Nota 2 Obra aborda diversos temas interessantes, mas não os desenvolve com competência
Filmes podem e devem gerar discussões sadias a respeito de diversos aspectos, concorde ou não com seus argumentos ou apresentação visual. A trama, interpretações e ambientações são pontos comuns a serem explorados e comparados, mas cada um irá observar tais elementos de uma forma distinta de acordo com seu emocional e repertório cultural. Contudo, existem algumas produções que merecem uma análise mais detalhada sobre a forma como foram oferecidas ao público. Por questões regionais, comerciais, de periodicidade ou até mesmo para tirar proveito de assuntos em evidência, erros gritantes já aconteceram no lançamento de diversos filmes, um problema antigo e que inevitavelmente ainda continuará sendo perpetuado. O Segredo, a começar por seu título preguiçoso, é um bom exemplo de erro de execução e de publicidade. Não que fosse um trabalho com fôlego para se tornar um grande sucesso, mas passaria tranquilamente pela classificação de regular. O problema é que da concepção da ideia original até seu lançamento ocorreram diversos equívocos.
Mesmo após quase duas décadas de casados, o casal Hannah (Lili Taylor) e Benjamin Marris (David Duchovny) vive em harmonia e apaixonados, levando uma vida pacata, embora vez ou outra precisassem controlar a rebeldia da filha adolescente Samantha (Olivia Thirlby) que não se entende muito bem com sua mãe. Certo dia, durante uma discussão dentro de um carro em movimento, as duas sofrem um grave acidente. A garota é a única sobrevivente e aos poucos passa a apresentar um comportamento diferenciado, como se estivesse incorporando a alma de outra pessoa. Atento aos sinais, Benjamin passa a acreditar que é o espírito da falecida esposa que está tentando se manifestar. Assim, pai e filha agora precisam aprender juntos a lidar com tal situação, o que provocará grandes mudanças na vida de ambos. Embora longe de ser original, diga-se de passagem, baseia-se em um longa oriental, o argumento poderia render um filme acima da média tanto optando pelo caminho do drama quanto do suspense. O fato é que se precisamos optar por um rótulo tal tarefa é quase impossível, pois nem mesmo seus realizadores souberam qual trilha seguir.
Não há problema algum em flertar com diversas vertentes, mas no resultado final parece que eles preferiram ficar em cima do muro, não sabiam como conduzir um enredo que apresenta tantos pontos a serem observados e discutidos. Aspectos psicológicos, paranormalidade, vício em drogas, crença no espiritismo, as dificuldades para superar a perda de um ente querido e até mesmo incesto. São muitos temas a serem explorados em um mesmo roteiro, ainda mais quando é preciso entregar um filme enxuto. Tomando como base o romance de Keigo Higashino e o roteiro de cinema de Hiroshi Saitô datado de 1999, a inexperiente Ann Cherkis opta por desfolhar tudo que é possível cercar a vida de uma adolescente perturbada, mas não sabe como amarrar as pontas. Garota problema antes mesmo do fatídico acidente, Samantha mostra-se uma pessoa ainda pior depois. O francês Vicent Perez, também ator, dirigiu esta obra de forma fria e tropeçou feio na introdução, dissolvendo a boa ideia inicial em poucos minutos.
Por alguns instantes parece que o longa vai beber na manjada fórmula da troca de corpos podendo até mesmo apresentar um lado cômico do texto, porém, não demora muito e a crise de identidade toma conta da jovem Samantha, com direito a rompantes de raiva e personalidades que se revezam em um mesmo corpo. Por fim, é ensaiado um viés que deixa o espectador a ver navios e que poderia ser o grande pulo do gato da trama: um pai conseguiria se relacionar amorosamente com a própria filha por acreditar que em seu corpo habita a alma de seu grande amor? Uma polêmica desperdiçada. Duchovny não tem muita sorte com suas escolhas cinematográficas. Lembrado até hoje por uma marcante e longínqua atuação no seriado "Arquivo X", o ator continua encarando com frequência experiências sobrenaturais, porém, suas tentativas de firmar sua imagem no cinema soam frustradas. Os roteiros que aceita geralmente são fracos e desde a concepção parecem sinalizar que passarão em brancas nuvens, portanto, seu nome estampando um material publicitário não é algo muito animador. O título brasileiro também não ajuda. Além de genérico e inexpressivo, o batismo pegou carona em um modismo passageiro. Na época uma avalanche de produtos visuais e literários eram lançados com conteúdo que manipulava as pessoas a acreditarem na felicidade e no sucesso fácil através do poder da mente. Portanto, o título foi escolhido para fisgar desavisados.
Acostumado com produções europeias tradicionais, mais inclinadas a reflexão e de ritmo lento, Perez tentou imprimir o mesmo estilo somado a um quê de produção de Hollywood adepta de reviravoltas pretensiosamente inteligentes ou chocantes. Contudo, a produção não oferece grandes acontecimentos e caminha de forma enfadonha não conseguindo transmitir com veracidade o momento conturbado de seus protagonistas. Não se trata de um thriller ou um longa de terror como o argumento indica. Na verdade, passa bem longe destes gêneros não colocando o espectador sob tensão praticamente em nenhum momento. Categoricamente, é um drama, mas tão superficial que não desperta as emoções necessárias, salvo o gosto amargo de ter perdido seu tempo. Ao menos a fotografia, trilha sonora e o clima melancólico e sombrio salvam O Segredo do vexame total.
Drama - 88 min - 2007
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Um comentário:
Não vi e depois desse texto nem verei rs rs rs
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