quarta-feira, 30 de setembro de 2015

JAMES E O PÊSSEGO GIGANTE

NOTA 8,0

Bizarrices e estilo tradicional
de contos infantis se unem
para contar a história de um
garoto em busca de um sonho
Quando falamos em animação em stop-motion logo nos lembramos dos famosos A Noiva Cadáver e A Fuga das Galinhas, mas poucos se recordam de James e o Pêssego Gigante, uma bela animação utilizando esta antiga e eficiente técnica. Com pouco menos de uma hora e meia de duração, este é um filme compacto e eficiente no qual parece tudo estar em seu devido lugar e livre de excessos. Antes mesmo da estreia a Walt Disney já considerava a obra como um novo Toy Story, um novo marco na História da animação e do próprio estúdio. Lançado cerca de um ano depois da aventura dos brinquedos falantes, a obra era aguardada com ansiedade pelos executivos da empresa, mas acabaram se decepcionando com os resultados. Fracasso nas bilheterias, o longa não recuperou sua saúde financeira e prestígio nem mesmo com as vendas de fitas VHS e DVDs. Bem, realmente é difícil dispensar a atenção com um produto como este quando os desenhos computadorizados com seus personagens cheios de energia e piadas na ponta da língua tomam conta do mercado. Mas sempre é tempo de corrigir as injustiças. Obviamente não há como comentar este desenho sem tocar no título O Estranho Mundo de Jack, lançado em 1993 e que também utiliza a técnica de animação de bonecos de massinha para contar uma história tão fantasiosa quanto a de James. Erroneamente ambas as animações são creditadas ao diretor Tim Burton, mas na verdade ele é o produtor delas. A direção dos dois longas é de um de seus pupilos, Henry Selick, o mesmo que anos mais tarde realizaria Coraline e o Mundo Secreto. A junção destes dois nomes por trás de um filme é um tanto interessante. Um entrou com sua dose de bizarrice usual para ser adicionada ao espírito de clássico infantil que o outro cineasta almejava. O resultado é bem satisfatório. Baseado no livro homônimo publicado em 1961 por Roald Dahl, o mesmo autor que escreveu a história que deu origem ao filme Matilda entre tantas outras que se tornaram clássicos infantis, a trama neste caso foi suavizada para se encaixar no perfil das produções Disney, mas não perdeu o sentido e tampouco o encantamento, mantendo os elementos extraordinários e deliciosos imprescindíveis a qualquer fábula infantil.

O longa começa e termina como live action, ou seja, com atores em cenas, mas praticamente vemos o tempo todo uma animação de primeira e bastante colorida, embora muitos considerem a história um tanto triste e perversa para crianças. A trama roteirizada por Karey Kirkpatrick, Jonathan Roberts e Steve Bloom começa nos apresentando ao pequeno James (Paul Terry), um garoto inglês que sonha em conhecer Nova York. Após ficar órfão, ele acaba indo viver com suas malvadas tias Spiker (Joanna Lumley) e Sponge (Miriam Margolyes). Sua tristeza só é aliviada quando um velho senhor (Pete Postlethwaite) lhe entrega um saco cheio de línguas de crocodilos e algumas delas acabam caindo próximo a uma árvore. Não demora muito e em um dos galhos um pêssego desponta e aos poucos vai adquirindo proporções gigantescas. Enquanto as tias pensam em lucrar com essa novidade, o garoto encontra outro motivo para apreciar o fruto. Ele decide explorar seu interior e então a técnica stop-motion toma conta do filme. É nesse mundo a parte que James faz amizade com uma centopéia, uma aranha, uma joaninha, um grilo, uma minhoca e um vaga-lume e todos eles o acompanharão na realização de seu sonho: chegar a cidade onde tudo se realiza e que era o último desejo que idealizou junto com os pais. O uso de pequenas canções intermediando a narrativa e o perfil engraçadinho dos personagens são marcas registradas dos trabalhos Disney, mas quando estão em cena os atores de verdade a trama perde um pouco de ritmo por causa dos momentos pouco inspirados proporcionados, mas nada que atrapalhe o conjunto, até porque tais sequências duram poucos minutos deixando o brilho e a criatividade de tudo por conta do velho e tradicional stop-motion. A conclusão mistura a realidade com um pouco de animação, deixando ainda no ar o clima fantasioso que acompanhou a obra desde o início.

É importante notar que os animais que fazem amizade com o protagonista geralmente são repudiados pelos humanos, mas na história se apresentam tão cativantes que é impossível que alguém na hora se lembre que quando um deles aparece em casa certamente não escapará de uma chinelada. Só por aí já fica evidenciado o que deve ter encantado o diretor e o produtor na história de Dahl. Burton adora destacar os excluídos na vida real e Selick encontrou uma forma diferenciada para apresentar bichinhos em seu trabalho, fugindo dos batidos passarinhos e roedores sorridentes e cantarolantes que a Disney tanto aprecia. Aliás, tanto o filme de James quanto o de Jack são distribuídos pela empresa do Mickey Mouse, assim é um tanto antagônico ver um trabalho com as marcas registradas de um cineasta que tem apreço pela desconstrução de estereótipos figurar em um catálogo repleto de criações clichês e que seguem uma mesma cartilha (até então as coisas funcionavam basicamente assim na Disneylândia cinematográfica). Mesmo tantos anos após seu lançamento, a história de James e o Pêssego Gigante continua fascinante assim como seu visual com um colorido tão vibrante e cenários tão marcantes que por vezes deixam no chinelo algumas produções milimetricamente criadas em computador. Para as novas gerações, como dito antes, talvez seja difícil embarcar em tal narrativa por justamente estarem acostumadas a adrenalina, piadas de duplo sentido e aos personagens hiperativos que tanto fascinam crianças e adultos nas animações metidas a moderninhas. Talvez os desenhistas e animadores contemporâneos devessem olhar um pouco para o passado não só em busca de elementos para que possam tirar sarro de contos clássicos ou desenhos antigos, mas também para reaprenderem o que é fantasia. A busca por tanta perfeição nos cenários e personagens acaba tirando o sentido onírico do desenho e sua real função. Se queremos algo perfeito e realista, melhor assistir um live action. O conto de James e seu fruto gigantesco é uma ótima pedida para fugirmos da mesmice e nos servimos de um leque de opções para sonhar. 

Animação - 79 min - 1996 

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Um comentário:

Ramon Pinillos Prates disse...

Esse aí Burton só produziu, mas Jack a história e os personagens são deles. Tenho o dvd e realmente é bem legal mesmo. Só vi recentemente.