domingo, 10 de outubro de 2021

LOUCOS DE AMOR (2005)


Nota 6 Protagonizado por casal de autistas, filme poderia ter situações mais bem exploradas


Se as relações amorosas entre pessoas totalmente sadias já são complicadas imagine como deve ser para um autista viver tais experiências. É esse ponto de vista que salva a comédia romântica Loucos de Amor da mesmice. O roteiro de Ron Bass, vencedor do Oscar por Rain Man, é baseado na história verídica de Mary e Jerry Newport, narrada num artigo publicado pelo Los Angeles Times. A trama começa nos apresentando à Donald Morton (Josh Harnett), um jovem motorista de táxi que é aparentemente sem noção e azarado. Muito tagarela, ele se distrai facilmente e constantemente bate o carro, assim ele já passou por praticamente todas as empresas de táxi de sua cidade, mas ele não é um bobalhão, pelo contrário, é muito inteligente e tem uma espantosa habilidade para lidar com números e se comunicar com pássaros. Ele sofre da Síndrome de Asperger, um problema relacionado ao autismo, mas que se diferencia pelas dificuldades de interação social e apreço por rotinas. 

Sentindo-se um estranho no mundo, o jovem só fica a vontade quando está junto de outras pessoas com perturbações semelhantes, assim frequenta rotineiramente um grupo de apoio a deficientes e nele conhece Isabelle Sorenson (Radha Mitchell), uma moça que desde criança procura lidar com seus problemas de maneira positiva, vendo com bons olhos até mesmo o fato de muitos homens a terem assediado quando era adolescente, assim ela se sentia importante para alguém. A primeira conversa dos jovens é literalmente coisa de doido, mas por fim acabam se acertando, afinal de contas nenhum deles sabia como se comportar em um primeiro encontro, ainda mais quando fica no ar um clima de romance. O problema é que ela é feliz, consciente de suas limitações e muita agitada enquanto ele é mais fechado, metódico e não lida bem com sua síndrome. Em comum, são amantes dos bichos e compactuam em tentar viver esse amor, mas para isso um deles terá que ceder ao estilo de vida do companheiro ou terão que achar o equilíbrio entre a alegria exagerada de um e a melancolia inquietante do outro.


O diretor Peter Naess, indicado ao Oscar de filme estrangeiro por Elling, demonstra boa vontade para construir um tipo de história de amor que não vemos com frequência no cinema e quando ela dá as caras é repleta de momentos histriônicos ou sentimentais ao extremo, proporcionando a chance de seus intérpretes surpreenderem e concorrer a prêmios, afinal os críticos adoram personagens problemáticos que exigem despudor e mínimo de vaidade dos atores. Talvez por isso mesmo é que sentimos que esta comédia romântica não chega a atingir seu clímax e não consiga emocionar totalmente. Há uma inversão de expectativas. Quando se fala em autismo logo nos vem a cabeça a preconceituosa imagem de pessoas com rostos de traços característicos, andar melancólico e falas balbuciantes e desconexas, mas o problema dos protagonistas neste caso poderia passar despercebido caso o diretor não se preocupasse em inserir diversas cenas de seus cotidianos aparentemente aleatórias, contudo, essenciais. 

Ficamos mais íntimos do universo particular compartilhado pelos protagonistas acompanhando seus diálogos com outros deficientes ou a visita do casal ao parque de diversões, descobrindo qual o modelo de casa que almejam ter ou até mesmo nos divertindo com eles passeando pelas ruas fantasiados, ela de Mozart e ele de baleia (passagem que justifica o título original "Mozart and the Whale"). Todas sequências servem para avaliarmos qual o grau de dificuldade que a Síndrome de Asperger lhes impõem para um convívio harmonioso com a sociedade e até mesmo para levarem uma vida a dois. Apesar dos momentos de devaneios, no fundo eles vivem dilemas iguais a pessoas comuns. Sentem vergonha, querem amar, desejam ser respeitados e alternam momentos de alegria, tristeza e raiva. Contudo, a fixação por padrões e rotinas acaba deixando a busca pela independência um tanto mais difícil. 


O perfil de Isabelle camufla um pouco suas imperfeições justamente porque ela aprendeu desce cedo a lidar com as desvantagens da síndrome, mas para Donald, que cresceu obcecado pelo desejo de ser visto como uma pessoa completamente normal, tudo é mais complicado, algo que fica explícito quando ele decide levar seu patrão para jantar em sua casa e pede, gentilmente, para que sua namorada se esforce para se comportar. É aí que surge a grande briga do casal por um motivo bastante comum em qualquer relacionamento: as dificuldades em aceitar e respeitar como o outro é para depois exigir o mesmo para si. Apesar da rusga, obviamente o final feliz está garantido em Loucos de Amor. Título esquecido infelizmente, vale uma garimpada pelo simples fato dos protagonistas fugirem completamente do estilo fútil dos casaizinhos de comédias românticas convencionais, mais preocupados com aparências que sentimentos.

Comédia romântica - 94 min - 2005 

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