NOTA 3,5 Deixando mensagens subliminares de lado, quarta adaptação de clássico livro de ficção científica proporciona diversão rasteira e esquecível |
Assim
como Guerra dos Mundos causou frisson
nos anos 50 ao apresentar uma trama alegórica envolvendo alienígenas para
criticar a pretensiosa soberania dos norte-americanos, praticamente na mesma
época Vampiros de Almas era lançado
como uma metáfora ao momento político que os EUA vivia. Baseado no livro “The
Body Snatchers”, escrito por Jack Finney, o longa de 1956 critica o macarthismo
e sua caça às bruxas disfarçadamente através de uma invasão alienígena e o
diretor Don Siegel conseguiu realizar um filme aterrorizante que alcançou
status de obra-prima com o passar dos anos. Em 1978, Philip Kaufman assumiu a
direção de um remake, Invasores de Corpos,
obtendo um filme diferente do original, mas preservando a sensação de paranoia
e pavor aproveitando-se das feridas deixadas pela Guerra do Vietnã. O mesmo
título (com o acréscimo do subtítulo “a invasão continua”) viria batizar em
1993 a versão de Abel Ferrara para o consagrado romance de ficção científica
abordando uma epidemia trazida pelos alienígenas em uma clara alusão aos
temores da AIDS, mas já não obtendo a repercussão dos filmes anteriores. Um é
pouco, dois é bom, mas se três já é demais porque insistir em um quarto filme?
É fato que o argumento do livro é atemporal e permite diversas interpretações,
assim executivos da Warner Bros certamente imaginaram que era hora de mais uma
vez trazer a temática à tona para discutir implicitamente os conflitos étnicos
ou a degradação acelerada da natureza, por exemplo. Contudo, Invasores
não é lembrado por algum tipo de subtexto, mas sim por ser um
retumbante fracasso que deve ter feito um rombo considerável nas finanças de
sua produtora. A trama escrita por David Kajganich parte da premissa de que os
destroços da explosão de um ônibus espacial entraram em contato com algo
alienígena e que ao caírem na Terra trouxeram uma espécie de vírus que modifica
drasticamente o comportamento das pessoas que contamina. A população entra em
desespero, mas o governo vende a ideia de que esta epidemia em breve será
controlada, no entanto, a psiquiatra Carol Bennell (Nicole Kidman) e seu
namorado, o médico Ben Driscoll (Daniel Craig), descobrem a verdadeira origem
do problema, um mal que acomete as pessoas quando elas estão dormindo. Os
infectados mostram-se incapazes de demonstrar algum tipo de emoção, mas à
medida que o vírus se espalha fica cada vez mais difícil descobrir quem é
portador da anomalia.
As
desconfianças de Carol começam quando diversos pacientes começam a se queixar
de mudanças no comportamento de seus familiares. Ela passa a observar com mais
atenção as pessoas nas ruas, mas nem suspeitava de qualquer interferência
alienígena até que seu filho Oliver (Jackson Bond) é sequestrado por criaturas estranhas. Enquanto
tenta recuperá-lo, Driscoll está estudando uma possível cura para a epidemia,
porém, não se pode confiar em ninguém. Ironicamente, com a população
praticamente toda apática os extraterrestres conseguem o grande desejo da
humanidade a séculos: a paz mundial. A guerra então é travada entre os
“mentores” da operação e os poucos que descobrem o que está acontecendo e que
relutam a se “converter” afinal de contas qual a vantagem se viver em um
paraíso sem vida. Curioso é que os protagonistas desde o início já parecem
infectados tamanha a vitalidade de seus personagens. Pudera os problemas de
bastidores já indicavam que o longa seria um grande erro e para os atores as
filmagens devem ter sido como um castigo. Inicialmente ele seria lançado em
meados de 2006, o que não seria bom visto que o já citado Guerra dos Mundos ainda colhia louros e xingos em proporções
semelhantes e qualquer coisa envolvendo ficção científica corria risco de
rejeição. O atraso de um ano por outro lado só ajudou a fomentar o fracasso da
produção com mudanças drásticas na direção. Com o sucesso de A Queda – As Últimas Horas de Hitler, o
cineasta alemão Oliver Hirschbiegel foi seduzido rapidamente por Hollywood. Em
seu projeto de estreia em terras novas ele pretendia não abandonar seu estilo.
