sexta-feira, 14 de maio de 2021

VAMPIROS DE JOHN CARPENTER


Nota 8 Longa resgata com sucesso a imagem clássica e cruel das temidas criaturas da noite


John Carpenter até hoje é lembrado como um dos mestres do terror. Criador do clássico Halloween - A Noite do Terror, ele já deu belas escorregadelas com alguns de seus trabalhos, mas em compensação fez plateias se arrepiarem com uma neblina misteriosa, um carro com más intenções, crianças medonhas e com poderes sobrenaturais e até abordando um futuro apocalíptico. Usando artifícios criativos para causar medo, é de se estranhar que ele tenha se interessado em trabalhar com criaturas clássicas do cinema de terror. Porém, esqueça tudo o que você sabe sobre o universo vampiresco. Uma frase do tipo é dita pelo personagem de James Woods e deve ser encarada como o grande slogan de Vampiros de John Carpenter, assim mesmo com a assinatura do cineasta no título atestando e diferenciando sua versão sobre o mundo dos dentuços sanguinolentos. O mestre não quis inovar e sim resgatar o que o tempo deturpou. Os vampiros há anos são personagens muito explorados pelo cinema desde o sinistro Nosferatu, clássico expressionista da década de 1920. Passando pelas mais diversas facetas do Conde Drácula, inclusive cômicas, outros trabalhos deram espaço para vampiras sedutoras também brilharem e até os dentuços teens em conflitos românticos já ganharam as telas, como na franquia Crepúsculo.

Com tantas versões variadas e a maioria romantizando ou ironizando o mito, os temíveis seres da noite foram pouco a pouco perdendo a essência e se descaracterizando. Essas figuras na realidade tem a maldade enraizadas em suas almas e não pensam duas vezes antes de saciar a sede de sangue. Ter alguma compaixão ou se apaixonar por suas vítimas então nem pensar. É por esse pensamento mais perverso que Carpenter optou para realizar uma obra que faz uma excelente mistura entre terror e faroeste e que causa arrepios ao mesmo tempo em que faz rir. É isso aí! O longa tem ótimas tiradas graças aos desbocados personagens de Woods e de Daniel Baldwin, mas nada que o transforme em um legítimo trash movie, pelo contrário, mas certamente ele flerta com o estilo de fazer filmes B com boas intenções. O enredo nos apresenta a Jack Crow (Woods), o líder de um grupo de assassinos patrocinado em sigilo pela Igreja Católica que há anos tenta exterminar os vampiros da face da Terra. Em uma região isolada do solo americano, ele e seu bando conseguem a façanha de capturar e dar fim a um grande número de chupadores de sangue em um mesmo local, mas isso acaba atiçando a ira de Jan Valek (Thomas Ian Griffith), o mestre dos vampiros que acaba indo atrás dos caçadores e realiza um violento massacre em um motel de beira de estrada onde os heróis comemoravam o bom dia de trabalho com prostitutas. 


Somente Crow e seu amigo Tony Montoya (Baldwin) sobrevivem além da garota de programa Katrina (Sheryl Lee) que acaba sendo usada pela dupla como isca para tentar capturar o vampirão. Ela foi mordida por ele e em poucas horas também fará parte do clã das trevas, mas enquanto esse momento não chega ela já consegue ter visões dos passos de seu mestre. Dessa forma e com a ajuda de Adam Guiteau (Tim Guinee), um padre não muito católico (desculpem o trocadilho), eles descobrem que Valek está em busca de uma cruz especial que lhe daria o poder e a todos os seus subordinados de vagar livremente sob a luz do sol, ampliando suas chances de espalhar a maldade e proliferarem a espécie. Aliás, o Bem e o Mal tão próximos é uma característica marcante dos trabalhos de Carpenter que sempre procura desmitificar lendas e desconstruir instituições e valores. Aqui, por exemplo, o padre que acompanha o que sobrou da gangue de caçadores, além de aparentemente estar habituado com com diálogos de duplo sentido e palavrões, também demonstra ter coragem e astúcia. Com tudo o que passa a vivenciar, Guiteau começa a duvidar se tudo que a Igreja lhe ensinou até o momento é real e verdades insolúveis, mas não espere estudos profundos sobre o assunto. O que vale aqui é a diversão e o terror visceral no melhor estilo usado na década de 1980, incluindo a produção com aspecto tosco em certos momentos.

