sexta-feira, 28 de agosto de 2020

QUANDO UM ESTRANHO CHAMA


Nota 2,5 Razoável argumento e cenografia enigmática são desperdiçados em trama monótona

Ficar sozinho dentro de uma casa desconhecida a noite e sentindo-se ameaçado pela presença de alguém que parece onipresente é um tema bastante comum no cinema e com resultados variados, não raramente com boas ideias sendo desperdiçadas. É justamente o que acontece no suspense Quando Um Estranho Chama no qual acompanhamos o pesadelo vivido por Jill (Camilla Belle), uma jovem estudante que como muitas outras ganha alguns trocados prestando serviços de babá para famílias ricas. Certa noite ela aceita a tarefa de cuidar do casal de filhos dos Mandraki, moradores de um luxuoso casarão de arquitetura moderna e protegido por avançados equipamentos de segurança, mas obviamente localizado no meio do nada e sem vizinhos por perto. O que poderia ser uma noitada tranquila, na qual a jovem já estava preparada para usufruir de luxos e conforto enquanto os pequenos dormiam, acaba virando pura tensão quando ela passa a receber estranhas ligações de um desconhecido. Inicialmente, ela pensa se tratar de trotes de amigos que naquele momento estavam em uma festa. Contudo, as coisas tomam rumos preocupantes quando a pessoa do outro lado da linha começa a dar indícios de que parece estar rondando a casa ou até mesmo estar dentro dela. Daí para frente já sabemos o que esperar. Diversos sustos previsíveis e tomadas construídas para dar a sensação do bandido estar observando a jovem, situação que renderia um bom curta-metragem, mas frágil demais para segurar um longa, embora a duração seja razoavelmente breve.

A trama é baseada em uma lenda urbana popular nos EUA já filmada em 1979 com o mesmo título (no Brasil, o lançamento em vídeo foi chamado de Mensageiro da Morte) que gerou inclusive uma continuação feita para a TV anos depois, Um Estranho à Minha Porta. Para a turma de gerações mais novas, o longa pode parecer uma versão estendida ou reinventada do prólogo de Pânico, dispensando a brincadeira do vilão em amedrontar a vítima com um questionário sobre filmes de terror. Sendo o argumento de conhecimento de todos, e mesmo para quem não viu o original a previsibilidade do enredo trata de situar qualquer um rapidamente, o roteirista Jake Wade Wall não perde muito tempo e logo parte para o que interessa. Em poucos minutos conhecemos o suficiente sobre a protagonista para compadecermos de seu futuro perrengue. O que o filme tem de mais interessante é sua cenografia que foge do tradicional casarão antigo e com um passado macabro escondido entre suas paredes. Jill vai passar a noite numa casa de construção moderna dotada de muitos cômodos e paredes de vidro, o que justificaria a quase ausência de luz elétrica em seu interior. O pouco que tem faz as vezes dos antigos candelabros de velas, assim a mocinha não é só amedrontada pela voz sinistra do bandido, mas também pela sensação dele estar observando todos os seus passos a poucos metros de distância. O lado de fora também é bem trabalhado com névoa e vegetação abundante, tudo para ampliar a incômoda sensação de isolamento e nem os sistemas de alarmes mais avançados são capazes de vencer a capacidade de raciocínio humana.

Quando um criminoso quer agir ele encontra meios inimagináveis e ainda recebe a ajuda das companhias telefônicas e de celulares que quando as vítimas mais precisam os aparelhos ficam fora da área de cobertura ou com as baterias zeradas. Aliás, algumas ligações que a babá recebe soam ridículas. Para gerar tensão, é óbvio que em alguns momentos ela vai tremer para atender certas chamadas, mas depois vem o alívio de não ser o bandido. Kelly (Kate Jennings Grant), a dona da casa, entra em contato para saber se está tudo bem já que recebeu aviso do disparo do alarme da casa, mas não faz questão alguma que Jill vá dar uma olhada nas crianças. Aliás, a jovem aparentemente nem lembra para qual função foi contratada tamanho o desprezo que tem com os pequenos que parecem hibernar com a desculpa de estarem gripados. Também é um deslize do roteiro o fato de Tiffany (Katie Cassidy), uma amiga da garota, telefonar para a residência e seu número estar gravado na memória do aparelho dos patrões, já que depois descobrimos que ela não tem ligação alguma com eles e só aparece altas horas da madrugada na casa para gerar um imbróglio que deixa Jill com a certeza de que o estranho está lá dentro com ela e dar margem para que o jogo de gato e rato se intensifique. Belle até que se esforça para passar credibilidade ao desespero de sua personagem e até declarou que pensava em Jack Nicholson em O Iluminado como sendo o cara do outro lado da linha. Contudo, ela está superficial em cena. A impressão é que não teve acesso ao roteiro por completo previamente, mas sua pouca experiência a impedia de também se entregar totalmente à narrativa, ficando sempre com um pé atrás a cada movimento de Jill. Todavia, não sentimos angústia ou pavor em sua interpretação totalmente apática.

Tirando os litros de sangue e alta contagem de corpos, os tradicionais elementos das fitas de horror batem ponto, tais como portas que se fecham sozinhas, trilha sonora estridente, iluminação baixa e jogos de câmera que fazem a vítima parecer cega ou não querer ver elementos óbvios. Sem medo de mergulhar em clichês, o diretor Simon West desperdiça uma história que poderia ser extremamente perturbadora, afinal parte de uma ameaça realista, em troca de uma narrativa rasa, previsível e com cara de telefilme ou de uma sessão da tarde atípica. E o parco resultado nem pode ser justificado por inexperiência já que seu currículo conta com sucessos como Con Air - A Rota da Fuga Lara Croft - Tomb Raider, ainda que não sejam exatamente exemplos em termos de qualidade. Embora já tenha trabalhado com estrelas de responsa, como Nicolas Cage e Angelina Jolie, além de ter que lidar com uma avalanche de efeitos especiais, em Quando Um Estranho Chama West não dá conta de dirigir praticamente uma única atriz ainda desprovida de vícios e tampouco sabe explorar um cenário real que dispensa retoques em computação. Tudo o que ele precisava estava à disposição de sua câmera, inclusive um desnecessário gato preto para saltar sobre a protagonista vez ou outra ou miar em momentos impróprios.

Claro que ao longo da narrativa uma morte aqui e outra acolá acontece para provar que o bandido não quer apenas brincar, como a de Rosa (Rosine 'Ace' Hatem), a empregada dos Mandraki que parece também hibernar, pois quase não aparece assim como as crianças. Allison (Madeleine Carroll) e Will (Arthur Young) só são acionados nos minutos finais quando Jill lembra que se não salvar os pimpolhos dos ricaços vai ficar sem a grana para pagar sua conta do celular. É claro que ela também tem um namoradinho, Bobby (Brian Geraghty), que não serve nem para plantar a dúvida se seria ele o estranho do título. Toda embromação ao longo da narrativa poderia ser perdoada caso o ato final surpreendesse, mas não. Chegamos aos minutos finais saturados e frustrados, pois nem um embate digno entre vítima e algoz é oferecido. Termina tudo com a impotente sensação de que se fosse você no comando faria o filme completamente diferente e mil vezes melhor, inclusive quanto a exploração do cenário que conta um lago particular praticamente ignorado. Habitado por carpas e escondido em meio a uma névoa, uma ambientação em estilo spa relaxante, não seria nada mal uma quedinha da protagonista na água e o vilão surgindo do nada para tentar afogá-la. Esta é apenas uma das situações que poderiam surgir de uma cenografia rica em possibilidades.

Suspense - 87 min - 2006


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