Oriundo de um cinema mais intelectual, sua intenção era subverter os clichês da
ficção científica para um drama com pano de fundo perturbador. Para tanto, o
primeiro ato é dedicado a desenvolver o universo dos personagens principais,
uma forma de torná-los íntimos do espectador que deveria sofrer com os
infortúnios que iriam acontecer. No entanto, depois de uns 10 ou 15 minutos
pouco nos importamos com os tipos que vemos na tela, mas não podemos culpar
totalmente Hirschbiegel ou Kajganich. Provavelmente o filme que eles
idealizavam era outro, mas tiveram que ceder à pressão do estúdio. A versão
original foi considerada lenta demais para atrair o público ianque aos cinemas
e consequentemente atrapalharia as bilheterias em outros países. Contudo, as
mudanças exigidas não surtiram efeito. Ficando longe de recuperar ao menos
metade do seu orçamento nos cinemas norte-americanos, o filme já chegou
baqueado em outras regiões.
Os
irmãos Larry e Andy Wachowski foram recrutados para reescrever trechos do
roteiro e algumas cenas adicionais foram comandadas por James McTeigue, mesmo
trio de V de Vingança, mas nenhum
deles recebeu crédito pelo trabalho. Seria um detalhe esquecido na edição final
ou simplesmente eles mesmos exigiram a omissão? A segunda opção parece fazer
mais sentido. Estava na cara que o projeto não sairia ileso de críticas pesadas.
Não que o filme seja horrendo por completo. Até tem alguns bons momentos de
suspense, mas no geral deixa a desejar e é perceptível as cenas dirigidas por
Hirschbiegel e as que foram feitas a toque de caixa por McTeigue que preocupado
em injetar adrenalina no marasmo esqueceu-se de orientar seus atores. Kidman
deveria mostrar-se inexpressiva propositalmente para sua personagem se misturar
à massa e não se tornar um alvo em potencial, mas na intimidade do lar deveria
relaxar, no entanto, Carol parece insossa desde sua primeira cena em seu
consultório. O mesmo acontece com Craig que tinha a responsabilidade de atrair
os “bondimaníacos” já que este era seu primeiro longa após o estrondoso sucesso
de sua aventura de estreia como o agente 007. E o que dizer do Dr. Galeano (Jeffrey
Wright)? Toda a trama deveria ser construída em torno deste cientista, um
estudo sobre sua mente privilegiada que em pouquíssimo tempo destrincha toda a
origem e particularidades da tal epidemia, inclusive apontando quem pode ser
imune e sua solução, tudo traduzido naqueles discursos decorados cheios de
termos científicos. A rapidez com que os infectados manifestam reações também
não contribui para dar credibilidade a uma trama que desperdiça um bom
argumento que poderia refletir medos do século 21, como a Guerra ao Terror.
Estaria a população mundial tão defasada mentalmente que não teria capacidade
de compreender uma história alegórica? Não foi isso que os resultados em
bilheterias e críticas mostraram. Todavia, quem desconhece os filmes anteriores
e o livro que os originou, além de ser aquele espectador que se contenta com
pouco, pode até se divertir com Invasores que se resume a rápida
saga de uma mãe em busca do filho. Diante do fiapo de história, depois a
obsessão é encontrar um lugar seguro.
Não há nada de errado propriamente com a ideia básica do longa, mesmo
dispensando algum tipo de subtexto relevante, mas o problema é sua realização.
O vírus alienígena parece ter contagiado toda a produção e isso se refletiu na
obra.
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