terça-feira, 5 de dezembro de 2017

O DIA EM QUE A TERRA PAROU (2008)

NOTA 3,0

Refilmagem de clássico de
ficção científica traz mensagem
ambiental, mas ela se perde entre
trama enfadonha e efeitos visuais 
Existem muitos títulos de sucesso do passado que para as novas gerações são motivos de muita curiosidade, principalmente aqueles que marcaram época e cujo conteúdo tinha algum tipo de ligação com a realidade ou mensagem necessária para aquele momento. Guerra dos Mundos, por exemplo, foi uma bem sucedida ficção científica que usou o conflito entre os humanos e os extraterrestres como uma alusão a um conflito bélico (quando o conto foi redigido) e posteriormente como uma metáfora ao comportamento dos humanos que diante de uma ameaça abandona qualquer tipo de princípio visando seu bem estar. Steven Spielberg resolveu refazer o clássico em 2005 e acabou colhendo muito mais comentários negativos que o esperado, mas em compensação engordou em bons punhados de milhões de dólares sua conta bancária e a de sua produtora. Já o diretor Scott Derrickson, de O Exorcismo de Emily Rose, se deu mal tanto em bilheterias quanto em repercussão com o seu O Dia em que a Terra Parou, refilmagem da ficção homônima datada de 1951 na qual um alienígena vinha para a Terra com as melhores intenções, impedir que a violência humana se espalhasse pela galáxia (era o tempo das famosas bombas atômicas e a exploração do espaço avançava a passos largos), porém, é óbvio que sua recepção não foi nada amigável. Mais de meio século separa a obra assinada por Robert Wise e sua refilmagem e embora a violência só tenha se intensificado, a nova versão optou por levantar a bandeira do ambientalismo, mas sem deixar de criticar a conduta dos seres humanos com seu inerente ar superior, o que inevitavelmente gera conflitos nos mais variados campos. Sim, por trás de todo o verniz de blockbuster made in Hollywood existe um conteúdo a ser amplamente discutido, mas infelizmente ele acaba sendo sucumbido pelos efeitos especiais que, diga-se de passagem, neste caso parecem um tanto exagerados em vários momentos. Keanu Reeves é o cabeça do elenco interpretando Klaatu, o alienígena que aterrissa em pleno Central Park, em Nova York, junto com um gigantesco robô, batizado pelos americanos de Gort, ambos saídos de uma estranha esfera colorida. Na realidade, logo de cara não vemos o astro, mas nos deparamos com uma criatura envolta em uma espécie de gordura protetora, algo que mais a frente é comparado a um material que se assemelha a placenta de um bebê. Faz sentido afinal é essa camada nojenta que está protegendo o extraterrestre que para surpresa de todos se apresenta como um humano comum. A explicação, bem criativa, é de que os seres de outros planetas já estavam de olho nos terrestres há muito tempo e provavelmente já estiveram entre nós e realizando experimentos. Assim conseguiram recolher DNA humano para criar uma “armadura” para Klaatu, o que também justificaria sua rápida adaptação a nossa atmosfera e o poder de se comunicar normalmente em idioma local.

Antes de Reeves entrar literalmente em cena, diga-se de passagem, em um papel perfeito a sua habitual inexpressividade já que não precisa demonstrar emoções, somente manter-se inerte diante dos demais personagens como se fosse uma máquina programada para determinadas ações, ficamos conhecendo a bióloga Helen Benson (Jennifer Connelly) e seu enteado, o garoto Jacob (Jaden Smith), que vivem uma relação desajustada que procura ser desenvolvida ao longo da narrativa para dar algum sustento emocional ao filme. Ela faz parte de um comitê de cientistas que é convocado pelo governo americano às pressas para tentar achar alguma solução para uma emergência. No meio da noite é identificado que um asteróide irá colidir com o planeta dentro de uma hora. Como já dito, na realidade o que chega é a tal esfera que traz Klaatu em missão de paz. Ele apenas quer alertar os terrestres sobre as ações predatórias que os próprios seres humanos estão cometendo contra o meio ambiente sem perceber que os efeitos nocivos destas agressões já estão surtindo efeito. O problema é que suas boas intenções são mal interpretadas pelas autoridades locais e rapidamente Klaatu é capturado, após ser baleado, e Gort é apreendido. Por conseguir manter um contato mais próximo com o estranho ser, é óbvio que Helen é a única que lhe dá ouvidos e se propõe a ajudá-lo em sua missão de tentar salvar a Terra. Até pouco antes de chegar a sua metade, o longa mostra-se interessante e com teorias bastante convincentes, mas tudo que estava sendo erguido para algo apoteótico acaba desmoronando a partir do momento em que Klaatu deixa o centro de pesquisas e ganha as ruas. Se a falta de expressão característica de Reeves trabalha a seu favor enquanto seu personagem está enclausurado, depois ela ajuda a reduzir seu trabalho a nada. E não é culpa exclusiva do ator. O roteirista David Scarpa, de A Última Fortaleza, acabou escrevendo discursos e desenvolvendo situações sofríveis para o extraterrestre, resumindo suas falas a propagandas panfletárias em nome da salvação da Terra e envolvendo-o em estranhos episódios como acompanhar imóvel a briga de dois homens em um aeroporto por um motivo banal ou tentar matar um policial que o afronta para depois ressuscitá-lo alegando que não acha que ele representaria uma ameaça a sua integridade, dois fatos aleatórios que comprovam, no mínimo, que sua intenção não é exterminar a humanidade e sim tentar salvar aqueles que merecem, tanto que não exita a fazer o mesmo com Jacob em um momento de dificuldades. Aliás, o garoto é um tremendo ponto de discórdia na trama. Praticamente todos os filmes de catástrofe têm um pentelho no meio da ação, mas apenas para fazer número, dificilmente agregam algo em termos dramatúrgicos. Colocar o filho de Will Smith no longa foi uma clara tentativa de incentivá-lo a continuar na carreira após seu bom desempenho em À Procura da Felicidade, mas seu personagem é um chato de galochas que não consegue nos fazer acreditar em sua relação conflituosa com a madrasta e tampouco em sua rápida redenção, lembrando que tudo é desenvolvido em apenas algumas horas de uma noite turbulenta. Aliás, a oscarizada Connelly deixa latente seu desconforto no papel da cientista, muitas vezes parecendo ter decorado suas frases como para uma apresentação escolar, e não convence nem mesmo no âmbito pessoal da personagem não havendo sintonia alguma com o enteado. Com tantos equívocos justamente na história, que teoricamente deveria ser o alicerce de qualquer filme, o que levou os produtores a seguirem adiante com tal projeto? Bem, no pretensioso ditado imagem é tudo pode estar a resposta. 

