quinta-feira, 27 de maio de 2021

LOPE


Nota 7 Cinebiografia de poeta espanhol é convencional, mas eficiente e com belo visual barroco


O cinema brasileiro está cada vez mais ganhando espaço em outros países e o talento de nossos atores, diretores e equipes técnicas conquistando o respeito e a admiração do público, crítica e, principalmente, de quem faz cinema em todos os cantos do mundo. A prova disso é que frequentemente encontrarmos nos créditos de muitas produções internacionais os nomes de alguns brasileiros. Este é o caso de Lope, uma requintada produção de época europeia dirigida por Andrucha Waddington, o homem por trás das câmeras de Eu, Tu, Eles e Casa de Areia, por exemplo. Mesmo não possuindo uma extensa filmografia, alguns de seus trabalhos chegaram a ser exibidos em importantes festivais internacionais e chamaram a atenção. Nesta coprodução entre Brasil e Espanha o cineasta mantém o mesmo bom nível de seus trabalhos anteriores e sem inovações, mas isso não faz desta obra um projeto menor em seu currículo, pelo contrário, ele se mostra maduro e confiante para contar a história de uma personalidade do mundo das artes pouco conhecida fora do território espanhol. Em seu primeiro filme fora do Brasil, utilizando o idioma espanhol nos diálogos, Waddington aproveitou todo o espírito teatral de uma história verídica, mas bem ao estilo dos grandes romances escritos séculos atrás. 

Felix Lope de Verga (Alberto Ammann) é um jovem e galanteador poeta que deseja ter seus trabalhos reconhecidos e não mede esforços para conseguir o que quer. Em meados do século 16, o dramaturgo volta da Guerra dos Açores para Madri decidido a não lutar mais pelo seu país natal e querendo seguir seu sonho de com seus textos modificar a cara das produções teatrais unindo humor e drama em uma mesma história. Para realizar seu sonho, Lope busca a ajuda do antipático empresário teatral Jeronimo Velázquez (Juan Diego), mas convencê-lo de seu talento não é uma tarefa fácil, porém Elena (Pilar López de Ayala) pode ser a salvação do rapaz. Filha do empresário, ela logo se sente atraída pelo dramaturgo e começa um romance às escondidas, já que ela é usada pelo pai para conseguir favores de homens ricos e o próprio escritor passa a ter seu trabalho explorado. Enquanto isso, Lope também se envolve com outra mulher, Isabel (Leonor Watling), uma amiga de infância de família recatada. O Marquês de Navas (Selton Mello) se apaixona por ela e contrata o poeta para escrever versos para conquistá-la, mas não demora muito e a moça descobre o verdadeiro autor das palavras amorosas. Desafiando regras e barreiras sociais e sem pensar nas consequências, o escritor então acaba despertando a ira de muita gente. 


A escolha de um estrangeiro para levar às telas uma homenagem a um ídolo da cultura espanhola gerou críticas da imprensa local, mas a mídia brasileira também não exaltou a obra. As poucas críticas que surgiram seguiram o viés de malhar a opção do diretor em realizar um filme convencional e com um apuro técnico invejável para se aproximar ao máximo dos requisitos necessários para que seu longa ganhasse uma estética europeia, afinal o cinema do continente é muito conhecido pelos visuais arrebatadores de seus épicos. Realmente, talvez até o momento o cineasta não tinha se envolvido em um projeto tão rico em detalhes de cenografia, figurinos e maquiagem, tudo no melhor estilo barroco, o que sem dúvida rende belas imagens para a equipe de fotografia e edição trabalhar, o que valoriza muito o trabalho. Não há problema algum em se preocupar com a estética, desde que o enredo não decepcione como acontece neste caso. A narrativa acompanha o início da vida adulta de Lope, que nasceu em 1562 e faleceu em 1635, e sua busca incessante para conseguir viver da sua arte. O roteiro é feliz em sua apresentação sucinta do personagem da sua juventude até alguns anos de sua maturidade mostrando suas conquistas e desventuras, mas sem se estender até a sua velhice, lugar comum em que as cinebiografias caem. O espectador consegue absorver o suficiente para conhecer o essencial sobre o artista e de quebra ter uma visão da Espanha da época, como funcionavam as companhias teatrais e as ligações e conchavos dos nobres que ditavam as regras da sociedade.  

O argentino Ammann interpreta o personagem-título com muito vigor e é o grande destaque, mesclando em sua interpretação características de outras figuras que o cinema tratou de imortalizar, desde a sensualidade digna de Don Juan De Marco até a inteligência e o dom com as palavras de Cyrano de Bergerac, passando ainda pelo entusiasmo de revolucionar o teatro tal qual Jean-Baptiste Moliére fez na França. Alguns reclamam do tom heroico que o intérprete imprimiu em seu protagonista, mas Lope com sua latente rebeldia talvez quisesse mesmo ser um herói, o homem que representaria a explosão da angústia e repressão do povo espanhol. Os demais atores apresentam interpretações corretas e críveis, mas é preciso puxar a orelha dos nossos representantes no elenco. Mesmo longe da terrinha, o diretor deu oportunidade para Mello e até Sônia Braga fazerem pequenas participações. O ator mostra-se pouco a vontade e atua como se estivesse em uma novela mexicana, mais robótico impossível, e a veterana atriz, figurinha fácil em obras internacionais que pedem uma mulher com características latinas, está irreconhecível sob uma maquiagem que a transforma em idosa, mas piscou os olhos e ela já saiu de cena. 


Apesar de alguns probleminhas narrativos e de direção, Lope é um bom filme que consegue envolver o espectador com o olhar romântico jogado sob a vida do personagem central que em alguns momentos é um pouco ambíguo e deixa o espectador na dúvida se ele é o mocinho ou o vilão da história. A lente da câmera de Waddington parece tão encantada pelo protagonista quanto o próprio era apaixonado pelos seus sonhos e ideais, um convite irresistível para participarmos da narrativa. Selecionado para os Festivais de Veneza e Toronto, o título ainda concorreu a sete prêmios Goya, o Oscar espanhol, vencendo nas categorias Melhor Canção Original e Melhor Figurino. Tal experiência certamente influenciou os futuros trabalhos do cineasta, sempre em busca de aprimoramentos, mas é uma pena que os anos passam e parece que nossa imprensa parece só ter foco para exaltar a miséria e as paisagens áridas que nosso cinema insiste em registrar em busca de elogios e prêmios e pouco se importando em agradar ao grande público. Vez ou outra, um refresco de romantismo e fantasia é bom para nossos olhos.

Drama - 106 min - 2010 


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resultado parcial...

2 comentários:

renatocinema disse...

Quero muito assistir.

Unknown disse...

tambem assisti esse filme e gostei. fiz ate um post no meu blog, se quiser conferir:

http://umanoem365filmes.blogspot.com/2011/07/192-lope-andrucha-waddington2010.html

Muito bom seu espaço.
Grande abraço