terça-feira, 19 de abril de 2016

O DIÁRIO DE UMA BABÁ

NOTA 6,0

Longa aborda vários temas
sobre o comportamento de
famílias ricas, mas todos de
forma superficial 
Alguns títulos são tão simplórios ou unem palavras tão comuns ao gênero cinematográfico que pertencem que podem acabar causando o efeito contrário ao desejado. Ao invés de chamar a atenção acaba afastando o espectador, mas em alguns casos podemos nos surpreender com o conteúdo como é o caso de O Diário de Uma Babá que mascarado como uma típica comédia romântica oferece muito mais que uma simples história protagonizada por uma jovem em busca de seus sonhos, entre eles um grande amor. O longa faz uma abordagem crítica, porém, divertida sobre o universo das famílias modernas e ricas americanas, mas uma alfinetada que serve para pessoas de qualquer parte do mundo e de repente até independente da classe social que representem. O roteiro mostra através dos olhos e emoções de uma babá o cotidiano de um casal desajustado que vive um casamento de fachada e não tem tempo para o filho pequeno. Annie Braddock (Scarlett Johansson) é uma jovem recém-saída da faculdade que vive em um bairro da classe operária de Nova Jersey. Ela sofre uma grande pressão de sua mãe para que encontre logo um lugar respeitável no mundo dos negócios, mas, decidida a fugir dessa realidade, aceita o emprego de babá de uma família rica de Manhattan, a qual chama apenas de “os X” (um recurso esperto para evidenciar a artificialidade do clã). Como costuma dizer, não foi ela quem encontrou esse emprego, foi ele quem a encontrou já que acabou salvando um garotinho de ser atropelado e rapidamente conquistou a simpatia da mãe do garoto, uma perua que sabe como impor suas vontades simplesmente não dando a possibilidade do outro discordar e nem mesmo concordar. Ela decidiu que Annie seria a nova babá do filho e não tem mais conversa, ponto final. Animada inicialmente, logo ela descobre que a vida não seria o mar de rosas que imaginava, pois precisa atender aos caprichos da Sra. X (Laura Linney) e seu precioso filho Grayer (Nicholas Art), além de evitar qualquer contato mais próximo com o Sr. X (Paul Giamatti). Entre as tantas tarefas do novo emprego, Annie precisa cozinhar, fazer compras e limpar a casa. Praticamente uma funcionária mil e uma utilidades em atividade por quase 24 horas diárias. A situação se complica de vez quando ela se apaixona pelo “Gatão de Harvard” (Chris Evans), vizinho da família X, que a força a reexaminar sua vida e ver que ela está se submetendo aos caprichos daquela família de ricaços e esquecendo-se de cuidar de si mesma. Apesar deste gancho romântico, o longa não o aprofunda, até mesmo porque a patroa da moça a proíbe de ter contatos mais íntimos com qualquer um, de preferência nem mesmo saber quais os nomes dos vizinhos.

