quinta-feira, 19 de maio de 2016

CHUMBO GROSSO

NOTA 7,0

Longa faz sátira aos filmes de
ação apostando em uma mescla
de gêneros, personagens
caricatos e edição diferenciada
Houve um tempo em que parodiar filmes de sucesso era uma fórmula mágica de Hollywood, mas tudo que é demais cansa e hoje parece que estamos estagnados neste subgênero, sendo que vira e mexe surge alguma produção caça-níquel para ganhar alguns trocados em cima da publicidade de outros títulos de destaque da época. Foi assim com Espartalhões, Super-Herói – O Filme, Os Vampiros que se Mordam e Inatividade Paranormal, lembrando é claro que nunca é descartada a hipótese de um novo produto da série Todo Mundo em Pânico. Entre tanto lixo que rapidamente cai no gosto popular e com a mesma rapidez é esquecido, infelizmente razoáveis trabalhos como Chumbo Grosso acabam passando despercebidos. Esta produção não tem o objetivo de reunir o maior número possível de piadas previsíveis sobre meia dúzia de sucessos do cinema, mas sim satirizar um gênero específico como um todo: os longas de ação, passando obviamente por alguns clichês das obras de suspense e policiais. Escrito por Edgar Wright e Simon Pegg, que atuam também respectivamente como diretor e astro da fita, a obra reúne mais uma vez a dupla responsável pelo divertido e criativo Todo Mundo Quase Morto, uma paródia aos longas de zumbis, mas infelizmente nesta segunda parceria o resultado final não chega ao mesmo nível de sucesso, não só em termos de repercussão, mas também a narrativa deixa um pouco a desejar apesar da ótima premissa. Ou melhor, deixa a desejar para quem está acostumado a histórias com estruturas extremamente rígidas, mas para quem é aberto a novidades este aqui é um prato cheio, uma salada e tanto de referências, críticas, ironias e parte técnica pouco usual como edição de cenas ultra-rápidas e efeitos sonoros que funcionam como gags. Nicholas Angel (Pegg) é um policial que se dedica muito a profissão e é considerado o melhor da corporação de Londres, mas sua dedicação e reconhecimento é tanto que acaba gerando inveja e revolta entre os seus colegas de trabalho que se sentem diminuídos e sem chance de superá-lo. Para evitar grandes problemas, seus superiores decidem transferi-lo para a pequena e pacata vila de Sandford considerado o lugar mais seguro da Inglaterra por vários anos consecutivos. Para se ter uma ideia, nenhum assassinato é registrado por lá a cerca de duas décadas. O objetivo da mudança faz todo sentido. Com poucos crimes e a maioria um tanto banais, Angel não teria a possibilidade de mostrar todo o seu potencial e aos poucos acabaria alcançando o mesmo nível de excelência que a maioria dos policiais ingleses, assim evitando rusgas entre os membros da corporação que poderiam acabar com a imagem respeitável da polícia. Já para o esforçado rapaz a situação é um tanto incômoda afinal ele estará trocando as batidas de trânsito e os roubos de carros pela fiscalização de estradas quase desertas e o desaparecimento de animais de estimação.

Quando chega ao pequeno vilarejo, Angel rapidamente fica conhecendo boa parte da população e logo de cara já se estranha com seu novo parceiro de trabalho. Danny (Nick Frost), um rapaz curioso, inocente e fanático por filmes de ação americanos. Não é a toa a profissão que escolheu, embora não demonstre ter talento para isso. Em Sandford tudo é muito tranquilo e todos parecem amigáveis e solidários, mas não demora muito para que acontecimentos estranhos passem a acontecer. Misteriosos assassinatos e violentos acidentes chamam a atenção de Angel, mas parece que apenas ele se preocupa com os fatos. Seu instinto de policial é acionando e o novato na área passa a investigar por conta própria os crimes, contrariando as ordens do chefe da polícia local, Frank Butterman (Jim Broadbent), o pai de Danny. Como a ideia é parodiar os longas de ação e afins é previsível o que acontece deste ponto em diante. Conforme novas pistas vão sendo encontradas Angel descobre que os moradores da vila escondem suas verdadeiras personalidades, mas ele não pode contar nem mesmo com a ajuda de seu parceiro. Geralmente os filmes com duplas de agentes e atividades do tipo trabalham com a questão do contraponto e aqui não é diferente, só que de forma um tantinho mais exagerada para causar efeitos de humor, inclusive em termos visuais. Enquanto Angel é seguro, perspicaz, inteligente, astuto e de corpo esguio, Danny é inseguro, fala bobagens o tempo todo, come doces e bebe cerveja a vontade para manter suas formas ligeiramente roliças e não se cansa de citar o filme Bad Boys 2 sempre que julga necessário para justificar ou complementar suas ideias tolas. Aliás, se o longa é vendido como uma comédia, o humor de mais fácil identificação é praticado justamente pelo personagem de Frost que serve como alívio cômico para as cenas mais pesadas, conseguindo resultados bem superiores do que quando um longa de ação tenta forçar a barra colocando frases engraçadinhas em momentos inapropriados. Danny passa longe de ser o estereótipo de um imbecil, simplesmente ele é um sonhador, um adulto que não amadureceu totalmente, muito por conta da vila privilegiada onde foi criado. Sendo assim, não é de se estranhar que volta e meia ele está arreliando a paciência de Angel com perguntas que ao mesmo tempo em que são engraçadas fazem referências a título de sucesso do gênero ação e mistérios. Coisas do tipo se existe realmente um ponto da cabeça que se você atirar ela explode completamente ou se é possível manejar duas armas ao mesmo tempo enquanto salta no ar são algumas pérolas que o rapaz solta. A resposta do policial condecorado é curta e grossa: isso são coisas de cinema, não de vida real. Será mesmo?

