sexta-feira, 7 de maio de 2021

MINHA MÃE É UMA PEÇA


Nota 8 Importada do teatro, comédia investe em protagonista popular e de fácil identificação


Podem criticar à vontade, mas é inegável que se hoje temos produções nacionais suficientes para brigar por espaço com badalados filmes estrangeiros isso se deve a arrecadação de nossas comédias. E não são aquelas de humor cabeça que passam anos em produção para depois ficar uma semana em cartaz ou que apenas gastam incentivos do governo para massagear o ego de seus realizadores. O que dá dinheiro são aquelas bem populares com jeito de episódio de seriado com duração acima da média. Neste subgrupo se encaixam também as adaptações teatrais, textos que fizeram sucesso nos palcos e buscam ampliar seu público chegando a lugares onde as peças não teriam condições de serem apresentadas. A Partilha e Trair e Coçar é Só Começar conseguiram resultados satisfatórios em termos de repercussão popular em meio a tantas outras tentativas fracassadas como Fica Comigo Esta Noite e Irma Vap – O Retorno. Como lidar com a tentação de lucrar alguns trocados com projetos simples e de cronograma curto, ainda mais com o benefício de uma publicidade extra de uma boa carreira no teatro? Minha Mãe é Uma Peça teve um lançamento sustentado pelo marketing de que mais de um milhão de espectadores assistiram ao espetáculo durante os seis anos em que foi encenado por todo o Brasil. 

A razão do sucesso atende pelo nome de Paulo Gustavo, comediante que despontou na mídia feito foguete basicamente se destacando no teatro e participando de seriados e programas de canais fechados. Embora pertencentes ao grupo Globo, o ator tinha raras aparições no canal aberto, o que reduz consideravelmente o alcance de público. Bastou participar do filme Divã para o astro ter sua agenda lotada tornando-se rapidamente um símbolo máximo da comédia brasileira, um rosto tão conhecido quanto de Fábio Porchat, Bruno Mazzeo ou Marcelo Adnet, todos coincidentemente bombando na época nos cinemas com produções de humor rasteiro e clichê tão similares que fica até difícil saber quem protagonizou o quê. Paulo se destacou por ir na contramão dos colegas que se dedicavam a personagens estereotipados. Embora ao máximo caricata a primeira vista, sua criação mais famosa é dotada de alma e de verdade, gente como a gente. Completamente a vontade no papel de dona Hermínia, uma tagarela e estabanada dona de casa, o ator se inspirou em sua própria mãe para criá-la e, tal qual no teatro, o roteiro basicamente narra episódios embaraçosos e outros emocionantes que se misturam a situações vividas pelo próprio ator e dona Déa Lúcia. Antes dos créditos finais a homenageada surge em um vídeo caseiro de menos de dois minutos, mas o suficiente para comprovarmos que a dona Hermínia existe e como ela devem existir muitas outras. 


Com direção de André Pellenz, estreando como diretor de longas-metragens, o filme tecnicamente não traz nada de novo. Com propaganda maciça meses antes da estreia, já era de se esperar que a obra seria semelhantes a tantas outras lançadas ou apoiadas pelo braço cinematográfico da Globo. Com estética de novela, com cenários e figurinos multicoloridos e ritmo ágil, hoje é um daqueles títulos reprisados a exaustão e que qualquer cinco minutos assistidos, seja do início, do meio ou do fim, garantirão deliciosas gargalhadas. Originalmente um monólogo, a comédia precisou de uma grande recauchutagem para chegar aos cinemas, assim os personagens coadjuvantes que antes eram apenas citados e imaginados pelo espectador ganharam vida, ou melhor, carne e osso visto que eles têm pouca sustância emocional a oferecer. Psicológica então nem pensar. Todos parecem objetos que gravitam em torno da protagonista. Divorciada do marido Carlos Alberto (Herson Capri), que a trocou por Soraia (Ingrid Guimarães), uma companheira mais nova e pretensiosamente refinada, esta mulher sem papas na língua vive em um pequeno apartamento em Niterói, no Rio de Janeiro, que deve ser ainda menor para seus filhos já que ela parece estar de olhos e ouvidos atentos em todos os cômodos. Já bem grandinhos, Juliano (Rodrigo Pandolfo) e Marcelina (Mariana Xavier) sentem-se sufocados com sua onipresença e invasão de privacidade e certo dia comentam entre eles que preferiam ir viver com o pai e a madrasta e falam cobras e lagartos da mãe. Não por acaso ela escuta tudo e toma uma decisão radical.

Hermínia vai escondida passar uns dias na casa de sua tia Zélia (Suely Franco) para ver quanto tempo os filhos sobreviveriam sem ela, principalmente sem a comidinha da mamãe. Durante as férias forçadas, ela passa as horas recordando momentos de sua vida em família para tentar descobrir onde foi que errou e diversos flashbacks passam a intercalar a narrativa. Marcelina é alvo da mãe por conta de seu peso avantajado, mas os comentários que poderiam soar como ofensivos tornam-se divertidíssimos na boca da protagonista. O preconceito passa longe, até porque a garota é super descolada. Já o problema de Juliano é por conta de sua sexualidade. Ele é um gay não assumido, mas desde pequeno dava sinais sobre sua preferência. O homossexualismo também é tratado com respeito, mas sem perder a piada. A irmã parece aceitar naturalmente a opção do rapaz enquanto a mãe tenta abordar indiretamente o assunto refletindo o medo de que ele assuma algo que no fundo ela já sabe. Existe ainda um terceiro filho, Garib (Bruno Bebianno) que se casou e se mandou para Brasília, mas sua participação é insignificante. Embora seja o primogênito, os flashbacks ignoram qualquer tipo de conflito que tenha tido com a mãe, só fica no ar que ela tem ciúmes da nora sem uma grande justificativa, apenas o fato que a moça o fez largar a barra de sua saia.


 O perfil de Hermínia é simples e sensacional. Apesar do visual datado como o de uma dona de casa da década de 1950, a personagem é dotada de características universais. Seja onde for ou independente de estar nos cinemas, nos palcos ou na TV, certamente não há de faltar quem se identifique com essa mãe ou com seus conflitos. À sua maneira ela interage com todos os personagens que pouco tempo tem para se expressar já que ela fala sem parar e faz questão de perpetuar moralismos, assim sua língua está sempre afiada para tecer críticas. O que poderia ser caricatural, um homem mal maquiado, com cabelos desgrenhados e roupas acinturadas se passando por uma mulher, soa perfeitamente natural. Com roteiro do próprio Paulo em parceria com Fil Braz, Minha Mãe é Uma Peça, no geral, parece uma compilação de esquetes cômicos que podem ser compreendidos de forma independente. O drama da mãe que descobre a ingratidão dos filhos é apenas uma desculpa para amarrar quadros que fariam sucesso na TV, todos conseguindo preservar a essência do texto original, incluindo a criação dos personagens coadjuvantes extremamente estereotipados que parecem oriundos das coxias teatrais.

Comédia - 85 min - 2012

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Um comentário:

Silvia Freitas disse...

Assisti sem compromisso e acabei rindo muito com esse filme. Ótima comédia nacional.