NOTA 3,0 Além de apostar em clichês e personagens estereotipados, longa fica devendo em humor e seu romantismo não convence |
Geralmente o ingrediente
básico de uma comédia romântica é uma mocinha a procura de seu príncipe
encantado, mas o gênero está tão saturado que nem mesmo as donzelas rebeldes
conseguem mais injetar algum ânimo em histórias do tipo. Isso acontece porque o
comportamento fora dos padrões delas só vai até a página dois, ou melhor, até
lá pelos vinte ou trinta minutos do filme quando fatalmente elas encontram os
amores de sua vida. Obviamente elas vão se fazer de difícil ou até se entregam
ao amor rapidamente, mas não tardam a cometer algum erro para os mocinhos darem
o fora da relação, mas nada que não se resolva nos cinco minutos finais.
Quantas produções seguem uma estrutura semelhante? Pois é, Cake – A Receita do Amor
não foge a regra, porém, peca por ter raros momentos engraçados e uma
protagonista que não é das mais cativantes. Pippa (Heather Graham) é uma
solteira convicta que adora levar uma vida completamente livre de regras e
limites, o que implica poder ter a companhia íntima de um ou mais homens por
noite procurando nunca repetir o cardápio. Para demarcar sua personalidade, o
longa começa com ela chegando atrasada ao casamento de uma amiga, provavelmente
após mais uma noitada daquelas finalizada com um salto de pára-quedas. Como
madrinha da noiva ela deveria respeitar a cerimônia, mas a todo o momento faz
questão de expor seus comentários irônicos quanto ao conceito do que é um
casamento e tudo o que o envolve, até que chega no fim da festa completamente
bêbada e tentando encontrar ao menos um convidado com quem ela já não tivesse
dormido. Todavia, sua vida louca está com os dias contados. Seu pai, o Sr.
Malcolm (Bruce Gray), acaba sofrendo um enfarte e terá que ter um substituto no
comando de uma revista justamente sobre casamentos. Embora deteste o tema,
Pippa, que é formada em jornalismo, resolve se oferecer para ser a diretora
temporária com o intuito de melhorar seu relacionamento com o pai que nunca
aprovou sua vida sem limites. Com ideias revolucionárias que no fundo iriam
contra os objetivos da publicação, a moça acaba conseguindo convencer seus
colegas de trabalho que o foco deveria ser falar sobre e para a mulher moderna
que está mais preocupada em ser livre e bem sucedida profissionalmente. Para
ela, escolher docinhos, decoração ou trajes de gala é uma forma que o mercado
encontrou para lucrar e iludir as pessoas que não param para pensar que estão
prestes a se unirem a estranhos.
Seu trabalho no comando da
revista será acompanhado bem de perto por Ian (David Sutcliffe), justamente o
rapaz que ela paquerou na última festa de casamento que compareceu. Braço
direito do diretor da revista, ele é conservador e conhece a fama liberal da
moça, tanto que conseguiu fugir de suas garras no primeiro e casual encontro,
ainda que não soubesse quem ela era, mas a primeira impressão é a que fica,
seja ela herdeira da editora ou não. Para
não fugir da receita de sucesso, é óbvio que a revista sob a batuta de Pippa
será um enorme sucesso. Bem, de fato isso acontece, é previsível, mas em um
primeiro momento a edição inaugural gera críticas negativas principalmente de
Roxane (Cheryl Hines), a produtora da publicação. Paralelo ao fracasso
profissional, o aparente inabalável escudo contra casamentos da jovem começa a
mostrar sinais de desgaste quando ela percebe que outras amigas solteironas
convictas acabaram cedendo ao amor, todas menos Lulu (Sandra Oh), mas esta
mulher é tão insossa que só mesmo um homem desesperado para casar poderia tomar
tal decisão. E acredite, tem louco para tudo. Sentindo-se um peixe fora d’água
e quase chegando aos 30 anos de idade, finalmente Pippa passa a ver Ian com
