quarta-feira, 22 de abril de 2015

ÁGUA PARA ELEFANTES

NOTA 6,5

Embora o casal principal
não tenha química, longa
se beneficia da força do
vilão e da ambientação
A arte circense está em franca decadência há algumas décadas, transformando-se em uma opção de lazer apenas para crianças bem pequenas ou aos mais velhos que podem matar as saudades de seu tempo de infância. Em uma época em que bugigangas tecnológicas escravizam o ser humano vendendo a idéia de que não há melhor diversão que ter o mundo em suas mãos em um pequeno eletroeletrônico, a simplicidade das caras e bocas de um palhaço ou os clássicos truques de mágica já não conseguem mais chamar atenção como antigamente. O cinema frequentemente aproveita sua própria arte para homenagear outras manifestações artísticas, mas o circo é um cenário que há muito tempo não era aproveitado. Baseado no romance homônimo de Sara Gruen, Água Para Elefantes tem como ambientação principal a alegria e a magia de um picadeiro, mas a realidade dos bastidores dos espetáculos tem clima festivo quase nulo e histórias tristes de trupes circenses espalhadas pelo mundo não faltam. O roteirista Richard LaGravense responsável, por exemplo, pelos textos dos filmes As Pontes de Madison e O Encantador de Cavalos, usou como pano de fundo a crise econômica americana da década de 1930 para contar uma bela história de amor. Jacob Jankowski (Robert Pattinson), sem família e nem dinheiro, viveu sua juventude trabalhando no Circo dos Irmãos Benzini em uma época em que a economia americana passava por um período difícil. Foi nos bastidores do mundo circense que o ex-estudante de veterinária conseguiu a chance de um emprego onde não precisava ter um diploma ou conhecimentos específicos, bastava saber fazer com que os outros acreditassem no seu papel, como August (Christoph Waltz), o dono do circo, dizia. Assim, o rapaz começou a adestrar animais, principalmente para as apresentações de Marlena (Reese Whiterspoon), por quem se apaixona a primeira vista, mas ela já é comprometida com seu patrão, um homem que, apesar de ser muito educado e compreensível, mostra-se extremamente cruel quando o assunto é proteger o que é seu ou fazer dinheiro. Com a chegada da elefanta Rosie no circo para um novo número a proximidade entre o adestrador e a artista aumenta e August não vai deixar a relação passar em brancas nuvens aproveitando-se que ambos dependem dele para sobreviver em uma época em que a falta de perspectivas e a desolação imperam. Jogar a sorte para o alto em nome do amor era uma loucura que poucos teriam coragem.

O filme começa bem mostrando a emoção do ator veterano Hal Holbrook interpretando o protagonista quando já está na casa dos 90 anos. Insatisfeito com a vida solitária que leva e não conseguindo esquecer seus momentos da juventude, ela passa a narrar um período especial de suas memórias a um funcionário de um circo contemporâneo. A narrativa praticamente concentra toda a sua ação em um longo e contínuo flashback. Para as adolescentes, eis que surge o grande chamariz da produção, o ator Robert Pattinson. Sua participação gerou muita expectativa, pois era a chance de provar que não é apenas um rostinho bonito. Bem, ele mostra que tem potencial para ir além do papel do vampiro romântico da saga Crepúsculo que o consagrou, mas ainda tem chão para tanto. Ele se esforça, mas comumente não esboça reações de acordo com o que o roteiro pede. Simplesmente se mostra apático e isso ajuda a diminuir a força de seu papel, ainda mais quando entra em cena Reese com sua beleza e características dignas das atrizes de Hollywood que fizeram história atuando em filmes de época. Todavia, ela defende sua personagem de forma pouco inspirada e ficou devendo a seu público um grande trabalho. Segundo declarações da atriz na época do lançamento ficou claro que o clima entre os dois intérpretes nos bastidores não era dos melhores e isso se refletiu em suas atuações. O casal não passa a emoção necessária para tornar crível o romance de Jacob e Marlena, mas é certo que nem mesmo o roteiro ajuda a construir essa relação. O público gosta de se envolver com a trama gradualmente e ela deve seguir este ritmo, mas o que temos aqui é um amor instantâneo cuja única explicação seria pela predileção pela beleza do homem pela mulher e vice-versa. No entanto, a personalidade de cada um deles e demais características sentimentais tratam de colocar panos quentes na relação, ou melhor, panos gelados. Nem mesmo o embriagante ambiente circense consegue nos desviar a atenção desse equívoco, constatando que dois nomes famosos e com público cativo não são garantia de bons resultados. Se os protagonistas são insossos, ao menos temos um bom vilão para nos entreter. Waltz, que ficou famoso após os vários prêmios que recebeu por Bastardos Inglórios, mais uma vez rouba a cena com um invejável timing emocional. Ele consegue ser gentil e envolver com sua fala mansa, mas em poucos instantes assustar com uma agressividade aflorada e voz imponente, uma mudança radical de comportamento, mas cuja transição é de uma naturalidade anormal e sempre marcada por frases irônicas e de efeito. Melhor que ele só mesmo a elefanta Rosie que desempenha bem suas funções, tem destaque no final e consegue cativar o espectador. As cenas em que é agredida pelo dono do circo devem mexer com os mais sensíveis.

