NOTA 3,5 Jovem que cresceu em meio a números e problemas mal resolvidos repentinamente precisa se adaptar ao mundo real |
O título é bem simpático, poderia
ser uma alusão a algo do tipo quando um não quer dois não brigam, mas na
realidade o filme em si é estranhíssimo. As operações matemáticas já estiveram
presentes em alguns filmes como os premiados Gênio Indomável e Uma Mente
Brilhante, mas a diretora Marilyn Agrelo se perdeu entre os números e a
poesia em Matemática do Amor, sua estreia nos cinemas. Baseado no livro
“An Invisible Signo f My Own” de Aimee Bender, o longa é mais um a explorar o
filão dos filmes sobre professores que inspiram e transformam a vida de alunos,
uma lista extensa que tem como principais expoentes Ao Mestre com Carinho e Sociedade
dos Poetas Mortos, por exemplo. Todavia, este aqui está longe de ser
comparado aos grandes trabalhos do gênero, interessando mesmo (com esforço) a
apenas aficionados por draminhas românticos. O roteiro criado por Pam Falk e
Mike Ellis apresenta uma inversão narrativa sendo a professora no caso quem
precisa de ajuda. O filme narra a história de Mona Gray (Jessica Alba), uma
jovem que desde a infância demonstrava uma grande capacidade para lidar com
números, algo que aprendeu com seu pai (John Shea), a quem idolatrava e o
seguia na paixão pela matemática e pelas corridas ao ar livre. Certo dia,
durante uma das práticas do esporte, seu pai acabou sentindo-se mal e tal
episódio transformou a vida da garota completamente. Debilitado por uma espécie
de colapso nervoso e afetado por um distúrbio mental, o matemático fica
submetido aos cuidados de sua esposa (Sonia Braga) e Mona acaba sentindo-se
desmotivada e sem rumo a seguir na vida. Ela simplesmente abdica de tudo o que
gostava de fazer, restando-lhe apenas os números como companhia e distração,
como se fosse um pacto com o universo ou uma promessa a algum santo em troca da
recuperação da saúde de seu pai, mas infelizmente tudo é em vão. Tal ideia
estapafúrdia surgiu das memórias que ela tinha sobre um conto de fadas que seu
pai costumava lhe contar. Aliás, a sequência que abre a obra é justamente uma
animação que ilustra tal história, uma fábula sombria na qual um rei ordena que
cada família tenha um de seus membros executados como forma de sacrifício para
o bem de todo o reino que sofria com a falta de espaço e o excesso de
habitantes, mas uma em especial consegue “abrandar” a exigência, assim cada
pessoa do clã perdeu apenas uma parte do corpo. Bizarro demais? Ao menos a
introdução já dá mais ou menos ideia do que vem por aí. Se assistir com mente
aberta à fantasia dá para engolir aos trancos. Se levar a sério demais...
