NOTA 6,0 Produção de país pouco conhecido surpreende com seu visual, mas seu estilo narrativo e o próprio enredo são irregulares |
Com o sucesso
de mostras de cinema, a imprensa dando destaque a premiações menores ou
praticamente desconhecidas e distribuidoras especializadas em garimpar títulos
raros mundo a fora, tem se tornado cada vez mais acessíveis obras de países
distantes e de cultura pouco difundida como Croácia, Finlândia, Nova Zelândia
entre tantos outros. Nessa onda de cinema globalizado, que tal curtir uma
produção do Tadjiquistão? De onde? Pois é, este país provavelmente a maioria sequer
sabe que existe, que dirá que lá também são feitos filmes? Localizado na Ásia
Central e fazendo fronteira com o Afeganistão, o país até compartilha diversas
características com o seu vizinho cuja imagem nos acostumamos afiliar ao
sentido da palavra devastação, mas o que vemos em Um Dia Muito Especial é
uma paisagem bem diferente, uma região com belas paisagens outonais, talvez o
verdadeiro trunfo do projeto que é um tanto irregular. Falado no idioma local,
o tadjique, este filme na realidade também é uma co-produção com a França e o
Irã, um drama romântico leve, porém, por vezes estranho e que coloca em
discussão a paixão e a possessão em uma sociedade onde homens e mulheres não
dividem as mesmas regras. Contudo, esqueça a imagem da mulher asiática submissa
para conhecer perfis femininos bem mais próximos do comportamento das
ocidentais. A trama começa nos apresentando o protagonista Jân (Daler Nazarov)
que no dia de seu aniversário de quarenta anos resolve fazer, em suas palavras,
uma revolução contra si mesmo. Ele quer revelar um grande segredo que mudará
sua vida para sempre e então marca um encontro com quatro mulheres em sua
escola de dança. Mariam (Mariam Gaibova), Farzaneh (Farzona Beknazarova),
Tahmineh (Tahmineh Ebrahimova) e Malahat (Malohat Abdulloev) comparecem no
horário marcado, mas nunca se viram e nem esperavam se encontrar. Certamente
estavam esperando um encontro romântico com o namorado. Sim, todas elas estavam
se relacionando com Jân, este que finalmente decidiu abrir o jogo e tentar explicar
seus sentimentos. Ele ama a todas elas, cada uma de uma forma, mas só agora ele
se deu conta que seu tempo é limitado para se dedicar o suficiente e
corresponder a esses amores, embora seus encontros sempre fossem cronometrados
com um antigo relógio.
Se fosse um
filme americano, certamente tal premissa seria um prato cheio para uma comédia
pastelão, com direito a barraco entre as quatro amantes e planos de vingança,
mas esta é uma produção diferenciada. Ao invés de brigarem, as mulheres começam
a dançar ao som de uma agradável melodia enquanto escutam atentas as
explicações do quarentão. Para nossos padrões a aparente indiferença das
mulheres quanto a traição é um pouco incômoda, o que compromete a narrativa
assim como tantos outros detalhes. As cenas do presente, quase um teatro
musical filmado, são entrecortadas por flashbacks que mostram o início da
relação de Jân com cada uma delas, apenas uma dessas histórias é omitida, o que
já traz certo desequilíbrio ao enredo. Quando percebemos o exagero de tempo
dedicado a subtrama de uma das amantes, completamente desproporcional ao das
demais, a tendência é já tecermos comentários negativos, todavia, ao mesmo
tempo em que encontramos pontos críticos ainda nos sentimos tentados a dar
continuidade, talvez embriagados pela atmosfera diferenciada e fascinante da
obra. Em tempos em que falta amor entre os seres humanos, chega a ser
reconfortante acompanhar os esforços de um homem em tentar convencer suas
amantes e o próprio espectador que ele não é um malandro, apenas uma pessoa
sentimental, que busca a felicidade e que procurou levar a sério a máxima que
diz que a vida é curta e não se pode deixar passar as oportunidades. A riqueza
de detalhes com que Jân conta como conheceu Mariam, por exemplo, é extremamente
envolvente, até porque parte de uma ideia típica de produções americanas. Único
passageiro de um avião, homem desiludido com sua vida amorosa sente pela
primeira vez que tem a real atenção de uma mulher, a aeromoça. Após muitos
amores terrenos, pela primeira vez e literalmente ele vivia um amor celestial,
dos céus. Não é a toa que a jovem tem mais tempo de tela que as demais.
Farzaneh ele conheceu quando saia de um bar, na mesma noite foi para a casa
dela, mas o misto de desejo e repulsa da moça quanto a um desconhecido não
envolve quem está assistindo. Já Tahmineh, funcionária de um hospital, ele
conheceu certa vez que precisou ser internado. O gosto pela poesia os
aproximou, mas como em todos os casos amorosos os eventos triviais do dia-a-dia
acabaram por esfriar a relação, segundo o próprio Jân filosofa. A forma como
conheceu Malahat não é explicada como já dito. Poderia ser propositalmente, mas
no conjunto soa mais como uma falha do texto.
Drama - 101 min - 2005
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