outros olhos e ele também parece disposto a se aproximar dela, mas aos poucos o
rapaz vai demonstrando não ser uma pessoa das mais íntegras. Além de vira e
mexe estar se encontrando com sua ex-mulher, o vice-presidente do grupo
editorial (que parece sobreviver à custa de uma única publicação) está trabalhando
secretamente para Bob Jackman (Carlo Rota), um rico empresário que já possui
pouco mais da metade das ações da empresa e está torcendo para o fracasso da
revista de casamentos para finalmente Malcolm desistir de trabalhar e vender
suas ações. Essa foi a gota d’água para definitivamente Pippa esquecer qualquer
mínima esperança que tinha na instituição do casamento e concentrar todas as
suas forças para recuperar e modernizar a revista e assim evitar que seu pai
desista do sonho de toda uma vida. Bem, a sinopse é bem básica e promete um
filme igual a tantos outros do gênero. Realmente, o longa dirigido por Nisha
Ganatra não traz novidade alguma, mas consegue ficar um dois degraus abaixo do
patamar de regular. Heather Graham está há anos na praça, mas é um nome que não
aconteceu. Geralmente atuando em comédias com piadas pouco inspiradas,
erotizadas ou até mesmo escatológicas, a atriz parece estar condenada a viver
para sempre o papel da mocinha avoada pelo seu visual angelical, algo acentuado
pelos seus grandes e brilhantes olhos azuis. Ela não compromete a fita, mas
existe algo nela que incomoda, talvez sua interpretação no melhor estilo piloto
automático.
Bem, julgar interpretações
neste caso é em vão. Todos os personagens são estereotipados no roteiro de
Tassie Cameron e interpretados sem muito esmero. Além da protagonista
desregrada que inevitavelmente entrará nos eixos após um choque de realidade, o
galã aparentemente mau caráter (nem dá para saber se realmente Ian é ganancioso
devido a má construção do personagem) no final das contas irá se redimir,
conclusão com direito a cenário paradisíaco para emoldurar o encontro do
casalzinho, apesar de um estranho objeto em cena se destoar do conjunto. Temos
também a amiga de todas as horas cujos conselhos geralmente são descartáveis, o
cara do trabalho pelo qual todas as mulheres suspiram e toda comédia romântica
que se preze tem que ter um homossexual em cena para dar uma “purpurinada” no
ambiente quando o clima está tenso, mas neste caso até ele não consegue brilhar
visto a falta de humor da narrativa. Enredo previsível e personagens mal
construídos ou genéricos infelizmente já se tornaram problemas toleráveis do
gênero visto a mediocridade da maioria dos longas de comédia romântica, mas o
que mais incomoda em Cake – A Receita do Amor é
justamente seu título que não corresponde ao enredo. A escolha é horrível,
parece ter sido feita na última hora? Neste caso a distribuidora nacional só
teve culpa do subtítulo. O tal “bolo” é de fábrica, mas é curioso que chamar um
filme dessa forma seria conveniente se a protagonista fosse uma doceira
especializada em guloseimas de casamento, mesmo que odiasse festejos do tipo.
Por mais que não sejam intelectuais que vão assistir um produto como esse, o
mínimo que se espera é que respeitem a inteligência do público e seja escolhido
um título que sintetize a ideia principal, algo básico para se vender um filme.
Não é a toa que a obra foi lançada em silêncio no Brasil diretamente em DVD e
nem mesmo os fãs românticos parecem terem sentido muita vontade de experimentar
o sabor deste bolo. Literalmente ofereceram gato por lebre, ou melhor, bolo por
revista. Até o trocadilho sai tosco. De qualquer forma mata o tempo livre dos
aficionados por receitas açucaradas, ainda que nem mesmo o romance do casal principal consiga convencer o espectador plenamente.
Comédia romântica - 94 min - 2005
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