Mona então cresceu levando
adiante a mensagem do conto, assim acabou se tornando uma mulher infeliz que se
sente culpada toda vez que recobra a esperança ou o prazer da vida, afinal ela
não deve ter se sacrificado o suficiente pelo seu pai. A situação chegou a um
ponto insustentável que até sua mãe não aguentou e expulsou a filha de casa, mas
tal ato não foi por maldade, apenas uma maneira forçada de fazê-la entender que
ela não poderia parar sua vida em função de outra pessoa e que precisava se
abrir para o mundo e novas oportunidades, um hábito comum entre os americanos para
estimular a independência. Realmente o empurrãozinho foi benéfico. Aos poucos
Mona mudou sua personalidade, passou a encarar o amadurecimento de frente e
acabou se tornando uma professora de matemática para crianças mesmo não sendo
graduada na área, apenas contando com o voto de confiança da diretora da escola
que é muito amiga de sua mãe (ai se a moda pega). Contudo, a obsessão da moça
por algarismos e contas não passou e ela usa seus conhecimentos do tipo para
lidar com um mundo que para ela é imprevisível e no qual ela se sente um número
estranho em meio a uma grande equação em que somatórias e subtrações acontecem
a todo o momento. Quando se sente nervosa ela costuma bater na madeira
compulsivamente e a imaginar numerais, praticamente um exercício alternativo de
relaxamento. Apesar das dificuldades para se adaptar ao mundo real, é
justamente dando aulas que a vida de Mona vai ganhar novas emoções. Vai
descobrir, por exemplo, que lidar com o sofrimento de alguém não significa
necessariamente precisar mergulhar em um estado emocional semelhante e
curiosamente tal lição quem lhe dará é uma de suas alunas, a meiga Lisa (Sophie
Nyweide), cuja mãe está prestes a falecer por conta de um câncer no olho e se
apega a nova professora em busca de apoio, mas a situação acaba colocando as
duas no mesmo barco tendo que ligar com suas fragilidades, consequentemente uma
ajudando a outra nessa tarefa. Mona também experimentará emoções positivas como
o carinho que passa nutrir por um colega de trabalho, o professor de ciências Ben
Smith (Chris Messina) que corresponde às expectativas, mas obviamente ela
também terá receios de levar essa relação adiante. Se cabem alguns elogios à
produção eles devem ser feitos justamente por esse gancho de autoajuda, tramas
paralelas que mostram que é necessário sair da clausura para as coisas mudarem,
nada cai do céu. É preciso experimentar algo diferente antes de sentir repulsa.
Muita gente deve se identificar com a protagonista, o que justifica a
quantidade razoável de críticas amenas que o longa recebe, mas no conjunto ele
decepciona em vários aspectos.
A premissa, embora estranha,
poderia resultar em um bom produto, mas Marilyn acabou realizando uma obra por
vezes confusa e enfadonha. A introdução atípica, os transtornos diferenciados
da protagonista, uma relação amorosa meia boca e na reta final um gancho
dramático forçado, tudo regado a diálogos que não raramente soam tolos ou mal
encaixados. Ainda assim, a proposta de longa de autoajuda pesa na hora de
muitos avaliarem a obra, embora existam muitas bem superiores para oferecer
mensagens ao público, e também pode ser interessante para alguns, talvez
pedagogos e afins, a forma como Mona encontra para se virar em sala de aula.
Sem experiência e tampouco estudo específico, ela encontra técnicas
alternativas para ensinar matemática aos pequenos, uma forma lúdica, criativa e
divertida de ensinar como, por exemplo, enxergar os numerais em objetos, mas
infelizmente tem a infeliz ideia de levar um machado para a turminha visualizar
a forma do número 7. Objeto cortante mais crianças levadas resulta em... Pois
é, a matemática racional da professora não carrega conceitos importantes da
matemática da vida, mas sempre é tempo de aprender. Jessica Alba, muito marcada
por personagens sensuais, aparece aqui despida de vaidades, mas se capricha no
visual para tornar crível sua personagem introvertida, por vezes sua
interpretação torna-se carregada demais de inocência o que compromete um pouco
o desenvolvimento da trama que poderia ser um pouco mais curta. Para quem
procura descobrir como Sonia Braga conseguiu se estabelecer em solo americano,
mais uma vez a chance é perdida. Para variar ela tem pouco tempo de cena e não
demonstra todo seu potencial, ainda que garanta um dos poucos momentos
divertidos da fita na cena em que ela comemora o aniversário da filha em um
local público e causa uma confusão previsível com a aparição repentina de Ben.
Como de costume, quem rouba a cena é a pequena Sophie Nyweide com um personagem
melhor construído e uma interpretação natural e espontânea. Difícil dizer se
nos emocionamos ou nos divertimos na sequência em que ela revela à professora
que a mãe está doente. Embora saiba da gravidade do problema, a garota ainda
nutre certa inocência em relação a esse fato. Matemática do Amor poderia
ser um projeto ambicioso e com material para tanto, mas acabou sendo uma obra
superficial cujos resquícios de qualquer tipo de mensagem positiva ficaram
perdidos em meio a melancolia que impregna a narrativa.
Drama - 95 min - 2010
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