Com uma turbinada no visual com efeitos especiais de ponta e uma sonorização um tanto estridente, talvez os realizadores acreditassem que ninguém perceberia os erros e absurdos narrativos, ainda mais com uma campanha de marketing pesada na época do lançamento. O lucro imediato era o importante, críticas negativas depois não importariam, afinal até os estúdios, não é de hoje, têm o costume de tratarem seus filmes como lixo com o passar do tempo. No Brasil, por exemplo, a estratégia deu certo em termos. Muitas salas multiplex exibindo o mesmo filme geram aquela impressão “poxa esse deve ser bom mesmo”. Sessões lotadas por umas duas semanas já é o suficiente para deixar estúdio, produtoras e distribuidora felizes, no entanto, neste caso em termos de crítica o fracasso é total. Não existe registro de uma única crítica que tenha chegado a conhecimento público que avalie o filme como no mínimo bom, sendo um consenso geral a decepção, sendo destacados apenas um ou outro ponto como fatores positivos da refilmagem. Uma boa sacada foi colocar os políticos americanos como os vilões da trama, tendo como porta-voz da turma apocalíptica Kathy Bates interpretando Regina Jackson, a Secretária de Defesa. Entre as muitas falas inteligentes e pessimistas da personagem merece atenção o momento em que ela cita diversas passagens históricas nas quais os seres inteligentes (entendam americanos) estavam acima de seus inimigos, mas desta vez o jogo se invertia e os ianques é que estavam a mercê da sorte, reforçando que para eles o estranho no ninho representa a vilania. Na reta final, as diversas esferas que surgem em várias partes do mundo como se quisessem salvar espécies de plantas e animais também funcionam como uma síntese da boa mensagem que deveria reger o filme, mas é só. O resto deixa muito a desejar. Até as homenagens ou intenções respeitosas para com o longa inspirador não funcionam muito bem. Gort aparece aqui com um visual bem melhor elaborado, impacta com seu porte, com mais mobilidade e um enigmático feixe de luz em seu visor que parece perseguir alvos, mas mesmo com toda computação gráfica empregada parece irônico dizer que as imagens do robô antigo guardavam muito mais mistérios e encanto, mesmo sendo um homem vestindo uma fantasia e Rise lançando mão de todas as trucagens possíveis para apresentá-lo como algo ameaçador. Outro ponto discutível é a inserção de uma cena-chave no longa dos anos 50, recriada com requintes de detalhes, mas sem grande função na trama. Klaatu tem um encontro com Barnhardt (John Cleese), um professor de Helen, e juntos, tentando resolver uma equação matemática, procuram entrar em um consenso sobre a importância da continuidade da raça humana. O encontro era uma obsessão do alienígena na primeira trama, mas na refilmagem ficou suspensa na narrativa sendo apenas mais um ponto falho. O Dia em que a Terra Parou, em suma, é fruto de oportunismo, visto que as discussões sobre o aquecimento global, desmatamentos, mau uso dos recursos naturais entre tantos outros temas estavam muito em evidência em meados dos anos 2000 pautando documentários, aventuras e até animações. A substituição da Guerra Fria (o medo de uma guerra nuclear) não se constitui na realidade um erro. A ameaça da extinção da humanidade por uma mega bomba de efeito rápido foi substituída pela discussão de que a relação equivocada do homem com a natureza pode ter o mesmo efeito devastador, porém, o envenenamento é feito pouco a pouco. É uma pena que o resultado final se resuma a um amontoado de efeitos digitais injetados desde o início e oferecidos em doses cavalares nos minutos finais, talvez uma medida desesperada de Derrickson em tentar salvar sua produção afinal sempre há uma luz no fim do túnel. Bem, nem sempre.

Suspense - 103 min - 2008

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Um comentário:

Matheus Paes disse...

Concordo absolutamente com o que você escreveu, o filme tenta relembrar o clássico porém acaba se perdendo com atuações descartáveis, roteiro péssimo - só se salva na ideia de que o mundo está perdido para os humanos e quem irá ajudar serão os alienígenas - e efeitos que até uma criança fariam melhores...
Simplesmente um dos piores filmes que já vi!!!