Todos sabem o rumo que esta história vai seguir. Apesar do regime de escravidão ao qual é submetida, Annie não tem coragem de pedir demissão porque se afeiçoou à Grayer e a recíproca é positiva. Se apegar a alguém da família para a qual trabalha, este sem dúvida deve ser um dos maiores males da vida de um empregado doméstico, mas todas as alegrias e tristezas da profissão foram narradas em um livro escrito pelas ex-babás Nicola Kraus e Emma McLaughlin no qual contam tudo o que passaram nos anos que trabalharam cuidando dos filhos mimados de madames nova-iorquinas, estas que ocupadas trabalhando ou gastando o tempo ocioso e o dinheiro do marido no shopping ou no cabeleireiro preferiam ter o mínimo de contato com as crianças. Ao adaptarem a obra homônima para os cinemas, os roteiristas e também diretores Robert Pulcini e Shral Springer Berman, de Anti-Herói Americano, se viram num dilema. Era melhor fazer um filme como se fosse uma crônica ou apostar em uma trama convencional? Eles optaram por uma mistura de ambos os estilos e o resultado infelizmente é só um pouco acima do regular. Eles sobrecarregaram a protagonista transformando-a em narradora onipresente e também personagem principal das situações que não só observa, mas também participa de forma ativa. Quase como uma pessoa invisível, ela vê com desprezo a futilidade da sua patroa, o descaso do patrão com os assuntos domésticos e os problemas que os comportamentos dos pais causam no garoto, este que inicialmente parece mal educado e ranzinza justamente por causa da maneira como era cuidado pela família. Então entra em cena a Annie de carne e osso que vai tentar fazer de tudo para esta criança ter uma infância feliz e saudável, impor limites a mãe dele e fugir das paqueras do pai nos poucos momentos em que ele está em casa (a câmera parece fugir de Giamatti para apresentar seu personagem apenas de relance, uma metáfora visual ao comportamento dele). Fora isso, Annie ainda tem que fazer o papel de mocinha romântica do longa vivendo uma relação de morna para fria com um vizinho, briga com a mãe que não entende sua escolha profissional e ainda faz uma pesquisa de campo com outras babás para saber se o nível de exploração que elas sofrem é menor, idêntico ou até maior que o dela. Com tantos temas a serem desenvolvidos em um curto espaço de tempo, todos acabam sendo abordados de forma superficial culminando em um final previsível e que joga panos quentes sobre qualquer crítica ofensiva que possa eventualmente ter surgido ao longo da narrativa. Só resta saber se para aqueles que “a carapuça serviu” o recado da conclusão também seja compreensível e colocado em prática.

É nesse redemoinho de assuntos que se sustenta O Diário de Uma Babá. Desde o início, quando é feita uma comparação entre a evolução das espécies antigas com as atuais, até o final que revela o quanto o modelo da família feliz é uma ilusão, fica nítido que a grande lição do filme é mostrar que dinheiro não é tudo. Bens materiais e luxo não significam nada, principalmente para uma criança quando não recebe amor e atenção dois pais. A temática é universal, mas é certo que o problema como exposto no longa é bem mais comum entre as classes privilegiadas. Quantas pessoas existem espalhadas pelo mundo ricas em dinheiro e bens materiais, mas pobres em inteligência emocional e educação? Quantos ricaços ainda têm a mentalidade medíocre de acreditar que ao dar o videogame mais moderno e bombado do momento ao seu filho estão suprindo positivamente o tempo de convivência que eles não cedem? Pais que trocam carinho pelo dinheiro provavelmente sofreram algum trauma ou decepção no passado, mas não aprenderam com os erros dos outros e continuam perpetuando ideais errados às novas gerações. O Sr. X ainda mantém viva a imagem do homem que trabalha muito para dar luxo à família e por isso não pode ser questionado quando decide se divertir, fora de casa fique bem claro. A Sra. X, mesmo infeliz, preocupa-se muito em manter as aparências, quer sempre ser obedecida e servida e não revela detalhes íntimos do clã para ninguém, características que pode ter herdado de berço ou adquiriu ao longo da juventude enquanto sonhava com seu modelo de vida ideal. O fato é que Pulcine e Berman não podem ser acusados de fazer um trabalho preguiçoso. É nítido que tiveram a boa vontade de apresentar uma obra que fosse além de uma simples comédia romântica, mas talvez pela pouca intimidade com o cinema ficcional e comercial ou até mesmo para atender as exigências dos produtores que acolheram o projeto acabaram se atrapalhando. Sem dúvida haviam excelentes ganchos a serem trabalhados, como o assédio do patrão a funcionária, mas para manter o clima de “feel good movie” e a censura livre, os diretores optaram em determinado momento por manter as atenções do roteiro sobre um tema principal. Embora Annie e a Sra. X aparentemente pertençam a classes sociais com poucos graus de diferença, o encontro das duas resulta em um grande choque social e cultural e é com essa exploração que esta comédia acaba tornando-se um programa um pouco acima da média, uma sessão da tarde que pode não ser das mais ingênuas ou inofensivas. Uma opção que deveria ser obrigatória para certas pessoas que acham que são as donas do mundo perceberem o papel ridículo que representam para boa parte da sociedade (entenda-se de classe média para baixo).

Comédia - 104 min - 2006

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Um comentário:

Rafael W. disse...

Diverte, mas é mediocre como um todo.

http://cinelupinha.blogspot.com/