sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

CAMPO DO MEDO


Nota 6 Apesar do bom início, suspense é arrastado, confuso e com personagens desinteressantes


Qualquer filme que seja baseado em uma obra do autor Stephen King já tem uma publicidade imediata, porém, é bom lembrar que o mestre do suspense também dá suas escorregadelas. Melhor dizendo, a maneira que alguns textos do escritor foram adaptados não foram a contento do público e da crítica. É o que se pode dizer de Campo do Medo, produção feita diretamente para o serviço de streaming da Netflix que tem abraçado vários filmes menores da grife de King. O longa começa muito bem, mas da metade para o final torna-se cansativo, repetitivo e confuso. A trama se passa quase integralmente em um mesmo cenário: um gigantesco campo de vegetação bem densa e alta. Os irmãos Becky (Laysla De Oliveira) e Cal  (Avery Whitted) estavam viajando para o interior dos EUA e acabam parando em uma estrada deserta quando a jovem grávida começa a passar mal. Rompendo o silêncio, eles escutam a voz de um garoto pedindo por socorro em meio ao matagal ao lado da rodovia e decidem ajudá-lo, mas tão longo adentram à plantação percebem uma atmosfera estranha no local que revela-se um complexo labirinto à céu aberto. 

Além do pequeno Tobin (Will Buie Jr.), no local também está seu pai, Ross Humboldt (Patrick Wilson), um sujeito aparentemente bastante afetado psicológica e emocionalmente pelas circunstâncias. Não é difícil prever que os irmãos foram atraídos para uma emboscada, mas desse ponto em diante tudo pode acontecer. Entretanto, isso não é necessariamente algo positivo. Baseado em um conto que King escreveu em parceria com Joe Hill, seu filho, a sede ao pote foi demais. Na tentativa de apresentar uma complexa trama e surpreender o espectador diversas vezes ao longo da narrativa, a dupla se esqueceu que não basta um ambiente propício para se contar uma história assustadora. Também é preciso envolver quem assiste através dos conflitos vividos pelos personagens e no caso nenhum deles apresenta uma construção de perfil razoavelmente interessante para sofrermos juntos com suas agonias e dúvidas. Acompanhamos tudo com certo distanciamento e na expectativa de que algo surpreendente poderá ainda surgir em meio ao matagal. 


De fato, sustos e surpresas não faltam,  embora a maioria previsível e nada que cause grande impacto justamente porque pouco nos importamos com o que irá acontecer ao grupo encurralado. Vicenzo Natali, do terror cult Cubo e da subestimada ficção científica Splice - A Nova Espécie, além da direção também é o responsável pelo roteiro. Pelos filmes citados, habilidade ele tem para utilizar ambientes claustrofóbicos e trabalhar com argumentos que exigem tensão crescente, mas desta vez não conseguiu sustentar uma produção de pouco mais de uma hora e meia. Provavelmente o conto renderia um curta ou média metragem de maior poder de impacto. Só nos sentimos realmente sufocados nos primeiros minutos quando os irmão adentram à plantação guiados pelo chamado do garoto. Quando o encontram a ação praticamente fica restrita a uma clareira cujo centro abriga algo estranho que é a resposta para todo o mistério. Ou não. Isso vai depender do quanto o espectador estiver disposto a se envolver com o enredo que é intrigante até certo clímax ainda na metade, mas depois tende a ser cansativo e cair em clichês.

Sem negar a vontade de parecer mais original e inteligente do que de fato é, o que salva Campo do Medo é a parte técnica com uma boa fotografia, iluminação noturna que ainda assim deixa tudo bastante visível e a sonorização que oferece com perfeição os barulhos da vegetação em movimento com o vento e seu estalar quando os personagens caminham entre seus meandros. O elenco também merece elogios, principalmente o pequeno Buie Jr., que não entrega o ouro com sua interpretação dúbia, ora parecendo um inocente e ora um aprendiz de vilão. Wilson também parece se à vontade com um personagem que lhe dá a oportunidade de experimentar novos caminhos e exagerar à vontade, o que torna a sua criação até um pouco caricata. Já o casal de irmãos fica um pouco sem função, embora sejam as vítimas, principalmente Becky que suporta situações de violência emocional e sexual, mas em momento algum sentimos o real impacto dessas agressões sobre ela. Por vezes o enredo insinua algum tipo de conflito interno da personagem, mas nunca o desenvolve nem mesmo com a entrada na trama de Travis (Harrison Gilbertson), o pai de seu filho.


No mais, a produção tira proveito de seu campo fértil para incomodar, surpreender e fazer quem assiste pensar por conta própria nas possibilidades de justificativa para o mistério que ronda o local que a certa altura ainda é apontado como ponto de uma espécie de culto a uma enorme pedra negra, um tipo de rocha a qual se atribui poderes misteriosos. Terror, suspense, ficção científica e umas pitadas de drama aqui e acolá. É muita informação em um mesmo projeto. Extensas e altas plantações já foram o palco de conflitos mais bem elaborados em outras produções como Colheita Maldita, originado também de uma obra de King, e o caçoado (injustamente) Sinais. Será que Natali assistiu algum filme do tipo para se inspirar? Provavelmente não, caso contrário saberia extrair uma colheita melhor de sua plantação. Infelizmente, não seria exagero dizer que o longa está entre as piores adaptações de uma obra do autor que já nos presenteou com clássicos como Carrie - A Estranha e O Iluminado.

Suspense - 90 min - 2019

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