quinta-feira, 12 de agosto de 2021

PAIXÃO À FLOR DA PELE


Nota 4 Romance com mescla de suspense acaba vítima da própria ambição e de trama enfadonha


Quantas vezes você já tentou assistir a uma obra super elogiada e não entendeu bulhufas? Nos tempos áureos das mídias físicas, principalmente dos DVDs, o espectador tinha o bônus de ter acesso a materiais extras, incluindo explanações dos diretores cena por cena, que podiam mudar as opiniões dos espectadores quanto suas percepções dos filmes. Acompanhar os making of geralmente ajuda a elucidar pontos de dúvidas, sanar curiosidades e até mesmo ruir críticas até então positivas. Paixão à Flor da Pele é um destes casos que possivelmente precisam ser explicados aos espectadores, ao menos aos desatentos. Com idas e vindas no tempo e uma rocambolesca trama envolvendo obsessão, traição e amor latente, o longa não despertou atenção do público e tampouco da crítica. Aparentemente confuso do início ao fim, ao que tudo indica nem o pessoal responsável pela distribuição do filme na época do lançamento teve paciência para aturar tal engodo e erroneamente o divulgaram como um suspense com resquícios do estilo do mestre Alfred Hitchcock. Nada a ver. Trata-se apenas de mais uma tentativa frustrada de refilmar um sucesso europeu e escamotear a escassez de boas ideias em Hollywood.  

Buscando inspiração no longa francês O Apartamento datado de 1996, o roteiro adaptado por Brandon Boyce tem como protagonista Matt Simon (Josh Harnett), um jovem empresário que acredita ter visto por acaso em uma cafeteria Lisa Parish (Diane Krueger), uma mulher por quem ele foi perdidamente apaixonado, mas que sumiu misteriosamente há dois anos. Ele decide segui-la, descobre o seu endereço atual e sua rotina começa a ser moldada em função dos passos dela. Não gostaria de forçar um encontro, mas certo dia não aguenta a ansiedade e invade o apartamento para poder surpreendê-la. Contudo, ele acaba por encontrar uma outra jovem no local, esta que sabe muito bem que está acontecendo um engano, mas quer tirar proveito disso. Alex  Denver (Rose Byrne) é amiga de Lisa e ficou apaixonada por Simon a partir dos relatos e fotos que ela apresentava. Munida de informações íntimas do casal, ela então usa toda sua lábia para tentar seduzir o rapaz e até assume o mesmo nome de sua companheira de apartamento que, diga-se de passagem, ela omite conhecer e faz de tudo para evitar um encontro entre eles e assim ficar com o caminho livre para viver seu amor doentio, só depende do empresário que a essa altura está um tanto confuso emocionalmente.


Com viagem de trabalho marcada para a China e uma noiva a sua espera na volta, Simon decide jogar tudo para o alto e seguir seus instintos de que está no caminho certo para descobrir o por quê de Lisa o ter abandonado quando ele propôs de morarem juntos. Quem sabe até teria a chance de resgatar a relação e evitar se casar com uma mulher que não ama. Entretanto, as coisas não caminham como esperava. Provavelmente iludido pelas coincidências entre a Lisa que procurava e a Lisa que acabara de conhecer, como o mesmo perfume ou o número de calçado, Matthew acaba mantendo relações com a impostora mesmo ciente de que ela não é a mulher que amava e esta, por sua vez, nem desconfia dos planos de sua amiga interesseira. Confuso não? Para embolar ainda mais as coisas entra em cena Luke Stanford (Matthew Lillard), o melhor amigo do jovem que também está envolvido com um novo amor no momento, ninguém menos que a tal Alex. Fica bastante óbvio que a garota armou esse affair para ficar por dentro dos detalhes da rotina do ex de Lisa, mas sempre deu um jeito de fugir (e o destino ajudou) de um encontro com o empresário para não atrapalhar seus planos.  

A trama em si não é difícil de compreender. Simplesmente é um romance com toques de suspense cujo fio condutor é sustentado pelo nome menos conhecido do elenco. É a personagem de Byrne que articula todas as armações para manter Simon e Lisa separados, é ela quem se aproveita da ingenuidade de Stanford e quem tem a visão de todo jogo e sabe como movimentar as peças para evitar um xeque-mate, mas o que atrapalha a trama é a confusa edição que mistura passado e presente para mostrar todas as articulações que ajudaram Alex a bolar seu plano, tudo muito bem planejado para deixar seus supostos namorado e amiga próximos nos momentos que lhe convém, mas bem alheios ao seu objetivo principal. Para levar adiante o projeto sem se perder entre os flashbacks, McGuigan demonstra ter plena compreensão do roteiro que mantém elementos-chaves do longa francês, mas os distribui em uma nova dinâmica a fim de tecer viradas que deveriam ser surpreendentes. Contudo, a equipe de edição compromete o trabalho não conseguindo um bom ritmo para a narrativa fluir, deixando-a truncada e enfadonha.


Como desde o início é difícil se simpatizar com os personagens e para perder o fio da meada basta um piscar de olhos, chegamos ao fim das quase duas horas de duração extremamente fatigados. A tentativa de fugir do lugar comum apostando em uma narrativa intrincada poderia elevar Paixão à Flor da Pele de patamar, mas a impressão que fica é que o longa merecia algumas sessões de teste e um apuro maior na sala de edição para lapidar o material. Vale também a ressalva que o remake despreza um detalhe essencial da trama original. Em tempos de celulares e emails, a narrativa perdeu o charme e o mistério que envolvia a comunicação através de cartas e telefonemas feitos em cabines públicas, o que deixava tudo mais intrigante. Se hoje fosse feita mais uma refilmagem, todo conflito poderia ser resumido em único dia tamanha a rapidez dos meios de comunicação. No caso não é um elogio ao avanço tecnológico, mas sim a conclusão de que algumas histórias devem permanecer em nosso imaginário tal e qual foram concebidas. 

Romance - 115 min - 2004

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