terça-feira, 10 de outubro de 2023

LOUCURAS NA IDADE MÉDIA


Nota 3 Com previsíveis piadas, comédia se apoia em ator limitado a caretas e exageros corporais


Eddie Murphie, Cuba Gooding Jr., Chris Rock... Existem ótimos atores negros que encontraram na comédia seu território seguro. É uma pena que com o tempo o chão tende a ruir. Em Hollywood parece uma regra catapultar ao sucesso em velocidade recorde e tão logo puxar o tapete, só assim para explicar a quantidade de filmes bobos que se limitam a explorar o jeitão descolados de seus astros, algo que por vezes descamba para um lado preconceituoso exaltando a malandragem. Martin Lawrence virou estrela da noite para o dia com Vovó... Zona e com a publicidade e milhões que faturou bem que poderia ter recusado fazer Loucuras na Idade Média. Pelo título mirabolante ganho no Brasil já dá para ter ideia do que se resume a produção. Se apostassem em um protagonista que fugisse do lugar-comum quem sabe a produção seria melhorzinha.

Lawrence dá vida à Jamal Walker, um bonachão que trabalha em um parque de diversões de temática medieval que está caindo aos pedaços e que em breve deve ser soterrado com a concorrência de um novo complexo nos mesmos moldes que está para ser inaugurado em local próximo. Só com essa informação já dá para ver que criatividade não é o forte dos roteiristas Darryll Quarles, Peter Gaulke e Gerry Swallow,  até porque tal conflito não influi absolutamente em nada na trama que claramente é construída para o protagonista usar e abusar de caras e bocas. Os primeiros minutos que o mostram se divertindo na frente do espelho, escovando os dentes de forma bizarra, comprovam isso e servem como um convite para deixar o filme de lado. Para quem quiser arriscar, desconecte seu cérebro para tolerar melhor. 


Enquanto limpava um córrego que atravessa o parque, sem explicação alguma, Walker vai parar na Inglaterra do longínquo ano de 1328, um mundo comandado por um rei impiedoso e habitado por cavaleiros vestidos em imponentes armaduras e donzelas indefesas. Inicialmente Walker acha tudo bastante divertido, acredita já estar no novo parque e até se espanta com o realismo dos cenários e roupas, e quando ajuda Sir Knolte (Tom Wilkinson), um cavaleiro bêbado, acredita que ajudou um simples sem-teto. Mesmo quando é recebido com toda pompa pelo rei Leo (Kevin Conway) e demais nobres, Walker ainda acredita estar em meio a atores ensaiando uma das atrações do parque. Contudo, ele é confundido com um mensageiro da Normandia envolvido em uma conspiração para matar o tirano líder a mando do noivo da princesa do reino, Regina (Jeannette Weegar).

Quando cai na real, o rapaz já está totalmente a vontade e descola até uma paquera, Victoria (Marsha Thomason), criada da corte e, vejam só que surpreendente, também negra! Historicamente afrodescendentes eram raridades na Europa na época, visto que somente séculos mais tarde foram agregados por conta da escravidão. Tudo bem, o filme não tem a menor pretensão de dar uma aula, mas a escolha de uma atriz negra reforça o velho estereótipo de que os próprios representantes da etnia são preconceituosos e preferem se relacionar com os de sua cor. De qualquer forma, o intuito do longa é divertir e até a sua metade consegue com as previsíveis piadas envolvendo a adaptação do protagonista ao cenário medieval, mas quando o tal plano contra o rei vira o centro das atenções a graça se perde e o diretor Gil Junger leva a sério demais sua produção. 


De certa forma, o diretor apresenta uma versão não-oficial do livro "Um Ianque na Corte do Rei Arthur", de Mark Twain, que já teve diversas adaptações ou serviu como inspirações, sendo o fruto mais conhecido Uma Cavaleira em Camelot estrelado por Whoopi Goldberg. Praticamente com o mesmo plot, Loucuras na Idade Média só troca a protagonista feminina por um masculino cheio de maneirismos e que exagera nas expressões faciais e corporais buscando o riso fácil, ainda mais contrastando com o jeito fechadão do povo medieval. Aliás, o longa se apoia totalmente em batidas piadas envolvendo o choque cultural, temática um tanto batida, e ficam perguntas no ar. Por que a maior parte das comédias com atores negros precisam mostrar um sujeito atrapalhado, bobo para certas coisas, porém, esperto o suficiente para lidar com a mulherada e se safar de problemas? Para completar o perfil estereotipado, precisam mesmo usar oito gírias a cada dez palavras que pronunciam e usar roupas dois ou três números maiores?

Comédia - 95 min - 2001 

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