O roteiro, adaptado da obra do escritor John Steakley, não é inovador, apenas intrigante e envolvente o bastante para entreter e manter o vampirismo no imaginário popular com estilo e elegância. É interessante que em determinado momento o destemido caçador de Woods enumera todas as crendices populares que são apenas enrolação. Não adianta cruz, nem alho e tampouco água benta. Vampiros não dormem em caixões forrados com tecidos finos e não usam roupas de época. De verídico apenas o fato de não poderem caminhar na luz do dia, justamente o motim do filme, encontrar a solução para esse problema. Aliás, uma das cenas mais emblemáticas é quando Valek levanta vagarosamente seu corpo da terra seguido de outros de seu clã sob o pôr-do-sol. É de arrepiar! De qualquer forma, apesar de desmistificar bobagens em torno das figuras vampirescas, por outro lado a produção capricha nos clichês do gênero. Gritaria, sangue a torto e a direito, palavrões, a tradicional explicação sobre o surgimento do mestre das trevas e muito vampiro virando torresmo sob o sol escaldante. Mesmo assim, o cineasta conseguiu uma atmosfera de arrepiar e capricha nos takes que realçam o clima de filme de bang-bang e flagram com perfeição a paisagem desértica e o calor intenso do local em que a trama se desenrola, apesar de Crow estar sempre bem encapotado. Diga-se de passagem, a pose e o linguajar de bad boy não caíram muito bom ao envelhecido Woods, tornando seu personagem caricatural e involuntariamente cômico. 


Apesar de alguns tropeços aqui e acolá, Vampiros de John Carpenter é divertido e assustador, um filmaço que nos faz voltar a acreditar no mito do vampiro clássico sem as firulas épicas e românticas que domaram o extinto dessa criatura durante as suas aparições no cinema ao longo dos anos. Demonstrando o mesmo respeito tanto pelos humanos quanto pelos dentuços, afinal ambos os grupos lutam unicamente e com o mesmo peso movidos pelo extinto de sobrevivência, o diretor assinou literalmente o último e digno filme a respeito das criaturas da noite do século 20, uma condecoração merecida e que acabou mesmo sendo seu derradeiro trabalho de sucesso. Já velhinho, seu projeto seguinte foi a baderna espacial Fantasmas de Marte filmada em 2001 e desde então aparentemente iria se aposentar. Voltou quase uma década mais tarde à direção do esquecido Aterrorizada e nem mesmo o longa em comemoração ao 40º aniversário de sua maior criação, o assassino Michael Myers, lhe fora confiado, atuando apenas como uma espécie de supervisor. Bem, se de fato não tem na cabeça nenhum projeto que faça jus a sua trajetória, o melhor mesmo é ficar na inércia para não manchar (ainda mais) o currículo. Sábia maturidade!

Terror - 107 min - 1998

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3 comentários:

renatocinema disse...

Gosto do diretor e de seu estilo, porém, nunca acreditei muito nessa produção.

Talvez, deva dar uma chance a esse trabalho. Afinal, antes tarde do que nunca.

Unknown disse...

Ótimo filme e ótima crítica, parabéns--->>>

Luís disse...

Eu sempre me deparo com esse filme na locadora e sempre penso que quero vê-lo, mas isso é bem saudosista, porque ele me remete a um tempo de infância na qual eu e minha mãe nos sentávamos e ficávamos a noite toda assistindo a filmes.

Não conheço o título e há anos que quero vê-lo. Um dia quebro a barreira que me separa dessa obra e a vejo - até porque, como você apontou, gosto dos filmes de John Carpenter, desde Michael Meyers e sua respiração ofegante até a Christine, aquele Plymouth 58 lindo!
=]