sexta-feira, 4 de setembro de 2015

POSSUÍDOS (2006)

NOTA 6,0

Longa surpreende, para o
bem ou para o mal, com
um intenso e claustrofóbico
thriller psicológico
Existem vários exemplos de filmes que acabam não encontrando seu público devido a uma má escolha de título. Esse é um problema comum quando as produções chegam aos países estrangeiros. No Brasil, muitas obras ganharam alcunhas de doer, outras que nada tem a ver com o enredo e também ocorrem casos de três filmes ou até mais ganharem o mesmo título, o que só confunde o público que acaba por comprar gato por lebre muitas vezes. Também podem ocorrer situações que o título original não pareça nada atrativo e acabe sendo trocado por algo mais genérico como é o caso de Possuídos, cujo nome original é “Bug”, que numa coincidência proposital de nosso mercado também intitula um suspense estrelado por Denzel Washington. Porém, quem espera encontrar uma trama sobre demônios, a grande jogada da distribuidora Califórnia, certamente irá se decepcionar, pois de espíritos demoníacos não temos nem sombras. A obra em questão é um thriller psicológico, mas dificilmente alguém se interessaria em assistir algo chamado simplesmente de “Inseto”, como seria na tradução literal. Sim, essas pequenas e asquerosas criaturas são os vilões deste trabalho do diretor William Friedkin, o responsável pelo famoso O Exorcista, mas não espere uma bobagem no estilo dos trash movies do passado nos quais seres humanos eram transformados em monstros quando submetidos a experiências com insetos, mas de certa forma a produção não escapa de ser rotulada como um tremendo filme B. O enredo é carregado de tensão, mas o medo é construído pouco a pouco e não simplesmente despejado sobre o espectador. Quando a história está em seu clímax, por mais absurdo que ele possa parecer, já estamos totalmente envolvidos e participando da loucura dos personagens, isso se você se permitir participar desta viagem alucinógena. Insetos, possessão que não existe, loucura, tensão, pinta de filme ruim, mas ao mesmo tempo bom, um diretor conceituado no comando, afinal que raio de produção é essa? Realmente esta é uma obra ímpar que não é muito fácil de ser compreendida e talvez por isso se torne boa, pois surpreende o espectador de alguma forma. Colecionando críticas positivas e negativas nas mesmas proporções, ela é feita com estética para agradar as massas, mas seu conteúdo pode parecer um tanto complexo. O texto costuma agradar as platéias mais intelectuais, mas seu visual pode causar repúdio. Enfim, este trabalho é difícil até mesmo de ser catalogado em um gênero específico, devendo ser encarado mais como um projeto experimental para fazer sentido e aí até podemos dar razão e aplaudir as loucuras de Friedkin, na época das filmagens entrando na casa dos 70 anos, mas com vigor de um estreante na profissão.


Baseado na peça teatral homônima de autoria de Tracy Letts, que também assina o roteiro do longa, não é surpresa alguma se deparar com uma narrativa que acontece praticamente toda dentro de um quarto de motel e com dois personagens em cena. Nesse local vagabundo afastado a beira de uma estrada vive Agnes (Ashley Judd), uma mulher solitária que ainda sofre com traumas do passado, como a perda do filho, vividos na época em que era casada com Jerry (Harry Connick Jr.), que agora está em liberdade após anos de reclusão e cercando a ex-mulher como pode. Ela conhece através de uma amiga, R.C. (Lynn Collins), um sujeito esquisitão e de poucas palavras que acaba passando uma noite no tal quarto também. Peter (Michael Shannon) é um paranóico veterano da Guerra do Golfo que acaba por conquistar Agnes que parece finalmente ter a chance de viver um relacionamento amoroso duradouro, mas pouco a pouco seu amor acaba a colocando numa grande armadilha. O rapaz é cheio de delírios relacionados ao governo dos EUA e quando seu corpo começa a apresentar feridas ele está ciente de que foi vítima de alguma experiência ou ato de espionagem envolvendo insetos. Só mesmo estando em frangalhos para conseguir sentir alguma atração por pessoas desse tipo, mas o que poucos compreendem é que esse homem e essa mulher estão passando por momentos delicados, estão perturbados psicologicamente e encontram o apoio necessário um no outro graças a solidão que os aproxima. Soma-se a esta situação limite uma paranóia e a claustrofobia daquele quarto e não há quem deixe de enlouquecer. Certamente até a metade do filme muitos já terão desistido de acompanhá-lo. Em uma análise mais profunda podemos até dizer que o longa se divide em três atos, cada qual com um gênero predominante. A introdução é um drama que traz uma boa premissa e apresentação dos poucos personagens de forma a conquistar a atenção do espectador. A segunda parte predomina um clima de romance no ar com Agnes e Peter se envolvendo de forma sentimental como uma maneira de atenuar os problemas de cada um, mas o suspense já começa a ser inserido. O bloco da conclusão é o mais longo de todos e abre espaço para o terror psicológico envolvendo os tais insetos. Seriam eles reais ou apenas imaginação dos protagonistas? O fato é que até quem suportou o filme até então não deixará de se indagar sobre como tudo isso vai acabar. Uma palavra para definir o desfecho: bizarro. Não há como deixar de gargalhar ou se sentir um idiota ao ver Agnes gritando que é a “super mãe inseto” ou algo do tipo. Sim, ela diz isso por incrível que pareça. A essa altura ou você já está totalmente envolvido pelo clima claustrofóbico e compreende tal frase como o ápice de um quadro grave de esquizofrenia ou desencana de vez e pára de assistir ou segue em frente para ter argumentos para detonar a produção aos amigos.