Curiosamente, este romance tem a direção de Francis Lawrence, que até então fez as adaptações para cinema de Constantine e Eu Sou a Lenda, dois títulos ligados aos gêneros de fantasia e ficção e bem distintos deste seu projeto seguinte. Vendo por este lado, podemos compreender o porquê de algumas falhas e a falta de emoção do filme, mas ainda assim é louvável o esforço de um cineasta em tentar desbravar campos desconhecidos em sua filmografia e utilizando uma estética realista e longe dos efeitos digitais. Experiente também na área de vídeo clips, o diretor consegue êxito na escolha das canções da trilha sonora, a maioria escolhida a dedo para destacar algumas emoções dos personagens. Ornamentando a história, belos figurinos, cenários e fotografia estão a disposição, mas são recursos que poderiam ser melhores explorados. Ainda assim, os momentos mais interessantes do longa são as sequências que mostram o cotidiano do circo, como as constantes e cansativas viagens e até mesmo o sacrifício de um animal para acabar com seu sofrimento após anos de serviços. O problema é que tais situações foram usadas como adorno para uma história de amor que poderia render muito mais do que o concretizado. No conjunto, a trama não é nada revolucionária, porém, não decepciona totalmente. É certo que algumas passagens podem parecer estranhas, consequência da necessidade de se resumir algumas dezenas de páginas do livro e dar movimento à narrativa, mas, no fundo, este é mais um romance tradicionalista com um triângulo amoroso convencional, mas que se beneficia em partes de sua ambientação, programa perfeito para os adeptos de histórias românticas e dramas leves. Lawrence não merece ser apedrejado por seus erros ou omissões, mas sim aplaudido por ousar a sair do mundinho cinematográfico apocalíptico e habitado por demônios e zumbis que tanto lhe deram glórias em um passado recente. Seu bom senso também merece ser citado. Muitos criticam o distanciamento da câmera do personagem de Pattinson, mas se o ator não consegue expressar sentimentos através de movimentos faciais e lágrimas não há motivos para dar close a sua falsidade. Ilusão por ilusão melhor acreditarmos que o eterno vampiro teen tem potencial dramático, ainda que a distância. Em suma, Água Para Elefantes é uma produção que não chega a fazer jus ao rótulo de sua ambientação, "o maior espetáculo da terra", mas está longe de ser decepcionante e têm suas qualidades, porém prometia muito mais.

Romance - 122 min - 2011 

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2 comentários:

renatocinema disse...

Um amigo falou tão bem do filme.......que desconfiei. Quando assisti fui com um pé atrás e encarei o filme tranquilamente.

Gostei, mas, realmente não é tudo o que prometiam.

marcosp disse...

Àgua com acúçar... resume o filme, bem clichê, personagem que se abate com uma tragédia, sai a esmo, se apaixona pela pessoa errada...se agente pensar já vimos muitos desses filmes com roteiros similares, salva-se a beleza do protagonista e a atuação da elefanta...