sábado, 6 de novembro de 2021

O VISITANTE (2007)


Nota 7 Drama aborda conflitos a respeito do acolhimento de imigrantes em solo norte-americano


Você pode estar em Nova York, Paris, Londres, Madri ou até mesmo em São Paulo. Não importa onde você estiver uma triste realidade irá se repetir: o desprezo com os estrangeiros. Não estamos nos referindo ao turista que se hospeda em hotéis e vai preparado para gastar com compras e programas culturais e sociais, ou seja, que vai de alguma forma contribuir com a economia do país visitado. O problema para os donos da casa são os imigrantes que muitas vezes partem de seus locais de origem com uma mão na frente e outra atrás e acham que basta atravessar uma fronteira para começar uma vida nova. Esse é um dos temas abordados por O Visitante, produção que ganhou ligeira projeção graças a merecida indicação ao Oscar para o veterano ator Richard Jenkins. Ele interpreta Walter Vale, um professor universitário sessentão que está sem um objetivo na vida. Solitário desde o falecimento da esposa, ele leva uma rotina pacata na universidade em que trabalha, mas almeja escrever um livro. Só não sabe quando terá disposição e ideias para tanto. Certo dia ele é enviado para uma conferência em Nova York e decide passar alguns dias em seu apartamento na cidade o qual não visitava há anos. Para seu espanto, quando abre a porta descobre que o local tem novos donos, um casal de imigrantes ilegais formado pelo simpático sírio Tarek (Haaz Sleiman) e pela senegalesa Zainab (Danai Gurira), ela bem mais esquentadinha. 

O casal esclarece que alugou o imóvel acreditando que negociaram com o proprietário em pessoa e nem desconfiavam que tinham caído em um golpe, mas felizmente Vale tem bom coração (talvez nem ele soubesse disso) e permite os imigrantes dividam o apartamento com ele até que encontrem um novo lugar para ficarem e da convivência forçada surge uma inesperada amizade. Tarek é músico e começa a ensinar os segredos da percussão ao professor através de um instrumento africano, este que já demonstrava interesse no assunto dedicando-se a frustradas aulas de piano como forma de preservar as lembranças da esposa que era uma pianista de mão cheia. A música acaba aproximando estes dois homens, e tal amizade por tabela quebra o gelo com Zainab, mas para Vale também traz a certeza de que até então estava desperdiçando sua vida. Contudo, o filme do roteirista e diretor Thomas McCarthy não se resume a reciclar a temática da troca de experiências que surge do relacionamento entre pessoas aparentemente diferentes, mas com algum detalhe em comum. A trama dá uma virada quando Tarik vai parar atrás das grades injustamente e corre o risco de ser deportado. É nesse momento em que a política norte-americana quanto a imigração é colocada em xeque com a entrada da personagem Mouna (Hiam Abbass), a mãe do sírio detido que sai de sua cidade no interior dos EUA com o único objetivo de ajudar o filho e impedir que ele perca o pouco que conquistou no tempo que está na terra do tio Sam. 


A essa altura Vale já está em pleno processo de transformação de sua personalidade graças a amizade com Tarik, o que facilita o contato com Mouna e o leva a ajudá-la em sua guerra por justiça e direitos. É graças ao apoio do professor que ela conseguirá reunir forças para aguentar o desespero de não saber o que está acontecendo com seu filho, afinal sabemos que os ianques não costumam ser muito amigáveis com árabes e africanos historicamente. Com a paranóia quanto a ataques terroristas, a atenção com a entrada e saída de estrangeiros foi redobrada e tornaram-se comuns casos em que a precaução ganhou contornos de preconceito, mas o longa procura fugir de situações clichês e enfia o dedo na ferida com cautela para não descambar para o melodrama barato, o que seria extremamente fácil. A obra na verdade se encaixaria na lista de produções em que o roteiro pode não ser arrebatador, mesmo tendo potencial para tanto, mas a trama tende a crescer com a força das interpretações. Apesar do semblante melancólico inicial, não é exagero dizer que Jenkins é a alma do negócio entregando uma interpretação que não raramente torna-se mais importante que as situações desenvolvidas pelo roteiro. Vale é detentor de uma personalidade discreta, porém, marcante, e desde sua primeira aparição na tela, quando é desencorajado a continuar aprendendo piano por não ter intimidade com o instrumento, percebemos a introspecção do professor, mas ele não muda da água para o vinho. 

McCarthy procura respeitar ao máximo a cadência de emoções, assim até a amizade do protagonista com Tarek e Zainab transmite a sensação de algo mais reservado, afinal de contas para os imigrantes já calejados a proximidade com um americano é sempre motivo para manter um pé atrás. No entanto, Vale se entrega a essa amizade por inteiro ao resgatar o prazer de ter uma companhia para compartilhar alegrias e angustias, o que justifica seu empenho para libertar o amigo e conseguir seu visto de permanência no país. É muito interessante o efeito que o diretor consegue nos primeiros momentos de contato entre o americano e o sírio, respectivamente o contraste da inércia de um e o positivismo do outro, mas é claro que honrando o seu estilo independente de ser O Visitante é pontuado por momentos de silêncio que evocam a reflexão. Assunto para pensar não falta. A questão da imigração ilegal, a burocracia desgastante, a paranoia quanto a presença de terroristas e mais uma vez está em pauta a degradação do duvidoso sonho americano, utopia que ainda faz a cabeça de muita gente. 


O elenco coadjuvante, no caso os estrangeiros da trama, consegue performances sinceras e emotivas que nos fazem crer no inocente pensamento que o sonho de ter uma vida digna e próspera em terras ianques pode ser uma realidade. E não podia ser diferente. McCarthy, também ator, sabe o quanto é necessário manter os intérpretes motivados e para tanto tinha um bom roteiro em mãos, uma história sobre pessoas deslocadas tal qual trabalhou em O Agente da Estação, seu longa de estreia no qual narrou a chegada de um anão a uma cidade onde automaticamente despertou atenções. Neste caso, os deslocados não são apenas Tarek e Zainab, mas o próprio Vale que tardiamente buscou reencontrar seu lugar em mundo do qual se autoexilou. Dessa forma, ele tornou-se visitante do universo de seus inquilinos, digamos assim, mesmo dividindo seu apartamento que teoricamente é uma extensão de seu estilo de vida. Um pouco de cor, ou melhor, de música, não faz mal a ninguém não é mesmo? 

Drama - 103 min - 2007

O VISITANTE (2007) - Deixe sua opinião ou expectativa sobre o filme
1 – 2 Ruim, uma perda de tempo
3 – 4 Regular, serve para passar o tempo
5 – 6 Bom, cumpre o que promete
7 – 8 Ótimo, tem mais pontos positivos que negativos
9 – 10 Excelente, praticamente perfeito do início ao fim
Votar
resultado parcial...

Nenhum comentário: