A Festa do Bode”, do peruano Mario Vargas Llosa, o longa apresenta de forma dinâmica momentos acerca da vida pública e pessoal do governante, interpretado brilhantemente por Tomas Milian, que lançava mão de arrogância, autoritarismo, cinismo, chantagem e até mortes para se manter no poder, bradando aos quatro ventos que só deixaria a política quando estivesse morto. Assim como todas as suas ordens eram acatadas, o destino se encarregou de mais esse pedido. Ele foi assassinado no final de maio de 1961, mas conhecer seu desfecho não anula o potencial do longa dirigido por Luis Llosa, primo do autor do livro. Os méritos da obra, adaptada pelo próprio cineasta em parceria com Zachary Sklar, estão em falar sobre os sujos bastidores da política de forma a envolver o espectador em uma trama dividia em três partes que se intercalam. A primeira é protagonizada por Urania Cabral (Isabella Rossellini) que em 1992 estava voltando ao seu país-natal após 31 anos de ausência. Ela vai direto para a casa do pai, Augustín Cabral (Paul Freeman), um homem que um dia chegou a ser o Presidente do Senado, mas hoje é apenas um velho esquecido e doente. As empregadas e parentes dele acreditam que a filha voltou por conta de seu aniversário de 80 anos, mas na verdade ela finalmente criou coragem para confrontar seu passado. Sem marido e nem filhos, ela é uma advogada ávida por justiça e História de seu país, porém, ela não acha na literatura local detalhes sórdidos sobre a vida de Trujillo e aqueles que o cercavam. Cabral era o braço direito do ditador e muitas vezes compactuou com seus crimes, que incluíam pedofilia, para conseguir status e bens materiais, mas uma única vez que o afrontou foi o bastante para  o político se irritar e o banir de seu grupo, chegando a acusa-lo de desfalque na imprensa.

Perdendo as regalias, Cabral se desespera e é aconselhado a fazer uma loucura para servir como prova de confiança ao Chefe (como Trujillo era comumente chamado pro seus aliados), algo que seria a prova de que ele estaria ao lado do ditador irremediavelmente. A ambição fala mais alto e tal ato mudaria para sempre os rumos da Republica Dominicana como um todo, pois pela primeira vez o governante se sentiu realmente desafiado. Urania e seus familiares são personagens fictícios que sintetizam alguns dos males que Trujillo causou e suas tramas se encaixam perfeitamente aos fatos verídicos que o longa aborda. Paralelo às memórias e revelações da advogada, que vão chocar a família e justificar sua fuga quando adolescente, acompanhamos os últimos dia de vida de Trujillo, incluindo a preparação do grupo que jurou assassiná-lo para se vingar de seus atos que iam desde humilhação até mortes. Para compreendermos este gancho é preciso prestar atenção aos detalhes da terceira linha narrativa. Cada cena e diálogo são de suma importância para entendermos como alguns podiam idolatrar o ditador enquanto outros nutriam ódio avassalador. O primeiro crime revelado de Trujillo é contra o escritor Jesus Galíndez (Gary Piquer) que participou de seu governo por sete anos e que se desligou para se dedicar a livros e palestras que revelam as fraudes e atrocidades do governo do ditador, deixando claro que a semente para a decadência da ditadura estava sendo plantada pelo próprio líder. Certa vez, após uma de suas apresentações, o escritor é capturado e levado para dar explicações ao Chefe que manda imediatamente que o executem a sangue frio. Em público, o mandante se defende dizendo que os boatos que o ligam a tal assassinato é fruto de comunistas americanos que o querem fora do poder, mas que enquanto ele estiver no comando toda a população estará a salvo da manipulação, assim, com belos discursos, ele ia enrolando o povo e literalmente derrubando quem estivesse em seu caminho. Galíndez recentemente havia conquistado a cidadania americana e sua morte desperta a atenção da imprensa ianque que está disposta a provar que Trujillo está envolvido, mas ele, por sua vez, já pensa em maneiras de reverter as investigações a seu favor e decide limar os envolvidos no caso, a famosa queima de arquivo. Tavito (José Guillermo Cortines) foi um dos responsáveis por levar o escritor até o Chefe e isso preocupa seu irmão Antonio (David Zavas) que decide intervir pelo rapaz e pedir ajuda a Cabral que nega apoio. Poucos dias depois, o jovem é assassinado e Trujillo chama seu irmão para uma conversa, na verdade, propor uma subordinação que não é aceita. O Almirante Juan José Viñas (Steven Bauer) tornou-se outro desafeto. O ditador mantinha um relacionamento com sua esposa, Magnolia (Catherine Bliss), não só para satisfação sexual, mas também para conseguir informações confidenciais sobre seu marido que desconfiava não ser fiel ao regime. Suas suspeitas são confirmadas e em um almoço de confraternização com oficiais, o Bode (outro apelido do Chefe devido a sua tara por ninfetas) humilha Viñas e assume na frente de todos sem pudor algum que Magnolia foi até então a melhor mulher que ele teve na cama.