Ao subirem os créditos finais não estranhe se não souber opinar claramente sobre o que viu. Um “puxa que droga” deve ser a expressão mais óbvia, mas se conseguir queimar um pouquinho os neurônios e analisar de forma mais objetiva e crítica verá que o longa não é totalmente um lixo. Como já dito, deve ser encarado como um projeto experimental e visto por esse ângulo não podemos dizer que Friedkin deixou a desejar. Só o fato de topar o desafio de criar uma atmosfera claustrofóbica e sugestionável em uma época em que a violência explícita e a previsibilidade estão em alta no gênero suspense já vale um voto de confiança. Dentro de um espaço limitado que transmite a sensação de um ambiente sujo onde a luz e a ventilação só tem passagem o mínimo possível, somos convidados a participar junto com os protagonistas de uma experiência desconfortável na qual quem conseguir entrar de cabeça nesta história poderá inclusive partilhar dos mesmos sentimentos que eles, o que certamente ajudará a aceitar o final pouco inspirado na comparação com um clímax acelerado no qual loucura e tensão se misturam. A atmosfera tensa é reforçada pela intensa exploração do cenário através de ângulos de câmera que flertam com o estilo amador, mas algumas sequências são cuidadosamente estudadas como, por exemplo, o posicionamento do equipamento como se alguém observasse os protagonistas do teto do quarto, o que reforça a paranóia dele. Mas o que os assusta tanto? Seria o medo do que podemos ver ou do que é invisível a olhos nus? Sim, eles não têm apenas medo dos humanos malvados que podem estar cercando o quarto, mas também que lá dentro existam focos de contaminação, afinal de uma forma ou de outra o governo americano quer exterminá-los. Friedkin então não poupa closes em objetos aparentemente inofensivos, como maçanetas e persianas, e também toca o terror através de efeitos sonoros como zumbidos de insetos e luzes que emitem um leve barulho, porém um tanto perturbador. Enfim, em termos cinematográficos não tem jeito, Possuídos é repleto de qualidades, só que elas são quase imperceptíveis em uma primeira vez que o assistimos. O que parece feio, mal feito é totalmente proposital, mas o impacto da bizarrice é tanto que nos deixamos cegar imediatamente e logo estamos tecendo comentários maldosos, inclusive deixando de perceber o show de interpretação de Ashley e Shannon que travam diálogos exagerados e cheios de significados ocultos, mantendo assim a origem teatral do texto. Já do ponto de vista do entretenimento aí sim podemos aceitar as críticas negativas já que o longa não segue um estilo comum e claramente não foi feito para agradar milhões de pessoas. De qualquer forma este é um trabalho que merece ser visto pelo menos para você saber rebater as críticas negativas ou concordar com elas. Não tire conclusões precipitadas e encare este desafio se tiver coragem. Indiferente certamente você não ficará após a experiência.

Suspense - 108 min - 2006 

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Um comentário:

renatocinema disse...

A obra de Denzel Washington eu amo.....essa nunca me atraiu.