quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

ESCOLA DE IDIOTAS

NOTA 5,5

Apesar do título, longa tem um
bom argumento e narrativa
crítica até certo ponto,  mas na
reta final entrega-se aos clichês
Um título deveria teoricamente deixar claro qual a proposta de um filme, mas existem casos em que ele pode expressar mais de uma ideia, podendo colaborar ou atrapalhar a venda de um produto. Um bom exemplo é Escola de Idiotas que logo de cara deve passar a impressão de ser uma comédia típica para adolescentes, ou seja, recheada de baixarias, palavrões e escatologia, conceito reforçado quando tomamos conhecimento do elenco com um enganoso destaque para o nome de Ben Stiller que faz uma rápida participação no longa. Bem, quem espera realmente uma diversão que aposte em trash comedy (o que há de pior em termos de humor), deve se decepcionar, mas para quem não espera muito desta produção pode se surpreender levemente ao perceber que por trás do verniz de bobagens gratuitas existe uma mensagem bacana a ser levada ao público, interessando principalmente àqueles que se sentem um zero à esquerda. A sequência inicial é exagerada, mas certamente fisga a atenção dos espectadores, pois acerta em um ponto-chave: quem nunca se sentiu um completo idiota ao menos uma vez na vida? O problema é que para o jovem Roger (Jon Heder) tal sensação é contínua e já dura muitos anos. Ansioso e com baixa autoestima, ele não só é um fracassado na vida pessoal, morrendo de medo de dar um primeiro passo para começar um relacionamento amoroso com a vizinha Amanda (Jacinda Barrett), como também não se dá bem no campo profissional, chegando a perder até seu uniforme de guarda de trânsito para uma dupla de criminosos gaiatos. Sua chance de mudar de vida pode ser um curso diferente de tudo o que ele já ouviu falar. Ele e uma penca de outros fracassados numa tentativa desesperada se submetem aos ensinamentos nada didáticos do grosseirão e sarcástico Dr. P (Billy Bob Thornton) que promete transformá-los em verdadeiros vencedores, porém, ele é um tremendo picareta que na verdade provoca seus alunos até a última gota de paciência. Contudo, esse tratamento de choque ministrado com a ajuda do fiel ajudante do professor, o grandalhão Lesher (Michael Clarke Duncan), tem fundamentos e o objetivo de mostrar que uma pessoa só pode ser feliz se sair do lugar e lutar pelo que deseja, mas é óbvio que nem todos se saem bem no curso. Um detalhe é que somente homens existem matriculados, talvez uma constatação da máxima que diz que as mulheres são o sexo forte.

Apesar de todas as dificuldades, Roger surpreende com o seu desempenho no curso despertando a atenção do Dr. P que por sua vez ao invés de continuar ajudando o rapaz, passa a atrapalhá-lo. Sim, o cara durão de uma hora para a outra torna-se rival do próprio aluno. Quando se sente mais seguro para se aproximar de Amanda, Roger descobre que seu mentor também parece interessado na moça, mas não desiste e resolve brigar pelo seu amor. Ele deixa de lado os bilhetinhos com as regras machistas de como conquistar uma mulher que recebeu do professor e parte para o ataque culminando numa previsível, mas divertida sequência em que os rivais formam dupla em um jogo de tênis, mas cada um joga por si visando chamar a atenção de Amanda nesse duelo onde a timidez e a juventude de um rivalizava com a lábia e a experiência de vida do outro. Vendo por esse lado, pode-se dizer que este trabalho é uma paródia das comédias românticas tradicionais, mas é errado resumi-lo a este rótulo. Criticar a sociedade é o foco do roteiro de Todd Phillips (também diretor) e Scot Armstrong, dupla de autores de Starsky e Hutch e Dias Incríveis. Faz parte da cultura americana, e como tudo que vem de lá pega em qualquer parte do mundo, a exclusão natural daqueles que são chamados de losers, em bom português os perdedores, pessoas cujo valor é medido, por exemplo, pelo aspecto físico pouco chamativo ou fora dos padrões de beleza, estilo e personalidade acanhados ou talento para se meter em confusões ou ser influenciado. Pelo fato do protagonista ser um reflexo estereotipado dos excluídos da sociedade ideal, sem mencionar a palavra bullying, na época ainda um termo pouco popular, o longa consegue a simpatia de boa parte do público que deve se entusiasmar com os primeiros quarenta minutos de projeção, mas não se deixa cegar e percebe que daí para frente a trama recorre a muitos clichês e a ironia cai em desuso. Eis que surge Stiller para tentar acordar a audiência, mas sua participação rápida só não é totalmente desprezível porque o destino de seu personagem, também submetido as aulas do Dr. P,  ajuda nos momentos finais. Aliás, a conclusão é o calcanhar de Aquiles da produção. Além de tentar fazer um mistério a respeito do real caráter do personagem de Thornton, aqueles velhos clichês de comédias a la sessão da tarde estão presentes. Muito corre-corre, explicações em off sobre o destino dos companheiros de sala de aula de Roger e final feliz para ele ao lado de sua amada (alguém duvidava?), com direito ao manjado truque do restam poucos minutos para o avião partir, é agora ou nunca.

