sexta-feira, 13 de outubro de 2023

SEXTA-FEIRA 13 (1980)


Nota 8 Produção envelheceu consideravelmente, mas é inegável sua importância e legado


Mesmo quem não é fã de terror certamente tem em sua memória a imagem de um homem alto, robusto, trajando roupas pretas, munido de um facão e com uma máscara de jogador de hóquei escondendo seu rosto. Jason Vorhees está enraizado para todo sempre na História do cinema e também na cultura popular dos quatro cantos do mundo, porém, tal figura icônica não surgiu logo no primeiro longa da franquia Sexta-Feira 13, produção que serve como um prólogo e também uma justificativa para a trajetória sanguinolenta do assassino. Na realidade, no filme inaugural de sua saga, quem toca o terror é sua própria mãe (não é mais spolier algum tal revelação) com sede insaciável de vingança por ter perdido o filho por negligência de um jovem casal que transava enquanto deveria cuidar do menino. O acampamento Crystal Lake está prestes a ser reinaugurado após mais de vinte anos inativo. No final da década de 1950, uma criança morreu afogada no lago, algum tempo depois dois monitores foram cruelmente assassinados, houve problemas com incêndios e a qualidade da água da região levantou suspeitas de envenenamento. 

Todos esses percalços acabaram por cercar a região de aura negativa, mas nada que amedrontasse Steve Christy (Peter Brouwer), um jovem empresário que acredita que o local ainda tem potencial para voltar a ser sinônimo de alegria e diversão. Preparando-se para a temporada de verão, ele contrata um grupo de monitores para organizar a reabertura e entre eles está Annie (Robbi Morgan) que ainda na estrada é advertida por algumas pessoas da má fama do camping, todavia, como reza a cartilha do gênero, ela ignora os conselhos e segue viagem. Ou melhor, vai até certo ponto, pois tem a honra de se tornar o primeiro cadáver da nova onda de crimes que assolará o lugar. Sem saberem da morte da colega, Alice (Adrienne King) e os outros monitores chegam ao acampamento cheios de gás e não querem perder um minuto sequer neste paraíso, mas não demoram a surgir contratempos. De qualquer forma, o aparecimento de uma cobra em um dos chalés (sequência completamente desnecessária dentro do contexto) e a visita surpresa de Crazy Ralph (Walt Gourney), um doido que os alerta que não sairão vivos dali, não amedrontam os jovens.


Sedimentando as convenções do gênero, o roteiro de Victor Miller e Ron Kurz dispensa preciosos minutos mostrando a galera se divertindo no lago, se drogando, se embebedando e, obviamente, flertando e transando, momentos acompanhados bem de perto pelo assassino sempre à espreita enquanto articula qual será a melhor maneira de eliminar os campistas. Usando a mesma técnica aplicada em Halloween - A Noite do Terror, o diretor Sean J. Cuningham posiciona sua câmera de forma como se fizesse as vezes dos olhos do vilão em momentos estratégicos, aguçando a curiosidade do espectador quanto a sua identidade. Bem, ao menos quando realizado, o objetivo era surpreender com a revelação. Mesmo assim a fita não segue totalmente o estilo adotado por John Carpenter em seu citado clássico slasher. O massacre em Crystal Lake é bem mais explícito e violento, com mortes na base do facão, machadadas e até flechas, além de cadáveres revelados no clímax dependurados em árvores, escondidos atrás de portas ou arremessados pela janela. Entre estes corpos está o de um jovem Kevin Bacon em início de carreira no papel de Jack, um rapaz que resolve fornicar em hora imprópria e, como sabemos, quem não é puritano não sobrevive para contar sua versão dos acontecimentos. 

Apesar dos esforços no primeiro ato para os personagens criarem alguma sinergia com o espectador, eles não passam de arquétipos, perfis manjados e que viriam a se repetir à exaustão em produções desta seara, desde o contemporâneo A Hora do Pesadelo, passando pela reinvenção Pânico e batendo cartão até hoje em fitas menores e sem um pingo de originalidade, tanto que fica difícil até destacar algum título da safra dos anos 2000, todos completamente esquecíveis. Embora pelas características não demore para descobrirmos quem irá sobreviver (ou quase isso), Cunningham tenta segurar ao máximo a tensão evitando mortes prematuras. Os personagens somem aqui e acolá, mas fica a dúvida do que realmente lhes aconteceu. O longa ganha pontos graças as trucagens e maquiagens usadas nas cenas de assassinato, todavia, apesar do capricho, boa parte do trabalho da equipe acabou sendo desprezado na sala de edição. As cenas de assassinatos originais eram longas e sofreram vários cortes para dar mais dinâmica aos momentos-chaves, mas nada que economize nos litros de sangue jorrados. A violência gráfica está garantida com requintes de crueldade, mas não se pode negar que no clímax fica difícil acreditar que Pamela Vorhees (Betsy Palmer), uma senhora já de certa idade, conseguiria orquestrar tal massacre e aguentar a pancadaria na hora do vamos ver. Ela  apanha e desmaia repetidas vezes, mas sempre retorna com uma energia anormal, embora não seja imortal como seu filhinho. Que vigor!


Dizem que a ideia de colocar uma assassina no primeiro longa teve inspiração em Psicose, mas em uma relação às avessas, neste caso com a mãe sendo manipulada pelo espectro do filho. Até a trilha sonora característica bebe na fonte do clássico de Alfred Hitchcock, mas há também quem defenda que a perversidade do longa carrega ressonâncias da guerrilha que marcou para todo o sempre o Vietnã, com a maioria das fitas de terror da época fazia extrapolando os medos e as revoltas do público de modo alegórico. Todavia, Sexta-Feira 13 não tinha a menor intenção de reinventar a roda. A narrativa tem seus furos, por vezes é monótona, abusa da inteligência do espectador em certos momentos, mas não há como negar sua importância no desenvolvimento do cinema de horror. Lançando uma série de clichês que se tornariam regras para fitas do tipo, como os personagens perambulando sozinhos pela escuridão ou transando em meio ao caos, além de profanarem frases ridículas ou sem graça em momentos inoportunos, a fita deixou um invejável legado, ao menos em termos de quantidades. Com a perturbadora cena final do garoto Jason surgindo no lago para atacar a única pessoa que sobreviveu a vingança de sua mãe, o personagem renderia nada mais nada menos que dez continuações, incluindo o crossover Freddy vs. Jason e a adaptação para o universo de ficção científica Jason X, além de uma refilmagem lançada em 2009 desprovida de um pingo de originalidade ou identidade própria. 

Terror - 95 min - 1980

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