segunda-feira, 31 de agosto de 2020

DIANA


Nota 4 Cinebiografia engessada de importante figura do século 20 não faz jus à sua memória


Desde seu falecimento em um trágico acidente de carro em 31 de agosto de 1997, muito especulou-se sobre uma cinebiografia a respeito da princesa Diana Spencer, mais conhecida com Lady Di. Demorou, mas ela foi realizada, porém, deixou muito a desejar. Quem esperava acompanhar a trajetória da mulher simples que chamou a atenção de um membro da realeza britânica, mas afrontou as regras de comportamento impostas à sua posição em prol de sua própria felicidade, se decepciona com o que é oferecido no drama Diana. O diretor alemão Oliver Hirschbiegel optou por retratar os dois últimos anos de vida da princesa com foco em seus relacionamentos amorosos. Muitos acreditam que o empresário Dodi Fayed, que veio a falecer no mesmo acidente, havia sido seu único namorado após a separação do príncipe Charles, mas na verdade houve um outro homem, aquele que seria o verdadeiro amor desta mulher que por trás dos sorrisos em público deixava sempre escapar um semblante de tristeza. Ao longo de todo o filme, o cineasta quis passar a sensação que a chamada Princesa do Povo estava sempre sob a pressão de lentes, flashs e holofotes e quando finalmente resolveu se dar o direito de ser feliz teve sua privacidade escancarada e suas tentativas de desmentir boatos culminaram em uma sucessão de erros que só lhe trouxeram ainda mais frustrações. 

Naomi Watts assumiu a dura missão de protagonizar o filme que começa em Paris poucas horas antes do fatídico acidente. A câmera segue de perto a personagem por alguns minutos dentro de um quarto de hotel, mas demora a revelar o seu rosto e quando o faz distancia o foco, emulando o estilo invasivo dos paparazzi. É o bastante para dar a tônica do filme. Após a apresentação daquela que seria a última imagem da princesa em vida, o filme volta para o ano de 1995 quando estava recém-separada, ainda não oficialmente, e se adaptando a viver sozinha em um palácio afastada da família e dos próprios filhos. Quando o marido de uma de suas poucas amigas sofre um infarto, no hospital ela conhece e se encanta pelo Dr. Hasnat Khan (Naveen Andrews), um emigrante paquistanês que foi morar na Inglaterra para concluir seus estudos. Eles acabam iniciando um romance secreto que só era possível por meio de disfarces e encontros nas madrugadas. A queixa maior era por parte dele que temia que o namoro viesse à público e prejudicasse seu trabalho. Como o próprio dizia, não poderia operar alguém com paparazzi em cima dele. Diana gostava do modo simplório, sem segundas intenções, com que o médico a tratava, como se não soubesse que ela era uma princesa, gabava-se. Todavia, não demorou muito para que a notícia do namoro estampasse as páginas de tabloides, ocupasse espaço nos noticiários da TV e fomentasse a primeira crise do casal. Khan não estava preparado para a notoriedade que um envolvimento como esse poderia lhe proporcionar. Ao contrário dela, ele nem desejava ter a obrigação de aprender a lidar com o assédio da imprensa. 


Havia ainda os costumes familiares e religiosos do companheiro, outro empecilho para a união. Diana chegou a viajar sozinha para conhecer a família dele e não chamar a atenção da mídia e, mesmo sendo reprovada por sua mãe, Khan decide apostar tudo no sucesso desta paixão. Todavia, o que se vê na tela não parece um romance entre duas pessoas maduras e sim encontros e desencontros tipicamente juvenis, o que tira bastante o caráter realístico do filme. A cinebiografia então reduz a ex-princesa a uma mulher desesperada por um relacionamento, afinal de contas qual mulher em sua posição aceitaria fazer a limpeza do apartamento do companheiro como forma de demonstrar seus sentimentos? Assim, a mulher que já foi símbolo mundial de coragem e emancipação acaba retratada como alguém praticamente sem amor próprio, rastejando por migalhas de atenção. Seus papéis como mãe e de mulher dedicada à filantropia são exibidos com uma incômoda timidez, assim como suas relações com a Família Real Britânica. Todavia, o roteiro de Stephen Jeffreys, adaptando o livro "Diana – O Último Amor de Uma Princesa", de Kate Snell, parece ter tido receio de apresentar alguma falha na personalidade ou defeito da homenageada. Perfeitinha demais, ela mantém certo distanciamento do público, não causando comoção nem diante de seus ímpetos de fazer caridade e até as cenas de intimidade com o namorado são abrandadas para não arruinar sua imagem. Diane e Khan acabam se transformando em pessoas desinteressantes, peças a serviço de uma trama que manipula os fatos a seu bem querer. 

Há uma barreira que nos impede de invadir a intimidade do casal que deveria ser o grande atrativo da obra, afinal a figura pública da homenageada, correta e elegante, continua viva na memória até mesmo para aqueles que não acompanharam sua breve trajetória de vida. Basta ver uma foto sua e temos estampada sua essência fora de casa. Não à toa o longa foi rechaçado em peso pela crítica mundial. O campo das cinebiografias é bastante sedutor por se tratarem de obras já com público interessado mesmo antes do lançamento, mas também é bastante perigoso visto que a maioria dos títulos desta seara joga todas as responsabilidades nas costas do elenco e da equipe de caracterização, como se o sucesso destas produções dependessem apenas do espectador conseguir enxergar em cena os homenageados. Diana parece ter tido o aval de sua produção apenas quando Watts topou o desafio. Além da extrema semelhança física, a atriz conseguiu captar alguns trejeitos peculiares da princesa de Gales, como a mania de abaixar um pouco a cabeça para olhar ao interlocutor de baixo para cima, transmitindo a sensação de estar analisando a pessoa com quem está conversando e ao mesmo tempo um sinal de humildade de sua parte. Pena que uma performance tão estruturada seja em prol de um trabalho preguiçoso que não faz jus a memória de uma figura tão emblemática do século 20. 


Hirschbiegel, que ficou conhecido coincidentemente por outra cinebiografia, A Queda – As Últimas Horas de Hitler, erra a mão ao retratar uma personagem tão cheia de camadas e frustrações atendo-se apenas ao viés de sua vida amorosa. Arrastada, sua relação com o médico ganha ares novelescos, até por se basear em boatos nunca confirmados pelo rapaz, e é prejudicada pela falta de química entre os intérpretes. Diante disso, para piorar, o próprio desenvolvimento do enredo tenta relacionar a morte da personagem-título com o fracasso dessa relação, uma decisão que soa maniqueísta e limitadora. Antes do final trágico dela, a separação ainda culmina em uma comprometedora entrevista para a TV na qual ela fala abertamente sobre seus casos amoroso ao sabor do jornalismo sensacionalista. Diana tinha traquejo para lidar com a imprensa, mas o longa extrapola sua capacidade mostrando como ela manipulava as notícias a seu respeito, não raramente se colocando como vítima das situações, como na cena em que retratam a famosa imagem da ex-princesa no iate de Dodi Fayed, solitária no trampolim, ganhando no filme outra conotação como se ela estivesse presa e nas mãos de um vilão. A Diana retratada soa como uma personagem fictícia, bem distante da realidade, praticamente a imagem de uma princesa de conto de fadas que acabou por substituir a mulher de verdade.

Drama - 108 min - 2013

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