sexta-feira, 26 de novembro de 2021

AMERICAN PIE - A PRIMEIRA VEZ É INESQUECÍVEL


Nota 8 Obra brinca com os anseios e dúvidas pertinentes aos jovens, principalmente quanto ao sexo


No início da década de 1980 a comédia Porky's causou frisson por ser uma fita voltada ao público adolescente que com muito humor e descaradamente falava sobre sexo, mais especificamente sobre a descoberta dele por um grupo de jovens. Expectativas e frustrações em meio a muita confusão marcaram toda uma geração, tanto que gerou mais duas continuações e influenciou várias outras comédias do estilo como O Último Americano Virgem e A Primeira Transa de Jonathan. De sacanagem literalmente, em menor ou maior intensidade, é que tais fitas se sustentavam. Para alguns puritanos certamente era o apocalipse ver em cena jovens discutindo sem pudor sobre a necessidade de perder a virgindade e a colocando em jogo como um prêmio de aposta. Com o tempo a temática caiu em desuso, mas eis que as vésperas do novo milênio ela ressurgiu com American Pie - A Primeira Vez é Inesquecível, virando uma febre imediata entre os adolescentes, afinal entre dúvidas quanto a profissão a escolher, arranjar um emprego ou convencer os pais a lhe dar um carro, sem dúvidas a questão de até quando permanecer intacto é o que mais os perturba. 

É esse o grande dilema vivido por Jim (Jason Biggs) que está naquela fase em que só pensa naquilo. Ele tenta aliviar seu problema com constantes sessões de masturbação, mas vive metendo os pés pelas mãos. Melhor dizendo, no caso ele mete o pênis em meias, travesseiros e até dentro de uma suculenta e macia torta de maçã, daí a justificativa do título, e quase sempre é flagrado por alguém. O mesmo dilema vem tirando o sono de seus amigos Oz (Chris Klein), Kevin (Thomas Ian Nicholas) e Finch (Eddie Kaye Thomas). Prestes a se formarem no ensino médio, eles estão pouco se lixando para as provas finais e firmam um pacto de que todos vão perder a virgindade, ou alcançar o Santo Graal como gostam de dizer para dar um sentido mais nobre a missão, até a noite do baile de formatura. Detalhe, tem que transar com o consentimento das garotas, não podem ser prostitutas. Garotões, cheios de disposição e com muita lábia, na teoria seria fácil cada um levar ao menos uma garota para a cama, porém, na prática a situação é complicada. Vários vexames, desencontros e situações imprevisíveis vão ensinar que não se pode estipular prazos ou fazer planos. Cada um tem sua hora para perder a virgindade, podendo ser um momento inesquecível ou pavoroso a depender do clima que vai conduzir o encontro, da parceira, da real vontade de dar esse passo por livre e espontânea vontade... 


São vários fatores que influenciam esse importante momento, mas é óbvio que a comédia dirigida pelos irmãos Chris e  Paul Weitz nunca teve pretensões de oferecer um tratado profundo sobre o assunto. Ainda assim, é uma comédia acima da média para a temática. Sem dúvidas um dos pontos altos do roteiro é a embaraçosa relação de Jim com seu pai, Nohan Levenstein (Eugene Levy), que após flagrar algumas vezes o filho se masturbando lhe cai a ficha que o seu garotinho cresceu e subitamente começa a puxar assuntos sexuais com ele. Divertidíssima a cena em que presenteia o filhão com diversas revistas pornôs e tenta dar uma aula sobre genitais e posições eróticas. Mal sabe ele que há muito tempo Jim tem estudado tais assuntos, só não fez ainda suas aulas práticas. Tal gancho é de fácil identificação com o espectador, afinal muitos pais decidem conversar sobre sexo tardiamente ou se fazem de cegos e surdos eternamente para evitarem constrangimentos, o que resulta nos típicos problemas sociais de gravidez indesejada, doenças sexualmente transmissíveis, promiscuidade e por aí vai. Claro que como puro entretenimento o texto de Adam Herz, que viria a escrever o roteiro de outros seis filmes da série, descarta qualquer possibilidade de levantar algum tema mais sério. O grande dilema dos rapazes é conseguir ir para a universidade com fama de pegador.

Além das vexatórias cenas de educação sexual com o papai e da já citada masturbação com uma torta, Jim ainda se complica tentando azarar a siliconada Nadia (Shannon Elizabeth), uma aluna de intercâmbio. A garota invade o quarto do virgem e, sem saber que as imagens estão sendo transmitidas pela internet aos alunos do colégio, começa a se despir com total desenvoltura. O rapaz entra em cena pronto para os finalmentes, mas ela impõem como condição para levá-la para cama que ele também faça um sedutor strip-tease. Desengonçado, franzino e com uma broxante samba-canção, tudo que o cara consegue é virar piada na escola, ainda mais porque chega ao orgasmo sem ao menos tocar na moça. Como tal envolvimento é apenas um fetiche de adolescente, mais tarde ele vem a se apaixonar por Michelle (Alyson Hannigan), que lhe confessa também adorar se masturbar. Aliás, a participação feminina é um grande ponto diferencial em relação as comédias oitentistas do estilo. As meninas não estão em cena apenas para enfeitar com seus peitos e bumbuns durinhos e não basta estalar os dedos para levá-las para a cama. As meninas pré-virada do milênio demonstravam ter as mesmas vontades dos garotos quanto ao desejo de satisfazerem todas as suas vontades, porém, sabem dizer não quando querem. 


O perfil dos rapazes também mudou. Se antes eram retratados como machistas, obcecados por sexo e a insegurança passava longe para evidenciar virilidade, aqui eles não tem vergonha de expor seus medos e anseios, não só quanto a vontades sexuais, mas a respeito de tudo que envolve o amadurecimento . Até os nerds sempre pintados como bobões quando o assunto é sexo aqui deixam os garotões cheios de marra para trás, mesmo que alguns às custas de mentiras bem boladas. Procedido por duas sequências diretas e mais um tardio episódio reunindo a turma então já madura, American Pie - A Primeira Vez é Inesquecível ainda gerou uma série de sequências lançadas diretamente para consumo doméstico, diga-se passagem, todas de qualidade inferior e com elenco duvidoso. Entretanto, o primeiro filme da franquia ainda diverte e sem dúvida é uma referência sobre o universo juvenil no final do século passado. Mesmo com internet ainda não tão popular, redes sociais restritas e sem aplicativos para celular, essa galera dava sempre um jeitinho de dar uma azarada. É certo que os micos  dos personagens são melhores lembranças que seus triunfos.

Comédia - 95 min - 1999

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