Amadito (Juan Diego Botto) é outro que prometeu vingança. Quando se torna noivo de Luisa (Sharlene Tualé), ele precisa pedir autorização para se casar e tem o pedido recusado por ela ser prima de René (Frank Perozo), um revolucionário, caso contrário ele estaria jogando fora uma promissora carreira militar. O rapaz opta pela profissão, afinal já era um exímio “trujilista”, mas se arrepende quando é obrigado a cometer um ato extremamente cruel como prova de sua fidelidade ao regime acima de qualquer outra coisa. Antonio, Viñas, Amadito e mais alguns poucos se unem para armar uma emboscada para matar Trujillo contando com a proteção e o apoio de armamentos enviados pelos norte-americanos, mas depois os ianques dão para trás e o pequeno grupo tem que contar com a coragem e a sorte para levarem seu plano adiante e depois conseguirem sumir do país. O longa não se aprofunda, mas percebemos que estes vingadores pagaram caro pela vingança e a maior parte da população nem tomou conhecimento sobre os motivos que levaram ao assassinato do político, seguindo fielmente seu funeral com respeito ao líder que por tantas décadas ofereceu proteção. Os episódios citados aqui são baseados em fatos reais e são os de maior destaque na narrativa, mas em curtos diálogos vamos conhecendo mais sobre a personalidade e índole de um dos personagens mais ordinários que o mundo político já teve, como o fato que foi o estopim para o rompimento com Cabral. Rapidamente é citado que três moças da família Mirabal morreram em um acidente de carro, o detalhe é que o clã era declaradamente contra o governo e pretendia matar Trujillo, assim ele simplesmente agiu mais rápido, justificou o Bode cinicamente. Esse episódio é narrado no drama No Tempo das Borboletas, mais um bom título a explorar um período e personagem pouco conhecido, mas extremamente influente em governos e ações de outros países e nem a Igreja escapava de sua manipulação. Coproduzido entre a Espanha e a Inglaterra, O Ditador é uma excelente obra que entretém com qualidade e conteúdo, servindo como um importantíssimo documento histórico. Aqui está a prova de que é possível sim fazer um cinema acessível mesmo com temas mais densos. É praticamente impossível não se envolver com a trama, mesmo com um protagonista tão repugnante.  Pode ser reflexo de nossas próprias dores. Nos identificamos com as vítimas dos abusos e na ausência da surpresa quanto ao fim do político, ficamos na expectativa de ver até onde vai o seu mau-caratismo. Em tempo: como prova do descaso da distribuidora Flashstar, a sinopse coloca o filho de Trujillo como o grande ditador, quando na verdade Ramfins (Ricardo Álamo) é um jovem inconsequentemente e almofadinha que pouco aparece, mas estava predestinado a seguir os maus passos do pai, ao menos quanto ao trato das mulheres como objeto.

Drama - 125 min - 2005 

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9 – 10 Excelente, praticamente perfeito do início ao fim
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