Um ponto interessante da narrativa é que o bucolismo de Standford não se torna um mistério com o qual o espectador precisa ficar atento aos detalhes para desvendar. Rapidamente Wright revela que existe um serial killer muito criativo agindo na área. Já fica o aviso de quem não gosta de sangue e violência não deve se animar por este produto ser rotulado como uma comédia, pois o diretor não teve pudores para colocar algumas sequências atípicas para o gênero e mesmo quando elas soam sem lógica no fundo elas estão presentes para simplesmente reforçar o principal objetivo da obra que é fazer uma crítica bem humorada a mesmice que toma conta das produções hollywoodianas. Aliás, o exagero e o bizarro são marcas deste trabalho, o que pode justificar sua repercussão modesta. No Brasil o longa foi lançado diretamente em DVD após algumas mudanças de data, como se a própria distribuidora Universal não confiasse neste produto, no entanto, entre os cinéfilos o filme acabou se tornando uma pequena jóia que pode não ser perfeita, mas tem qualidades relevantes. Corajoso, esse pode ser um dos adjetivos que este trabalho merece. Fazer humor sem apelar para caracterizações e situações constrangedoras é bem difícil, mas neste caso as piadas são sutilmente espalhadas ao longo da narrativa, exigindo muita atenção de quem assiste. Não é difícil que algumas piadas acabem passando despercebidas. Fora isso, misturar tantos gêneros também poderia resultar em uma verdadeira bomba, mas Wright soube dosar os elementos característicos de cada um a ponto de ficarmos na dúvida de classificarmos a obra em apenas duas categorias: comédia ou ação. Até uma homenagem ao famoso estilo do faroeste espaguete encontra uma brecha para participar desta produção no mínimo singular. O início já deixa claro que este não é um filme comum, mais um ponto que revela o seu caráter corajoso visto que pela introdução boa parte da audiência já sentiria a vontade de não seguir adiante. A conversa entre Angel e seus superiores a respeito de sua transferência é muito estranho, mas já prepara o espírito do espectador para o que vem a seguir. Personagens caricatos, diálogos aparentemente sem sentido e situações irreais dão a tônica da obra, tudo a favor de mostrar o protagonista como um peixe fora d’água em um lugar onde tudo é perfeito, o que chega a ser perturbador até para quem assiste. Embora a temática da cidade modelo já seja um clichê explorado até mesmo pelo outrora cultuado M. Night Shyamalan, este filme se segura com uma história bem amarrada na qual é possível se identificar com o conflito do protagonista. Sabendo de antemão que Standford não é tão segura e que os habitantes costumam colocar panos quentes nos crimes, ficamos na expectativa para que Angel consiga desmascarar a situação ou se Wright surpreenderia fazendo o personagem sucumbir ao sistema de farsa com o qual o vilarejo sobrevive. O que conta um pouco contra a obra é que ela é acima do normal para o gênero. Embora o último ato seja divertido e movimentado, as duas horas de Chumbo Grosso por vezes é um teste de paciência. Muita loucura para ser servida em dose tão cavalar.

Comédia - 120 min - 2007

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9 – 10 Excelente, praticamente perfeito do início ao fim
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