Inspirado em uma comédia britânica da década de 1960 inédita no Brasil, há quem enxergue nesta produção que por trás da mensagem de que todos podem vencer na vida há também um lado maledicente na trama, ou melhor, na forma como Phillips conduz sua câmera e até mesmo na escolha do protagonista. Heder, na época bombando nas bilheterias americanas com Escorregando Para a Glória (ok, Will Ferrell era o chamariz da fita, mas o jovem estava lá dividindo os créditos principais), sem dúvidas é um bom comediante e o tipo perfeito para viver o tal personagem loser. Ele não tem beleza física, tampouco porte atlético, mas seu rosto cede toda a ingenuidade e carisma necessários para crermos que Roger é real e nos envolvermos com seu drama de sentir raiva de si mesmo por permitir que os outros o humilhem ou se aproveitem dele, principalmente aqueles que logo num primeiro momento se apresentam com certa altivez, atrevimento ou falta de educação. Seu conflito interno infelizmente é uma realidade de muitas pessoas e certamente tem raízes em sua infância, aquele típico caso da criança que se sente um peixe fora d’água na escola e logo vira alvo de chacota dos outros, sendo solicitada somente quando precisam de ajuda para alguma tarefa e o diminuído, por sua vez, aceita fazer qualquer negócio para evitar encrencas ou ingenuamente por acreditar que dessa forma estaria sendo aceito no grupo. Tal situação é equivalente a já citada cena do roubo do uniforme que abre esta comédia. Ironicamente, Roger tem uma profissão que na teoria deveria impor respeito e embora ele tente fazer seu serviço dignamente acaba se sentindo acuado e entrega suas roupas para evitar brigas. A fragilidade do rapaz, usada para efeitos de humor, todavia, colabora para que o espectador que se identifica com seus problemas vibre de emoção no momento em que ele passa a enfrentar seus medos. Justificada a escolha do ator, voltamos ao problema da condução do filme por parte de Phillips que adota o estilo da comédia do constrangimento, algo em alta na Hollywood da década de 2000. Podemos dizer que Escola de Idiotas se enquadra no subgênero das comédias para público masculino de meia-idade que já rendeu produtos como O Virgem de 40 Anos, Se Beber Não Case, Passe Livre e tantos outros que trabalham com a ambiguidade: ao mesmo tempo que suas narrativas levam mensagens positivas para aqueles que estão estagnados por acreditarem que não há mais tempo para mudar os rumos de suas vidas, em termos visuais seus trabalhos de câmera tratam de ridicularizar seus personagens captando com riqueza de detalhes situações constrangedoras vividas por eles e até mesmo destacando os pontos fracos de seus físicos e personalidades, não é a toa que os amigos “babacas” de Roger são estereotipados. De qualquer maneira, esta comédia não é o lixo que seu título vende, ainda que ele também sirva para destacar a ideia principal da obra. Seja como puro divertimento ou para conferir a mensagem beneficente implícita, vale uma conferida.

Comédia - 107 min - 2006

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